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Falta ambição à política ambiental brasileira

São Paulo — Em junho, a presidente Dilma Rousseff anunciou o compromisso de acabar com o desmatamento ilegal da Amazônia até 2030, em seu encontro com o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, em Washington. Para especialistas como Carlos Rittl, secretário executivo do Observatório do Clima, rede de organizações que monitoram e discutem mudanças climáticas no Brasil, faltou ambição nessa meta.

A organização encaminhou ao governo uma proposta de contribuições que o país pode apresentar na COP-21, conferência da Organização das Nações Unidas para o clima, que ocorrerá em dezembro em Paris e deverá gerar um acordo de redução das emissões de carbono para valer depois de 2020. Entre as propostas está zerar qualquer desmatamento — não apenas o ilegal. Carlos Rittl deu a seguinte entrevista a ­EXAME.

Exame – Qual é o impacto da recente declaração da presidente Dilma Rousseff nos Estados Unidos?

 

Carlos Rittl – A presidente não precisava se deslocar mais de 6 000 quilômetros para anunciar que vai cumprir a determinação já prevista no Código Florestal. Hoje, o Brasil tem de 60 milhões a 100 milhões de hectares de pastagens degradadas, abandonadas ou subutilizadas. São áreas que poderiam produzir alimentos para atender à demanda interna e externa, sem necessidade de desmatar 1  hectare a mais. Deveríamos discutir desmatamento zero, não somente desmatamento ilegal.

Exame – A atual política de governo brasileira contempla as principais oportunidades nessa área?

Carlos Rittl – A lei prevê a recuperação de 24 milhões de hectares até 2030, o dobro do que Dilma prometeu restaurar. No entanto, até agora não houve um movimento real para alcançar esse objetivo. Um prazo de 15 anos pode ser tempo demais para isso. Estimativas mais otimistas mostram que poderíamos chegar perto disso em apenas cinco anos. É preciso que a floresta seja vista como um ativo da economia brasileira que pode trazer grandes vantagens para o país.

Exame – Que exemplo pode ser dado do impacto econômico de uma política forte nesse sentido?

Carlos Rittl – A crise hídrica que recaiu sobre a Região Sudeste é o melhor exemplo de que desmatar tem consequências econômicas palpáveis. A alteração da vazão dos rios está diretamente conectada ao desmatamento e põe em risco nossa capacidade de geração de energia, amplamente baseada em hidrelétricas. Hoje vemos diversos países do mundo tomando para si a ideia repetida pelos ambientalistas: sustentabilidade é também uma questão de vantagem competitiva.

Exame – China e Estados Unidos, os maiores emissores de carbono da atualidade, já enxergaram a vantagem de investir em energia limpa. O Brasil, referência em matriz energética limpa, está ficando para trás?

Carlos Rittl – Enquanto o mundo procura alternativas, cerca de 70% dos investimentos do Brasil em energia para os próximos dez anos estão voltados para combustíveis fósseis. Ao mesmo tempo, o ­país não tem uma política energética clara. Temos instrumentos de políticas, como os leilões, mas não são suficientes. É necessário dar algum nível de segurança ao mercado para que ele se desenvolva.

Os investidores precisam saber se existem objetivos concretos de mudança da matriz energética brasileira. Os preços das energias renováveis modernas estão caindo assustadoramente. O mercado internacional vem provando que elas são viáveis e competitivas, basta que tenhamos incentivos e visão estratégica por parte dos governos.

Exame – O primeiro leilão de energia solar do país, em 2014, foi um avanço?

Carlos Rittl – O volume leiloado, equivalente a 1 gigawatt de energia solar, é muito pequeno diante do potencial que temos e numa matriz de cerca de 130 giga­watts. A China, a cada dois meses, acrescenta cerca de 2 gigawatts em sua matriz. Na Índia, a meta é sair do zero e chegar a um potencial instalado de 100 giga­watts de energia solar em oito anos.

Apesar do diálogo com os Estados Unidos, o Brasil não propôs um acordo de cooperação para energia. Poderíamos ter associado ao compromisso de investimento em fonte solar acordos comerciais e de cooperação técnica. E isso não foi feito. Só vamos dar o salto que falta se tivermos uma política energética com metas claras e associadas às políticas fiscal, tributária, industrial e de ciência e tecnologia. Falta ambição ao Brasil.

Exame – Por que o setor de transportes, presente na proposta enviada pelo Observatório do Clima ao governo, deve fazer parte dessa discussão?

Carlos Rittl – O transporte de carga no Brasil atualmente é muito baseado em rodovias, o que nos leva a ter emissões de carbono significativas nesse setor. O governo prevê a ampliação das ferrovias, mas elas se concentrarão no transporte de minério de ferro, quando poderiam ser usadas também para insumos agrícolas.

Outro ponto importante é a baixa eficiência de motores de caminhões e carros. Ainda há carros em circulação com motores tão ineficientes quanto eram os da década de 80. Na seara do transporte público, temos de retomar a eletricidade e o etanol; e deixar, aos poucos, o diesel.

O etanol brasileiro é extremamente eficiente do ponto de vista de conversão de energia, mas vem sofrendo com o controle estatal de preços da gasolina. É preciso onerar o combustível mais poluidor e desonerar o menos poluidor. E também onerar o carro cujo motor emite mais gases poluentes e desonerar o que emite menos.

Exame – Alguns setores da indústria defendem que metas ambiciosas poderiam travar o desenvolvimento do país. Qual é sua opinião?

Carlos Rittl – Se relacionarmos o crescimento quase nulo que tivemos em anos recentes com o crescimento de quase 8% das nossas emissões em 2013, fica claro que emitir poluentes não está diretamente associado a crescimento econômico. À medida que as indústrias assumirem o compromisso de se tornar mais eficientes, reduzindo seu consumo de energia, elas terão ganhos. Não se trata de “ser verde”, mas de ser mais produtivo.

Exame – Uma das principais propostas para a COP-21 é, pela primeira vez, montar um sistema unificado para registrar e quantificar as metas de todos os países. Na sua opinião, qual é a importância dessa medida?

Carlos Rittl – Não há outro caminho. É muito importante que os países atendam aos requisitos de transparência e clareza em suas metas. Estamos num estado de emergência climática e não dá para fugir da transparência dos números.

Fonte: REVISTA EXAME

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