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Merkel chega ao Brasil e busca melhora em investimentos

Ninguém espera as promessas multibilionárias de investimentos trazidas pela China. Nem a forte simbologia do reatamento com os Estados Unidos depois do escândalo de espionagem eletrônica. Sem megalomanias, Brasil e Alemanha apostam no pragmatismo para reforçar uma parceria estratégica e de longo prazo, que tem a área de pesquisa científica e de inovação como um de seus novos carros-chefes.

Em um encontro marcado para amanhã, no Palácio do Planalto, a presidente Dilma Rousseff e a chanceler Angela Merkel devem assinar em torno de 12 acordos – iniciativas que vão da exploração de terras raras (metais usados em produtos de alta tecnologia) ao intercâmbio de dados em pesquisas marinhas, passando pelo lançamento de editais para projetos conjuntos de inovação industrial. Financiamentos alemães para mobilidade urbana e energias renováveis, além de uma doação de € 23 milhões para o projeto de regularização ambiental de imóveis rurais na Amazônia, também estão previstos.

Em paralelo à agenda bilateral, o encontro é uma tentativa dos dois países de acertar os ponteiros em temas multilaterais. Às vésperas da COP-21, a conferência internacional que buscará fechar em dezembro um novo acordo para enfrentar as mudanças climáticas, Dilma e Merkel querem marcar posição em torno de compromissos ousados no combate ao aquecimento global.

A reforma das Nações Unidas, em que Brasil e Alemanha reivindicam um assento permanente no conselho de segurança, e o direito à privacidade na internet também serão objeto de conversas. “Os alemães nos veem como a nação emergente mais próxima de seus ideais e visões de mundo”, define o diretor do Departamento de Europa do Itamaraty, Oswaldo Biato, um dos principais responsáveis pela organização da visita.

Talvez a melhor medida da importância dada por Merkel às relações com o Brasil esteja no tamanho de sua comitiva. Ela trará mais de dez ministros ou vice-ministros para reuniões com seus colegas brasileiros. Em pleno agravamento da crise política e com previsões de uma queda de até 2% no PIB de 2015, a dama de ferro europeia fez questão de manter sua visita ao país, mesmo tendo recebido sinais diplomáticos de que o Planalto entenderia um eventual adiamento.

“Com ou sem crise, tendo um governo de direita ou de esquerda, o Brasil é altamente relevante e a Alemanha pretende demonstrar com serenidade sua intenção de reforçar essa parceria”, afirma Felix Dane, chefe do escritório brasileiro da Fundação Konrad Adenauer, um centro de estudos ligado ao CDU, o partido democrata-cristão, que tem em Merkel sua principal liderança.

Ao contrário de autoridades americanas e chinesas, que vieram a Brasília como escala de périplos mais amplos pela América Latina, a chanceler alemã pegará um avião para ficar menos de 24 horas do lado de cá do Atlântico. Ela chega hoje à noite. Essa será a primeira reunião do mecanismo de consultas intergovernamentais de alto nível. Trata-se de um arranjo que a Alemanha tem com poucos parceiros – França, Itália, Israel, Polônia, Espanha, Holanda, Rússia, China e Índia – e foi celebrado com o Brasil em janeiro de 2013.

Para quebrar o gelo, as duas chefes de governo mais poderosas do planeta têm assuntos de sobra. A goleada de 7 a 1 é pauta quase inevitável. Merkel, uma fanática por futebol que esteve duas vezes no Brasil para a Copa do Mundo, já convidou auxiliares de Dilma para ir à Alemanha somente com o objetivo de assistir aos jogos da Bundesliga. Outro ponto em comum são os regimes alimentares: a chanceler alemã, depois de ter fraturado a bacia em um acidente de esqui, perdeu dez quilos trocando salsichas e pães por uma alimentação rica em frutas e vegetais. Hoje é viciada em cenouras e pimentões fatiados para enganar a fome. Dilma, como se sabe, tornou-se adepta da dieta Ravenna e de pedaladas.

Depois das amenidades, elas têm uma lista robusta de declarações e memorandos de entendimentos para assinar. O BNDES receberá € 265 milhões do banco de fomento KfW para financiar sistemas de transporte público eficientes e sustentáveis. Cinco novos acordos envolvem o Ministério de Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI). “A nossa trajetória é de relações ousadas e ambiciosas”, enfatiza o ministro Aldo Rebelo. Animado com a perspectiva dos convênios, ele faz uma comparação: “Algumas empresas alemãs são mais antigas no Brasil do que as nossas próprias instituições ou os nossos clubes de futebol”.

O Instituto Geomar, de Kiel, fará intercâmbio de dados e promoverá pesquisas marinhas com o Brasil. A ideia é aproveitar o conhecimento do instituto com a observação oceânica no Atlântico Norte. Um acordo de cooperação vai estimular parcerias para a identificação de oportunidades para exploração de terras raras no país. Os alemães querem reduzir a dependência da China no fornecimento dos metais. No sábado, está prevista a inauguração da Torre Alta da Amazônia, um observatório de 325 metros em Uatumã (AM) que vai monitorar o efeito das mudanças climáticas nas florestas tropicais. O projeto teve financiamento germânico e um novo compromisso deve ser celebrado.

“Essa visita não trará anúncios surpreendentes, nem cifras bilionárias, mas mostra exatamente como a Alemanha trabalha de forma muito sistemática e com visão de longo prazo”, afirma Roberto Abdenur, ex-embaixador em Berlim e membro do conselho curador do Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri). Ele diz esperar um sinal de engajamento nas negociações de um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia. Merkel tem condições, na sua avaliação, de influenciar positivamente os sócios na UE.

Nenhum ponto da agenda talvez seja tão importante, sob o ponto de vista alemão, quanto a agenda climática. O tema será alvo de uma declaração conjunta à parte. Trata-se de uma área em que a Alemanha, na liderança pela redução das emissões de gases-estufa, tenta exercer protagonismo mundial.

A comitiva de Merkel anunciará financiamento para a instalação de painéis solares em habitações populares do programa Minha Casa, Minha Vida, e fará uma doação de € 54 milhões – recursos divididos entre um aporte no Fundo Amazônia e apoio ao cadastro ambiental rural. Acima de tudo: busca-se consolidar o Brasil, por sua liderança entre os emergentes, como uma “ponte” para o diálogo Norte-Sul em temas globais, principalmente na COP-21, que ocorrerá em Paris.

Tudo bem, mas seria ainda melhor se o Brasil não estivesse adotando medidas incoerentes com essa imagem de liderança, segundo o coordenador da campanha de clima do Greenpeace Brasil, Pedro Telles. O crescimento das emissões oriundas do transporte individual, o uso massivo de usinas térmicas movidas a combustíveis fósseis e a demora em zerar o desmatamento ilegal jogam contra esse legado.

Telles aponta um retrocesso em aspectos centrais da agenda ambiental. “Nos oito anos de governo Lula, houve a criação de 60 mil km2 de unidades de conservação e 111 mil km2 de terras indígenas. Essa é uma forma comprovadamente eficaz de conter o avanço do desmatamento”, ressalta o ativista. Nos quatro anos e meio de governo Dilma, foram 8 mil km2 de unidades de conservação e 3 mil km2 de terras indígenas.

Fonte: Valor Econômico

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