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Chefs investem no reaproveitamento de alimentos

“Um grande chef respeita o valor culinário de cada coisa, das trufas aos rabanetes”, escreveu Daniel Boulud, um dos chefs franceses mais importantes de Nova York, em seus ensinamentos aos jovens cozinheiros.

Essa filosofia do aproveitamento total dos ingredientes e do mínimo desperdício pode estar incorporada ao dia a dia de profissionais como o italiano Massimo Bottura, à frente do recém-inaugurado Refettorio Gastromotiva, no Rio, que utiliza alimentos excedentes, cujo destino seria o lixo.

Ou na rotina da chef Roberta Sudbrack, que fez até “caviar” de sementes de quiabo, e de Ivan Ralston, do Tuju, que compra de seus fornecedores itens que iriam para o lixo, como a pele de bacalhau, para fazer caldo, e as folhas de figueira, cuja infusão ele bate com sorvete de limão e dá forma a um “milk-shake” com sabor forte de figo.

Nos últimos dez anos, a população brasileira cresceu 6% e o lixo aumentou 29%. “A gente vai morrer sufocado por lixo”, diz Fernanda Danelon, do Instituto Guandu, que presta consultoria na área e ajuda restaurantes de São Paulo a darem destino para seus resíduos, fechando o “ciclo do prato ao prato”.

“Temos que encarar o nosso próprio lixo. É assim que vamos diminuir o volume e destiná-lo adequadamente”, diz Danelon, que começou suas atividades carregando resíduos de um restaurante no porta-malas de seu próprio carro e hoje recolhe cerca de duas toneladas por dia em 17 restaurantes.

O LIXO EM NÚMEROS

Menos de 0,5% da matéria orgânica gerada é reciclada

No Brasil, apenas 3% do lixo é reciclado

78,6 milhões de toneladas foi a geração de lixo total no país em 2014

Segundo a ONU, se reduzirmos 1/3 do desperdício de alimento no mundo, é possível resolver o problema da fome

A geração de lixo per capita faz com que o Brasil seja o 5º maior gerador de resíduos do mundo

Um restaurante de 50 lugares produz em média uma tonelada e 200 kg de lixo por mês

42% do resíduo coletado ainda são destinados ao lixão, a pior forma de descarte dos restos, que causa contaminação do solo e da água

Cada habitante gera por dia, em média, 1 kg de lixo

Fuçar o lixo fazia parte do ritual de Gabriel Matteuzzi quando ele abriu seu restaurante, Tête à Tête. “A perda ou o ganho de um restaurante pode estar ali. Isso é algo que vivi na França. A mãe do Michel Bras [um dos chefs franceses mais celebrados] mexia muito no lixo, monitorava tudo.”

Boulud diz o mesmo, em seu livro para jovens cozinheiros: “Qualquer produto subutilizado afetará seus custos finais”.

Os sacos de lixo também passavam religiosamente pela mão de Alberto Landgraf em seu extinto Epice. “Tenho pai e avós agricultores. Aprendi desde cedo a valorizar o trabalho no campo, que é suado e doloroso. A gente precisa aproveitar o máximo dos alimentos”, diz ele, que faz uso de talos e da rama de cenoura –e está à procura de ponto no Rio para sua nova casa. Na mesma cidade, os restaurantes de rua dos Troisgros (Claude e Thomas) passaram a integrar o movimento Lixo Zero, com seleção, descarte e coleta dos resíduos orgânicos.

Em São Paulo, entre outras iniciativas, o projeto Reduzindo o Desperdício, da Ceagesp, doa alimentos fora do padrão comercial mas adequados ao consumo para entidades assistenciais –e recebeu neste ano um prêmio de sustentabilidade.

RESÍDUOS ORGÂNICOS
Se há nessas iniciativas de chefs estrelados um aspecto de “marketing do bem”, é bom lembrar que a reutilização de alimentos que iriam para o lixo também tem um custo, além de responder a um problema real.

Se considerarmos que mais de 50% de todo o resíduo produzido no Brasil é orgânico, ou seja, restos de comida, do pré ou pós-preparo, e que menos de 0,5% deste volume é reciclado, chega-se a duas questões centrais. Primeiro, o desperdício crescente de alimentos. Segundo, a urgência em se criar manejo do lixo orgânico.

Pode haver descarte de alimentos ainda em perfeita condição de consumo nos pontos de venda, a exemplo de produtos que perdem valor comercial, como uma fruta muito madura ou algum item com prazo de validade próximo, ou ao longo do manuseio dos alimentos, processo no qual jogam-se fora talos, folhas e aparas de carnes e massas, que poderiam ser aproveitadas na cozinha.

No restaurante Puro, em Botafogo, no Rio, o chef Pedro Siqueira guarda toda sorte de subproduto para dar forma ao “cardápio convidativo”, servido no almoço da semana, por R$ 49, com entrada, prato e sobremesa –no menu regular um prato chega a custar R$ 86.

“Guardo as aparas de peixe e faço tartare, massa com ragu de peixe; do pato, tiro peito e sobrecoxa, sobra um monte de carne. Raspo tudo e faço arroz de pato, saladinha de pato. O mesmo vale para o polvo. Guardo a cabeça, corto em tirinhas, faço um arroz de frutos do mar e peixe.”

Os resíduos que são descartados, porém, devem ser destinados adequadamente. Um dos caminhos é a compostagem, que devolve o lixo para o solo, em forma de adubo.

“O ciclo do retorno é irreversível. Não há outro caminho. Temos carência de espaço para depositar esse material e necessidade de mais nutrientes no solo”, diz Carlos Silva Filho, diretor da Abrelpe (Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais) e vice-presidente da associação internacional de lixo sólido, a Iswa.

“Um estudo da associação levantou que, se aproveitarmos a matéria orgânica como nutriente para o solo, daqui a uma década não vamos mais precisar de fertilizantes químicos e agrotóxicos nos cultivos, porque o solo estará enriquecido”, diz.

TIPOS DE LIXO NO BRASIL
51%
MATÉRIA ORGÂNICA
O que é: resto de alimento pré e pós-preparo como ossos, alimentos crus e cozidos, casca de frutas e legumes, aparas de massas

32%
RECICLÁVEL SECO
O que é: vidro (2%), como potes de conservas; papel e papelão (13%), como embalagens de caixinha de leite, por exemplo; metais (3%), como latas de tomate; plástico (14%), como embalagem de arroz e feijão, entre outros

17%
OUTROS
O que é: ​resíduo para o qual ainda não há viabilidade de reciclagem ou recuperação, como luva, touca, embalagem de vácuo de carnes sujas, guardanapos​ usados, papel higiênico, esponja de pia e óleo de cozinha, este, geralmente destinado à indústria de sabão

Fonte: Folha de São Paulo

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