Resumo
Esse trabalho tem por intuito colaborar com a gestão sustentável das cidades, apresentando uma metodologia para levantamento e classificação dos espaços livres de uma bacia hidrográfica urbanizada, com foco na solução dos problemas de drenagem urbana. A metodologia busca auxiliar na composição de um sistema de espaços livres reestruturador do ambiente urbano, contribuindo para a prevenção e a mitigação do risco de inundações. Através da aplicação desta metodologia espera-se aumentar a resiliência urbana em relação à interface entre o ambiente natural e o ambiente construído. Para validação da metodologia apresentada foi escolhida a Bacia dos Rios Iguaçu e Sarapuí, na Baixada Fluminense, região metropolitana do Rio de Janeiro. Inicialmente foram levantados os espaços livres da área de urbanização consolidada na bacia. Posteriormente, foi desenvolvida a ficha-base de caracterização dos espaços livres levantados e, por fim, a proposição de usos para estes espaços livres segundo a tipologia de parques urbanos multifuncionais existente. Como resultado, é apresentado um mapa do sistema de espaços livres proposto para a área de estudo. Inferiu-se que o cenário atual da bacia reforça a necessidade de consolidar o sistema de espaços livres dentro da urbanização, a fim de impossibilitar a ocupação dos espaços remanescentes, de forma a melhorar a qualidade ambiental da bacia e tentar resgatar parte de suas características naturais. Além disso, os espaços remanescentes (de maior ou menor dimensão) precisam ser incorporados aos projetos de drenagem como possíveis reservatórios temporários, capazes de reorganizar os escoamentos em larga escala.
Introdução
A rápida urbanização e o aumento da população em áreas urbanas levantam preocupações sobre a sustentabilidade das cidades. O desenvolvimento sustentável é um termo amplo, pensado para incluir a equidade social, as questões econômicas e as preocupações ambientais, atendendo às necessidades e aspirações do presente sem comprometer a capacidade de atender as do futuro (Comissão Mundial das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, 1987). A antropização gera transformações significativas na paisagem, com impactos diversos ao meio ambiente. O grau do impacto gerado, porém, está diretamente relacionado ao modelo de urbanização. Quando esse modelo não é pautado em ideais sustentáveis, tanto o sistema natural, quanto a população e o próprio ambiente construído sofrem com consequências desastrosas.
MACEDO (1999) define que a paisagem pode ser considerada como um produto e como um sistema – como produto porque resulta de um processo social de ocupação e de gestão de determinado território e como sistema porque a partir de qualquer ação sobre ela impressa, haverá reação correspondente, que equivale ao surgimento de uma alteração morfológica parcial ou total. Os espaços livres e sua sistematização têm grandes probabilidades de transformação no processo de construção ou reconstrução da paisagem e é impregnado de múltiplos significados (MERLIN & CHOAY, 1988; RONCAYOLO, 2002). Entre seus múltiplos papéis, por vezes sobrepostos, estão a circulação e a drenagem urbana, as atividades de lazer, o conforto, a preservação, a conservação, a requalificação ambiental e o convívio social (SCHLEE et al., 2009). Podem ser os espaços mais promissores do meio urbano, uma vez que podem assumir importantes funções, como: ambientais, de lazer e recreação, lugar de percepção da paisagem, entre outros. Ao mesmo tempo, podem ser os lugares mais frágeis, pois estão mais sujeitos à ocupação indevida e desordenada, quando não reconhecida sua importância fundamental (MCHARG, 1969).
Dentre as modificações associadas ao processo de urbanização, a mudança de uso do solo, com a consequente densificação das construções e impermeabilização de superfícies, altera significativamente a paisagem natural e o funcionamento do ciclo hidrológico, favorecendo o agravamento de inundações e alagamentos, bem como a degradação do ambiente. Falhas no funcionamento do sistema de drenagem impactam diretamente nos demais sistemas urbanos, como habitação, mobilidade, abastecimento de água, esgotamento sanitário, e também nas questões relacionadas à saúde pública e à qualidade de vida da população. Portanto, a redução da infiltração e das oportunidades de armazenamento nas retenções naturais, ocasionadas pelo processo de urbanização, induz ações sobre o sistema drenagem. Logo, pode-se afirmar que o processo de urbanização ocorre em paralelo com a recorrência de inundações, e a drenagem urbana sustentável tornou-se imprescindível para organizar o espaço que perdeu o controle, pois, de todos os desastres naturais, a ocorrência de inundações é o mais frequente (JHA et. al., 2012). A abordagem tradicional para o problema de inundações urbanas buscava soluções de canalização, para adaptar as redes de drenagem aos escoamentos gerados, com uma ótica não sustentável. Conceitos recentes de drenagem sustentável buscam resgatar padrões de comportamento hidrológico pré-existentes (MIGUEZ et. al., 2015). Nesse novo contexto, os espaços livres surgem como sistema fundamental na conjugação com as soluções de drenagem, oferecendo oportunidade de infiltração e armazenagem, em composições multifuncionais.
Sendo assim, pretende-se, com este estudo, conceber uma metodologia para levantamento e classificação dos espaços livres, a partir da ótica da drenagem urbana, mas considerando a interdisciplinaridade e a interação entre diferentes campos do conhecimento, como Engenharia Civil e Ambiental, Arquitetura e Urbanismo e Paisagismo. A metodologia proposta será aplicada à Bacia Hidrográfica dos Rios Iguaçu e Sarapuí, localizada na Baixada Fluminense, região metropolitana do Rio de Janeiro, onde as inundações decorrem basicamente do processo de ocupação e uso do solo inadequado às condições particulares da região (COPPETEC, 2009).