Consumidores Liminares Sabesp Desconto
Por Luiza Calegari
Pelo menos quatro empresas já conseguiram liminares na Justiça para obrigar a Sabesp a manter contratos de fornecimento de água com descontos.
Os abatimentos eram oferecidos a grandes consumidores, como estabelecimentos comerciais, hospitais e museus, e foram revistos com a privatização do serviço.
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Primeiramente desde o fim de outubro, a Sabesp vem comunicando esses clientes sobre a rescisão dos contratos. Os descontos, estimados em R$ 800 milhões por ano, não são totalmente reconhecidos pela Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo (Arsesp) – ou seja, o benefício se reverte em uma perda de receita para a companhia, o que o mercado chama de “gap” regulatório. Para os grandes consumidores, o aumento na tarifa de água pode chegar a 200%.
Uma das liminares foi concedida ontem pela 35ª Vara Cível de São Paulo.
Portanto o juíz considerou que o contrato entre as partes vem sendo cumprido pelo estabelecimento comercial, “seja pelo pagamento do preço pelo consumo, seja por não buscar fontes alternativas de fornecimento”. O juiz entendeu também que o aumento de preço decorrente da rescisão tem potencial para “desestabilizar a operação financeira” da empresa (processo nº 1196418-45.2024.8.26.0100).
Consumidores Liminares Sabesp Desconto
Portanto outra decisão foi concedida pela 15ª Vara Cível de São Paulo. A liminar afirma que a rescisão unilateral do acordo poderia “ocasionar prejuízos irreversíveis” ao estabelecimento comercial. O aumento previsto para a tarifa seria de 153,59% (processo nº 1194985-06.2024.8.26.0100).
Também há decisão da 3ª Vara Cível de São Paulo, que considerou que havia “fundado receio de dano irreparável” para o consumidor com o rompimento unilateral do contrato (processo nº 1198883-27.2024.8.26.0100).
Ademais no Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), o desembargador Carlos Russo, da 30ª Câmara de Direito Privado, concedeu liminar para manter o contrato “balizando limites de cobrança de faturas de consumo de água, coleta e tratamento de esgoto” até o julgamento final do recurso. O magistrado apontou que estavam presentes requisitos de “relevância e urgência” (processo nº 2386326-16.2024.8.26.0000).
O Processo
Contudo o advogado Lucas Souza, que defende as empresas nos processos, afirma que as decisões judiciais são “um passo fundamental para conter práticas que desestabilizam economicamente grandes consumidores e, por consequência, toda a cadeia produtiva”.
Portanto ele ajuizou 11 pedidos e sete deles ainda não foram analisados. Há mais 10 ações para serem distribuídas antes do recesso do Judiciário, que começa amanhã, segundo ele, “sendo uma delas uma ação coletiva de um grande setor afetado”.
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Em conclusão o rompimento unilateral é uma possibilidade prevista nos contratos que garantem os descontos, que por serem “por adesão” não podem ter cláusulas negociadas. Segundo o modelo, consumidores com um volume maior que 100 m³ mensais têm direito de aderir às condições e pagar menos pela tarifa de água.
No momento, a Sabesp começou a discutir com a Arsesp uma nova política de descontos aos clientes de maior porte, segundo afirmou ao Valor o novo presidente da empresa de saneamento, Carlos Piani. Em nota enviada ao Valor, a empresa informa que vai se manifestar “oportunamente no processo”. E destaca que “a rescisão dos contratos de demanda firme estava expressamente autorizada nesses contratos e, principalmente, respeitou as regras impostas no novo contrato de concessão”.
Contudo conforme os cálculos da We Save, empresa de consultoria em gestão hídrica presidida por Lucas Souza, para clientes que consomem de 500 a 1 mil m³ o aumento da conta pode ser de 63%. E para aqueles com consumo superior a 400 mil m³ mensais, com contratos anteriores a 2018, o aumento é de mais de 200%.
A mudança repentina é um fator adicional de estresse para os empresários, de acordo com Bernardo Marchesini, sócio fundador da RMS Advocacia e Consultoria. “Grandes empresas, como as afetadas, têm seu orçamento e planejamento econômico feito com grande antecedência e uma alteração repentina pode comprometer todo esse planejamento”, diz.
Valor
Esse aumento drástico dos gastos certamente será repassado ao consumidor, conforme aponta Luiz Friggi, sócio do Simões Pires. “Se uma indústria que coloca alimento no supermercado passa a ter uma conta de água 200% maior, ela vai ter que repassar esse custo para o produto, inevitavelmente.”
Em suma os advogados criticam a postura da Sabesp de enviar as notificações sem tentar uma negociação prévia diretamente com os grandes consumidores. “Não se está apresentando uma alteração paulatina, que permita uma análise e um preparo dessas grandes empresas para absorver esse aumento de custo”, afirma Marchesini.
Diante desse cenário, os especialistas ponderam que restam poucas alternativas além da via judicial, apesar de seu resultado incerto. “O ideal seria que a Sabesp desse um passo atrás e passasse a negociar as alterações do contrato”, diz Luiz Friggi.
Danielle Franco, especialista em Direito Administrativo do GVM Advogados, aponta que, após a privatização, a , a princípio, tem autonomia para gerir os contratos da forma que for mais conveniente. “O desconto era uma política pública de renúncia fiscal da Sabesp , que hoje não é mais responsabilidade pública, mas sim uma empresa privada”, afirma. “Por outro lado, as condições pactuadas precisam ser ponderadas pra evitar surpresa aos contratantes, que não têm ligação direta com a privatização.”
Friggi destaca que não é incomum que o Judiciário intervenha em contratos privados para declarar a abusividade de cláusulas específicas. “É importante lembrar que o contrato não pode ser visto cláusula por cláusula, mas de forma integral, levando em conta a boa-fé das partes e a função social do acordo”, diz.
Fonte: Valor.