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Resíduos sólidos ganham vida através de iniciativas de coleta seletiva e reciclagem

Há dez anos, o lixo descartado na cidade possui duas “mães” que sabem dar um destino correto a ele. E também sabem corrigir o termo, se for necessário: “Não é lixo, é material reciclável!”, diz Cacilda Soares Viana, 45, “ex-catadora de lixo” e atual presidente da Cooperativa de Catadores do Amazonas (Coopcamam). Com muito esforço e esperança, elas e outras 25 pessoas sobrevivem daquilo que nós rejeitamos em nossas casas: o lixo.

É que, de acordo com dados da Secretaria Municipal de Limpeza Urbana e Serviços Públicos (Semulsp), 70% das 80 mil toneladas de resíduos sólidos que vão parar no aterro controlado de Manaus todo mês poderiam ser reaproveitados e Manaus recicla menos de 2% dos resíduos que produz diariamente.

No galpão onde funcionam os núcleos 3 e 4 de coleta seletiva, Cacilda e Amélia dos Santos de Moraes, 53, é quem dão as ordens. “Trabalhamos juntas há mais de anos e estamos nesse galpão desde dezembro”, diz Cacilda, orgulhosa.

A estrutura, localizada na rua Helena Cardoso, bairro Santa Etelvina, Zona Norte, faz parte de um longo trajeto percorrido pelos resíduos, da lixeira das casas até voltarem às indústrias. De lá do galpão, objetos como garrafas PET, papelão, livros, cadernos, ferro, madeira, vidro e latinhas ganham novos “clientes”.

“As pessoas sabem que aqui é um ponto de reciclagem e vêm comprar e vender coisas. Tem muita empresa de São Paulo que compra plástico aqui. É daqui que eu tiro o sustento da minha casa e pago remédios pro meu marido doente. O emprego lá fora é mais difícil para a gente, que não tem estudo nenhum”, diz Amélia, que conta não sentir saudades do tempo em que vivia como catadora no antigo lixão. “Lá tinha de tudo, cachorro, bicho, urubu, era tudo misturado e perigoso pra gente. Aqui não tem o fedor”, desabafa. “Nós estamos tirando esse material da rua e o meio ambiente fica mais alegre”, completa.

Mais do que “limpar e alegrar” a cidade, elas lucram com o trabalho no galpão. O faturamento mensal pode chegar a R$ 15 mil, e tudo é dividido igualmente entre todos os trabalhadores.

‘Mãos à obra’

Mas não é somente da compra e venda de materiais que o galpão de Cacilda e Amélia se mantém ativo. Pelo contrário: há muito trabalho todos os dias. No galpão com pouco mais de 500 m², 25 pessoas arregaçam as mangas de segunda a sábado para deixar aquilo que descartamos mais próximo de voltar às prateleiras. Martelos, furadeiras e movimentos repetitivos marcam o dia-a-dia do grupo de catadores.

Cacilda explica que eles até desenvolveram “técnicas” para deixar os clientes mais satisfeitos. “Tem cliente que só compra garrafa desfiada pra fazer vassoura de plástico. Outros compram só papel misto, ou só papelão prensado. Dependendo de como for, o preço é diferente”, pontua.

Uma década de coleta seletiva

A coleta seletiva iniciou em Manaus no ano de 2005. De acordo com Adriano Rodrigues e Joeane Ladislau, presidente e vice-presidente da Comissão Especial de Divulgação e Orientação da Política de Limpeza Pública (Cedolp), os primeiros passos foram dados após a retirada de uma série de catadores, hoje regularizados, do lixão da capital.

“Só o fato de termos tirado esses catadores de um lugar insalubre e os colodado em galpões já é um grande avanço”, disse Joeane. Localizado no quilômetro 19 da AM-010, hoje o local é um aterro sanitário licenciado pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam).

Papel de cada um

Apesar dos catadores realizarem os trabalhos mais importantes na destinação dos resíduos, os integrantes da Comissão explicam que a população pode cumprir a sua parte nesse ciclo. Isso porque quatro Pontos de Entrega Voluntária (PEV) espalhados pela cidade recebem materiais e, assim, aproximam a sociedade desse contexto sustentável.

“Temos esses pontos instalados no Parque do Mindu, no Bilhares, Japiim e Dom Pedro. O que percebemos é que mesmo com o número baixo, a população já está entendendo essa questão da coleta seletiva”, afirmou Adriano.

Sobre novos projetos para alcançar índices maiores de reciclagem na capital, Adriano e Joeane acreditam que o principal foco deve ser na “sensibilização”. “O nosso grande problema hoje são as lixeiras viciadas, fruto de uma cultura de Manaus e muitos outros locais. Muita gente pensa ‘eu sou gerador do meu lixo, mas eu não quero que o meu rejeito esteja na frente da minha casa’. Isso é ruim e prejudica todo um trabalho”, disse.

Os integrantes ainda comentam o descarte ilegal feito em áreas verdes, os quais são praticados principalmente por grandes empresas. Segundo a Semulsp, o órgão não possui poder punitivo, porém, todos os casos em que é necessária a aplicação de penalidades, o município age por meio da Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semmas).

Negócio

Na Coopcamam, nenhum lixo é tratado como tal. Toda a quantidade recebida passa por tratamentos diferenciados nos diversos “setores” da cooperativa. A organização é tamanha que os produtos que chegam no galpão já possuem um preço fixo para os clientes.

Por exemplo, 1 kg de papelão custa para os clientes R$ 0,18, já o quilo do plástico em sacola é um pouco mais caro, valendo R$ 1,20. Um quilo de metal em latinhas chega a R$ 2,30 e a mesma quantidade de papel misto (colorido) está em torno de R$ 0,15.

A tabela de preços, segundo Cacilda, leva em consideração o trabalho realizado pelos catadores. “É tudo feito a mão por nós. A gente rasga papel, amassa latinha, corta os PET e até tudo isso virar outra coisa depois, tem que passar por aqui”, afirma a presidente.

Os resíduos que chegam na cooperativa são visados principalmente por empresas que fazem “vassouras ecológicas” e formas de ovos. Ela destaca também a grande demanda por latinhas e plástico desfiado. Cacilda se orgulha do trabalho feito pelo grupo. “Isso aqui não vai pra dentro do igarapé, pro esgoto e nem pro lixão, por isso fico feliz”.

“Mais alegre”

A ex-catadora de lixo e atual presidente da Coopcamam já teve que tirar o seu próprio sustento do lixão. Aos 45 anos, Cacilda Soares afirma ter mudado de vida ao descobrir os lucros provenientes da reciclagem na capital, que ainda apresenta um índice baixo de reutilização.

Cacilda e Amélia Santos, 53, vêm de uma geração de catadores que entravam clandestinamente em depósitos de lixo para conseguir materiais com condições de reaproveitamento.

Após Manaus aderir à coleta seletiva, em meados de 2005, os catadores passaram a ter alguns espaços apropriados para dar continuidade às vendas. Segundo Amélia, o aumento das vendas no galpão onde atua aponta um futuro promissor para a reciclagem em Manaus e um “alívio” ao meio ambiente.

Plano Estadual

De acordo com a Secretaria de Estado de Meio Ambiente (Sema), o órgão está em processo de elaboração de um Plano Estadual de Resíduos Sólidos (PERS), cujo objetivo é criar junto às 62 prefeituras municipais uma política adequada atendendo as peculiaridades de cada cidade.

A Secretaria explica que a criação do plano atende uma meta do Governo Federal pela Lei Federal nº. 12.305/2010, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos. Segundo a Sema, o plano deve ser concluído ainda neste semestre.

Sobre dados de reciclagem do interior do Estado, a Sema explica que a coleta seletiva sistematizada só existe em Manaus, porém os outros municípios participam por meio de associações de catadores, mas que não são incorporadas ao sistema de coleta municipal. Pela ausência de políticas nesse meio, boa parte do lixo do interior do Estado é levada para lixões a céu aberto.

 

 

Fonte: UOL

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