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Indústria Escassez Hídrica

Brasil experimenta a maior crise hídrica em 91 anos

Segundo Patrícia Boson, apesar das previsões, nada foi feito

Maior crise hídrica em 91 anos

No último ano hidrológico, entre agosto de 2020 e setembro deste ano, as chuvas registradas no País apontavam para uma escassez histórica: a maior estiagem em 91 anos. Essa situação, porém, não poderia ser uma surpresa para os órgãos de monitoramento hidrometeorológico, tampouco o esvaziamento dos reservatórios poderia assustar as autoridades responsáveis. Estações mais secas que a média têm sido a regra dos últimos anos. Os reservatórios se encontram no menor nível desde 2015.

O quadro piorado, e a escassez maior este ano, se desenhava desde maio, quando o período caracterizado pela baixa umidade já chegou com perspectivas de seca severa, especialmente no Sudeste e Centro-Oeste do País, onde estão instalados os principais reservatórios brasileiros.

Assim, para evitar que os reservatórios continuassem a secar até níveis extremamente críticos, optou-se pela preservação do máximo de água nas barragens até o fim da estação seca e a volta das chuvas, esperadas a partir deste mês. Levantamentos do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS) demonstram que choveu ainda menos do que se esperava no período seco, com reservatórios baixando além do projetado. Conforme o operador, o País precisará agora aumentar sua geração em 8% para dar conta da demanda e evitar desabastecimentos.

Seca prevista e alertada – A situação brasileira se repete em Minas Gerais. Segundo a engenheira Patrícia Boson, especialista e referência nacional em gestão ambiental, os dados levantados e as análises feitas pelos órgãos de monitoramento hidrometeorológico apontam para uma precipitação histórica também em Minas Gerais, a exemplo do País, no período hidrológico 2020/2021.

“Temos em Minas Gerais a menor média histórica em praticamente toda a extensão das bacias analisadas”, afirmou Patrícia, que preside a Comissão Técnica de Recursos Hídricos da Sociedade Mineira de Engenheiros (SME). “Entretanto, a escassez do período de 2020/2021 indica ser bem mais severa no Triângulo Mineiro”.

A especialista explicou que a atual escassez hídrica está muito mais associada à falta de gestão do que à falta de oferta de água ou à falta de chuvas. “Estamos vivendo um longo período crítico de estiagem, desde 2013/2014. Ou seja, vivemos hoje uma situação hidrológica, estudada, prevista, avisada e alertada, indicando longo período de chuvas abaixo da média”, observou.

Segundo ela, a ciência antecipou a situação. “Há um acúmulo de conhecimento e experiência que ofertam possibilidades de engenhar soluções. Minas Gerais possui grandes especialistas na área”.

“O que foi feito de fato para precaver, adaptar ou resolver a situação? Onde e quanto foi investido para dar um conforto hídrico ao menos nas regiões previsivelmente mais afetadas? A resposta é tristemente simples: substancialmente, nada”, disse a especialista.

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SME aponta consequências no setor elétrico

Caso persista por mais tempo, a atual situação de escassez hídrica em Minas Gerais pode resultar no desabastecimento de energia elétrica no Estado, na avaliação da presidente da Sociedade Mineira de Engenheiros (SME), a engenheira Virgínia Campos. Para ela, a redução na produção de energia elétrica é “consequência natural” da restrição hídrica.

“Minas Gerais está interligado ao sistema nacional, o que reduz de forma concreta os riscos de desabastecimento. Porém, como a crise é nacional e todos os reservatórios do País estão reduzidos, os riscos de apagão ficam por conta da capacidade de transporte de energia entre as diversas regiões elétricas”.

Segundo a engenheira, o fornecimento de energia elétrica exige planejamento e obras de longo prazo. “A rejeição à geração de energia de usinas com reservatórios plurianuais, a tendência à judicialização, sobretudo na regularização ambiental, e o não alinhamento à implantação de novas térmicas, com visão de médio e longo prazos, estão expondo o mercado a um possível desabastecimento de energia elétrica”.

“As interligações das bacias, por meio das conexões das hidrelétricas com reservatórios, além de alternativas de fornecimento por meio de outras fontes de geração, representam as soluções para permitir um equilíbrio e redução dos riscos de desabastecimento de energia elétrica”, afirma a presidente da SME.

Duração da falta de energia – Na avaliação de Virgínia Campos, caso o volume de chuvas não aumente até novembro, o fornecimento de energia elétrica ficará comprometido. “Nas condições atuais dos reservatórios de Minas Gerais, se não chover um volume considerável até novembro, é muito provável que se observe reflexos negativos significativos no fornecimento de energia elétrica”.

A engenheira lembrou ainda que, como a geração termelétrica em Minas Gerais está em operação máxima, há pouca flexibilidade para a produção de energia para armazenamento, e algumas hidrelétricas estão operando em regime crítico ou paralisando suas atividades de geração.

“É inerente ao segmento de suprimento de água e energia elétrica o convívio com riscos de garantia de oferta desses produtos. Assim, para mitigar esses riscos, adotam-se soluções alternativas e emergenciais. No caso de os riscos se ampliarem, isso pode significar que pode haver duração e frequência da falta de suprimento em índices maiores”, disse.

Debates – Ela explicou que a SME prepara dois eventos para debater questões relacionadas à escassez hídrica e à situação energética do País, em novembro e em dezembro. O primeiro vai discutir a matriz eletroenergética, hidrologia, riscos e perspectivas futuras e os principais impactos para a sociedade. O segundo, em dezembro, abordará modelos institucionais de governança e governabilidade hídrica. “É preciso dar respostas à sociedade”, frisou a engenheira.

Governo tranquiliza, mas 5 cidades já têm racionamento

Minas Gerais está em situação de alerta com a escassez hídrica. No entanto, o cenário de curto prazo ainda não é de risco de desabastecimento, sobretudo em Belo Horizonte e municípios da região metropolitana. Essa é a avaliação da situação dos reservatórios mineiros feita pelo diretor de Operações da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa), Guilherme Frasson, durante o anúncio do governo estadual da criação de um “Grupo de Resposta à Seca”, no início deste mês, em Belo Horizonte.

“A população pode ficar tranquila sobre a garantia de abastecimento na Região Metropolitana de Belo Horizonte”, afirmou o executivo.

O grupo terá a participação de representantes de diversos órgãos e empresas governamentais que têm relação com o tema, a exemplo da Copasa, da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e do Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam). Segundo Frasson, Minas Gerais tem hoje cinco municípios que estão racionando água: Bugre, Campanário, Rubim, Frutal e Dores do Indaiá registram racionamento de água.

“Estamos tomando medidas para minimizar os impactos nessas cidades e trabalhando para aumentar a produção. As chuvas deste período também podem impactar positivamente, melhorando a captação. Hoje, Minas Gerais, mesmo tendo o cenário de pior estiagem até o ano que vem, não teria risco de chegar ao volume morto dos reservatórios. A situação é relativamente tranquila”, garantiu o diretor da Copasa.

Ações coordenadas – O grupo de combate à seca vai promover ações coordenadas do Estado relacionadas às consequências decorrentes da seca. Um plano de ação está sendo desenvolvido pelo grupo, prevendo atividades de curto, médio e longo prazos, com o objetivo de mitigar os efeitos da falta de água no Estado. Segundo o diretor-geral do Igam, Marcelo Fonseca, as medidas visam dar segurança ao fornecimento, e não existe ainda risco de desabastecimento.

“Independente do período de crise hídrica, é importante que a população faça o uso consciente dos recursos. É preciso ter uma preocupação com esse bem que é limitado. Por isso, precisamos cuidar dele, tanto em quantidade quanto em qualidade. Hoje temos uma segurança nos reservatórios, com um volume bom”, afirma Fonseca.

Fonte: diariodocomercio

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