saneamento basico

Uso de biogás de ETE’s em ciclos de geração termoelétrica

Resumo

Atualmente, a necessidade do desenvolvimento de novas tecnologias voltadas para a produção de energias renováveis se intensifica. Na mesma direção, nota-se um significativo aumento das quantidades de efluentes que chegam às Estações de Tratamento de Esgoto (ETE’s), e consequente elevação da demanda energética no setor.
Uma das etapas do processo de tratamento é a biodigestão anaeróbia, responsável pela fermentação do lodo, gerando biogás através de suas reações. Este gás possui alto potencial energético, podendo ser utilizado como combustível em ciclos de geração termoelétrica.
Os ciclos termoelétricos consistem na geração de calor na queima de combustíveis, proporcionando a passagem de fluidos que sejam capazes de movimentar turbinas a gás (Brayton) ou a vapor (Rankine), capazes de gerar energia elétrica.
Diante disso, foi adotada como modelo a ETE São Miguel e simulada uma unidade local de geração, procurando-se analisar de forma preliminar a viabilidade de uso desse biogás como combustível.
Com base nesse estudo, nota-se que esta aplicação do biogás traria resultados satisfatórios quanto a sua capacidade energética. Assim, a proposta desenvolvida poderá ser aplicada a casos similares e estimular a busca por esta e outras tecnologias visando eficiência energética e o gerenciamento de subprodutos provenientes do tratamento de esgotos no Brasil.

Introdução

Desde a Conferência de Estocolmo, organizada pelas Nações Unidas em 1972, aborda-se as dimensões de desenvolvimento sob o quadro socioambiental contemporâneo, uma vez que os impactos humanos ao meio ambiente não se referem especificamente a um problema de adequação ecológica de um processo social, mas a uma mudança substancial deste desenvolvimento.

Questões ambientais juntamente com as recentes tecnologias, transformaram prioritariamente a expansão da capacidade de geração de energia no Brasil e no mundo, visando propor alternativas no que se refere à eficiência energética e fontes renováveis, através do uso adequado de recursos naturais disponíveis, otimização do processo de tratamento de esgoto e redução de custos operacionais, possibilitando assim, a valorização ambiental e o desenvolvimento sustentável.

De acordo com Rosa (2017), o que de fato impede o aproveitamento do biogás de ETE’s no Brasil, é o conservadorismo do setor de saneamento, e não a viabilidade técnica ou econômica. Diante de tal realidade, o papel dos profissionais da área de engenharia como parte da sociedade, é propor soluções tecnológicas de forma a demonstrar os possíveis benefícios obtidos e quebrar esse estereótipo, já que o custo com energia elétrica é um dos principais custos operacionais de uma ETE.

A função das estações de tratamento de esgoto (ETE) consiste em reproduzir, através de processos físicos, químicos e/ou biológicos, em curto período, condições necessárias e suficientes, normalmente encontradas na natureza (em corpos hídricos receptores tais como rios, lagos e banhados), para promover a decomposição da matéria orgânica presente nos esgotos. Ao final do processo, tanto a fase líquida quanto a sólida devem estar aptas, segundo legislação ambiental impostos pelo padrão de saúde da Resolução CONAMA nº 357/2005.

A Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – Sabesp, adota diferentes processos para tratamento dos esgotos, que variam em função do tipo e situação do efluente. Desta forma, o esgoto bruto pode ser submetido à diferentes níveis de tratamento: preliminar, primário, secundário e terciário. No Brasil, a maioria das ETE’s realiza o tratamento até o nível secundário, sendo raros os casos onde é adotado o terciário. (ReCESA, 2013).

A ETE tomada como modelo para o estudo é a ETE São Miguel, que utiliza o processo de lodo ativado:

O processo de biodigestão anaeróbica é desenvolvido por uma sequência de ações realizadas por vários tipos de bactérias responsáveis pela remoção de matéria orgânica, no qual se podem distinguir quatro fases subsequentes: hidrólise, etapa de quebra das moléculas mais complexas em carboidratos mais simples, aminoácidos e ácidos graxos (reação com a água). A acidogênese, onde é feita a conversão dos compostos solúveis produzidos na hidrólise para ácidos graxos voláteis. Depois a acetogênese, onde bactérias acetogênicas oxidam os ácidos graxos de cadeia longa para acetato, CO2 e H2. E por fim a metanogênese, onde bactérias metanogênicas produzem gás metano.

Através da decomposição anaeróbia da matéria orgânica, dentro do biodigestor, a quantidade de oxigênio decai e as reações anaeróbias se desenvolvem. Com a continuidade da queda do potencial de óxido-redução os microrganismos responsáveis pela conversão do material orgânico em metano e dióxido de carbono iniciam a transformação do material orgânico complexo em ácidos orgânicos e outros produtos intermediários.

Deublein e Steinhauser (2008) apresentam como composição do biogás uma mistura gasosa composta por:

  • 55 a 70% de Metano (CH4);
  • 30 a 45% de Dióxido de Carbono (CO2);

Outros gases em pequenas quantidades

  • Ácido Sulfídrico (H2S);
  • Monóxido de Carbono (CO);
  • Amônia (NH3);
  • Hidrogênio (H2);
  • Nitrogênio (N2);
  • Oxigênio (O2);

Tendo como base sua composição, os projetos de recuperação do biogás têm como finalidade o aproveitamento de sua energia, visto que seu poder calorífico se encontra entre 5000 e 7000 Kcal/m³ (aproximadamente 21000 a 29000 kJ/kg). (Oliver et al., 2008)
Desta forma, é possível comparar o poder calorífico do biogás com outros combustíveis:

Ciclos Termodinâmicos de geração:

Genericamente, a termodinâmica é a ciência que descreve as transformações de energia térmica em suas diferentes formas e interações. Deste modo, um ciclo termodinâmico se constitui de qualquer série de processos energéticos tais que, ao percurso de todos eles, o sistema regresse a seu estado inicial, ou seja, que a variação das grandezas termodinâmicas próprias do sistema seja nula.
Sendo assim, os ciclos termodinâmicos mais comumente aplicados em sistemas de geração termoelétrica são Brayton e Rankine, que podemter seus rendimentos norteados pelo princípio da máquina de Carnot.
Analisando-se esta condição, para demonstrar que não seria possível a construção de uma máquina térmica ideal, o engenheiro francês Nicolas Carnot (1796-1832) propôs uma máquina térmica teórica, operante em um ciclo ideal reversível entre dois reservatórios térmicos comportando-se como uma máquina de rendimento total, estabelecendo um ciclo de rendimento máximo. Deste modo, o princípio de Carnot afirma que a razão entre o trabalho realizado e o calor recebido por um sistema depende somente das temperaturas dos reservatórios. Esse princípio é universal sendo, portanto, independente da substância de que é composto o sistema.
Numa máquina de Carnot, a quantidade de calor que é fornecida pela fonte de aquecimento e a quantidade cedida à fonte de resfriamento são proporcionais às suas temperaturas absolutas.

Equação (1):

Assim, o rendimento de uma máquina de Carnot pode ser descrito como:

Equação (2):

Onde:
TF = temperatura absoluta da fonte de resfriamento
TQ = temperatura absoluta da fonte de aquecimento

Com isto conclui-se que (Carnot, 1824)

“Nenhuma máquina térmica que opere entre duas dadas fontes, às temperaturas TQ e TF, podem ter maior rendimento que uma máquina de Carnot operando entre estas mesmas fontes”, visto que para que haja 100% de rendimento, todo o calor vindo da fonte de aquecimento deverá ser transformado em trabalho.

Em física, a lei ou princípio da conservação de energia estabelece que a quantidade total de energia em um sistema isolado permanece constante.

Equação (3):

Devemos ressaltar que, na análise dos ciclos ideais, as variações de energia cinética e potencial de um ponto do ciclo a outro serão desprezados. Em geral, isso é uma hipótese razoável para ciclos reais, o que possibilita aplicar a lei da conservação de energia de modo que se obtenha uma equação geral para:

Equação (4):

O ciclo Brayton vem se tornando um método cada vez mais utilizado na geração de energia. Neste tipo de máquina, ilustrada na Figura 4, o ar atmosférico é continuamente succionado pelo compressor, onde é comprimido até altas pressões. O ar comprimido entra em uma câmara de combustão, onde é misturado ao combustível criando condições para que ocorra a combustão, que têm como resultado uma violenta expansão dos gases devido às altas temperaturas atingidas durante o processo. Os gases provenientes da combustão se expandem através da turbina, gerando trabalho no eixo e são descarregados na atmosfera. Parte do trabalho devolvido pela turbina é usada para acionar o compressor, sendo o restante utilizado para acionar geradores elétricos.

O ciclo Rankine utiliza-se do calor proveniente da queima de combustíveis para a geração de vapor numa caldeira. A energia térmica gerada é utilizada à geração de energia elétrica em um gerador acionado por uma turbina a vapor, conforme figura 5 que ilustra o ciclo Rankine convencional.

É útil considerar que o rendimento térmico do ciclo Rankine depende da temperatura média na qual o calor é fornecido e da temperatura média na qual o calor é rejeitado. Qualquer variação que aumente a temperatura média fornecida, ou que diminua a temperatura média na qual o calor é rejeitado, aumentará o rendimento do ciclo.
Ainda é possível conceber um ciclo combinado de geração, visando aumentar o potencial energético usando a mesma carga de combustível. Neste arranjo, o calor liberado pelo ciclo Brayton é usado parcial ou totalmente como entrada de calor para o ciclo Rankine, visto que os gases de exaustão da turbina a gás estão em uma temperatura que favorecem condições de emprego na geração de vapor que alimenta o ciclo Rankine, conforme ilustrado na Figura 6.

Deste modo, o fluxo de gás quente pode ser utilizado numa caldeira de recuperação de calor para geração de vapor. Portanto, o ciclo combinado possui uma eficiência térmica maior que a dos ciclos Brayton e Rankine separadamente. Este tipo de processo de cogeração é a melhor opção para as aplicações nas quais a demanda de eletricidade é superior à demanda de vapor.

Autores: Bruno Fernandes de Holanda; Alef Douglas de Carvalho; Alisson Santos Silva; e Thayna Blum Zattar Galati.

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