saneamento basico

Estado da arte e perspectivas de reuso de efluente de tratamento secundário de esgotos sanitários na região metropolitana do Rio de Janeiro

Resumo

Nos últimos anos, sobretudo entre 2014 e 2015, várias cidades brasileiras se depararam com inúmeros problemas de desabastecimento de água, ocasionados não somente pela escassez de água bruta como também pelo consumo descontrolado, pela ineficiência e má gestão dos recursos hídricos. Por outro lado, não faltam alternativas para o enfrentamento dessa situação crítica, iniciativas essas que não passam necessariamente pela construção/ampliação dos sistemas de abastecimento.
Como alternativa de abastecimento/fonte de água, o Reuso de efluentes sanitários já é uma prática corrente em vários países do mundo, principalmente naqueles que se convive com situações de estresse hídrico, e surge como uma oportunidade no enfrentamento de crise pelo uso não racional e sustentável da água. No Brasil, com exceção de alguns setores corporativos, o Reuso ainda é incipiente.
O presente trabalho visa avaliar o estado da arte do reuso e as possibilidades de rotas de Reuso dos efluentes das principais Estações de Tratamento de Esgotos (ETE’s) da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, identificadas como fontes localizadas de geração de grandes vazões/volumes de efluentes com boas características de reaproveitamento.
Com essa finalidade e a partir do levantamento de informações por meio de entrevistas, pesquisas e consultas às entidades parceiras do projeto, como FIRJAN, CEDAE, COMLURB, CBH-BG, INEA e FOZ AGUAS 5, está sendo elaborado um mapeamento associado a banco de dados georreferenciados sobre geração e demandas por agua de Reuso na RMRJ. Para auxiliar no levantamento das demandas do setor corporativo, identificado como prioritário para implementação do Reuso, foram elaborados e aplicados questionários eletrônicos junto as principais indústrias, identificadas a partir de cadastro fornecido pela FIRJAN. O presente estudo concluiu que existem potencialidades para o Reuso tais como a existência de fontes confiáveis de efluente tratado em quantidades e qualidade bastante interessantes, como é o caso das ETE’s com tratamento a nível secundário, como Penha, Alegria e Deodoro. Porém, com base nas informações colhidas até o presente, incluindo o levantamento de legislação e de estudos de caso fora do país, pode ser constatado que a carência de incentivos e de legislação especifica/informações mais seguras sobre Reuso são fortes impedimentos a sua implementação na nossa realidade. Também corroboram para o reduzido índice de Reuso que se verifica atualmente problemas logísticos e de interligação em função da grande distância usualmente existente entre geradores (como as ETE’s) e grandes consumidores em potencial, como as indústrias e os parques/distritos industriais. No caso do universo corporativo, a realidade é distinta: premidas por questões como a possibilidade de escassez, aumento exponencial das contas de água, bem como pelas exigências dos órgãos ambientais as empresas vêm adotando crescentemente o Reuso no seu cotidiano.

Introdução

O conceito de Reuso se baseia em procurar utilizar em uma escala controlada serviços que o meio ambiente já nos proporciona naturalmente, através da autodepuração e do próprio ciclo hidrológico: a purificação cíclica da água. Em muitos países a utilização de águas para reuso vem sendo implementada há vários anos, e desempenha uma importante função socioambiental e econômica. Incentivados pela crise e escassez hídrica – em função do aumento do consumo e de problemas ambientais – há países que reutilizam águas servidas para fins potáveis ou, ainda, construíram sistemas específicos para seu melhor aproveitamento. Em Israel, boa parte dos esgotos das cidades é infiltrado propositalmente no solo visando sua depuração e recarga dos aquíferos para posterior reaproveitamento a jusante. De acordo com Nuvolari (2011), esse pequeno país pretendia já em 2015 possuir 70% da água destinada à sua agricultura com origem no reuso. Na Dinamarca, algumas cidades possuem dois sistemas de abastecimento distintos, sendo um destinado à água potável para dessedentação e banho, enquanto que outro é destinado a usos menos nobres, como o funcionamento dos sistemas de esgoto, sendo esse último operado com águas de reuso. Cerca de 62% do reaproveitamento das águas municipais nos EUA é destinada a irrigação, 32% para as indústrias, 5% para recarga subterrânea e os restantes 1% para outros usos (METCALF E EDDY, 1991). No Brasil a demanda por agua para irrigação equivale a 2/3 do total, sendo que em algumas regiões as demandas de água já superam as disponibilidades e, portanto, uma das soluções para superar os déficits é utilizar na agricultura águas que receberam esgoto sanitário, tratado ou simplesmente diluído (NUVOLARI, 2011).

Considerando o grande volume desperdiçado e os impactos ambientais dos corpos receptores, há iniciativas em diversos Estados brasileiros para reaproveitamento das águas de lavagem dos filtros nas ETA’s, retornando-as para o próprio processo com grandes vantagens. O mesmo não pode ser dito em relação aos efluentes domésticos. Uma das principais razões para que isso não ocorra nas áreas urbanas servidas por sistemas de esgotamento sanitário adequados é o fato de que a disponibilização de boa parte dessa vazão se concentra em pontos específicos (ETE´s), onde usualmente não há demanda suficiente e/ou próxima por esse tipo de insumo que justifique os custos inerentes a uma transposição ou recalque ate o ponto de consumo. Portanto, de uma maneira geral, há necessidade de grandes investimentos e obras para o escoamento da água de reuso e viabilização de seu aproveitamento em locais onde a demanda viabilize o projeto.

Havia uma proposta inicial do INEA/SEA de atendimento de parte da demanda prevista para o empreendimento do COMPERJ por meio do efluente tratado, proveniente da ETE Alegria. Esse projeto acabou sendo abandonado por questões de inviabilidade econômica, em função dos problemas inerentes ao COMPERJ, entre eles o próprio “encolhimento” do projeto, a elevada qualidade da água exigida, e a distância entre o produtor e o consumidor de água de reuso. Tais impedimentos se devem em parte a carência do sistema/modelo de planejamento atual em definir e incentivar a implantação de polos de tratamento de resíduos na mesma localidade ou nas proximidades de onde ocorrem as demandas, utilizando dessa forma os conceitos de Ecologia Industrial.

Em São Paulo, com taxas de água e esgoto cada vez mais elevadas e a utilização pelo poder público de instrumentos de penalização (multas) pelo uso de água em excesso, o Reuso passou a ser cada vez mais atrativo economicamente para as empresas que consomem mais água, sendo o mesmo incentivado e incorporado ao processo industrial, especialmente no próprio local onde o efluente tratado é gerado. Também no RJ a água de reuso possui vocação predominantemente industrial, pois é a opção mais viável, considerando que a potabilização ainda é em muitos casos proibitiva, devido aos custos que envolve e a falta de normatização sobre o tema. Algumas indústrias fluminenses já adotaram o reuso, uma vez que a utilização de água potável da rede pública gera custos tais que justificam a implantação de um sistema próprio de reaproveitamento e retorno da água tratada para o processo.

Há também as exigências da legislação ambiental, como a Lei Estadual 6034/2011, que dispõe sobre a obrigatoriedade dos postos de combustíveis, lava-rápidos, transportadoras e empresas de ônibus urbanos intermunicipais e interestaduais, localizados no RJ, a instalarem equipamentos de tratamento e reutilização da água usada na lavagem de veículos. Além das iniciativas pontuais de empresas, o reuso de água também vem sendo implementado no RJ a partir de iniciativas de empreiteiras junto a CEDAE que utilizaram efluente tratado a nível secundário da ETE Alegria, após cloração, para uso nas obras do Projeto Porto Maravilha. Há também o aproveitamento de uma pequena parcela do esgoto tratado da ETE da Penha pela COMLURB para lavagem de ruas, feiras e afins. Essas informações devem ser consideradas como meras estimativas, tendo em vista a carência de dados mais detalhados mais detalhada sobre o funcionamento desses sistemas. De acordo com informações colhidas de maneira informal, o preço cobrado é meramente simbólico, e essa prática ainda é pouco representativa, tendo em vista os impedimentos relacionados aos problemas de transporte da água de reuso desde a sua fonte até o seu destino. Sabe-se, todavia, que existe um potencial de demanda muito maior, tendo em vista não somente a elevação das taxas de água como, em muitos casos, as dificuldades de abastecimento de algumas áreas urbanas no Rio de Janeiro. Essas dificuldades de atendimento das demandas podem inclusive impedir ou cercear o maior desenvolvimento econômico de área ou região pela carência água.

Há ainda outras fontes potenciais de águas servidas (de reuso): trata-se dos efluentes de 17 ETE´S da área de concessão municipal na zona oeste (AP-5). A RMRJ se situa estrategicamente no exutório da respectivamente Bacia o que torna o reuso ainda mais atrativo, tendo em vista que suas águas servidas, são escoadas para o oceano não sendo aproveitadas a jusante, como é o caso por exemplo de cidades no Vale do Paraíba. Em se tratando do RJ e de suas particularidades, identifica-se prioritariamente o uso industrial como o de maior potencial para as águas de reuso, especialmente em setores que demandam maiores quantidades e ao mesmo tempo menos exigente em relação à qualidade da água, embora seja importante ressaltar que as exigências são determinadas em função das necessidades dos próprios processos produtivos. De uma água para lavagem de piso se exige uma qualidade bem inferior às necessidades de uma água a ser utilizada para fins mais nobres, como por exemplo, para fins de incorporação ao processo industrial, contato primário e outro. As áreas/zonas industriais são os locais mais atrativos, pois concentram em uma área relativamente reduzida uma grande quantidade de potenciais consumidores de água de reuso. Empresas como a REDUC utilizam grande quantidade de água, nas variadas etapas dos seus processos, sendo, portanto, grandes clientes em potencial.

Já tendo sido aplicada com êxito em outras áreas, a Ecologia Industrial é um conceito em que se propõe a atingir uma maior sustentabilidade e ganhos socioeconômicos e ambientais através da racionalização na utilização de recursos naturais necessários aos processos produtivos, agrupados na forma de condomínio ou parque industrial (MAGRINI e VEIGA, 2012). Nesse modelo, os resíduos de uma determinada atividade são aproveitados como insumos de outra atividade e assim sucessivamente. Frente à tradicional concepção da economia como um sistema aberto e linear – que extrai matérias-primas do meio ambiente e devolve, em forma de poluição, resíduos e grandes quantidades de subprodutos não utilizados – esse modelo foi concebido de forma a realizar a transição da lógica de produção linear para a de ciclo fechado (WELLS e ZAPATA, 2012) (EHRENFELD e GERTLER, 1997). A atividade industrial baseada nesta concepção pode, portanto, diminuir sensivelmente os impactos associados à poluição e ao descarte de resíduos, enquanto também racionaliza o consumo de recursos estratégicos como a água (VEIGA, 2007). A Ecologia Industrial pode ser utilizada como uma ferramenta para melhorar a gestão em várias vertentes. Como na gestão mais adequada de recursos hídricos, ao racionalizar a utilização de insumos, incluindo o consumo de água, contribuindo, portanto, para diminuir a dependência em relação aos recursos, o que se torna de grande valia especialmente em períodos de escassez.

Há basicamente quatro grandes obstáculos para implementação da utilização da água de reuso que foram identificados: 1-falta de cultura, base de dados, conhecimento e legislação especifica sobre o tema; 2-carência de incentivos; 3-a distância usual entre os centros geradores e os empreendimentos com maior potencial de demanda/consumo de água de reuso; 4- envolvimento de uma grande variedade de órgãos/entidades de diferentes esferas institucionais e de governança, dificultando uma ação mais planejada/coordenada. Há, portanto, a necessidade de maior aprofundamento no conhecimento não somente das potencialidades como também das restrições de forma a subsidiar proposições medidas que resultem em uma maior difusão e operacionalização de sistemas de reuso, especialmente na realidade do RMRJ e do Rio de Janeiro.

Autores: Marcelo Obraczka; Adriana Monteiro S. Campos; Douglas do Rosário Silva; Skarlat Reynnely Alves e Gustavo Silva Ferreira.

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