Manutenção de técnicas compensatórias de bioretenção para drenagem urbana em clima subtropical: aprendizados e soluções

Resumo

O uso de técnicas compensatórias para o controle do escoamento superficial vem sendo aplicado cada vez mais como uma solução integrada para a drenagem urbana, garantindo balanços hídricos próximos a períodos de pré urbanização e pouco arraste de poluentes para os rios urbanos. Quanto à bioretenção, já existe um amplo conhecimento sobre a detenção dos picos de escoamento superficial e a capacidade de retenção de diversos poluentes, sob diversos meios filtrantes, em escala laboratorial. No entanto, os estudos em campo e escalas de microdrenagem, que analisam a operação real desses dispositivos ainda são poucos, principalmente em condição de clima subtropical. Este trabalho apresenta a operação de uma célula de bioretenção aplicada em campo e escala de microdrenagem, na cidade de São Carlos – SP, Brasil. Diversas patologias foram diagnosticadas ao longo das observações nos eventos chuvosos, assim, nosso objetivo é apresentar o aprendizado adquirido pela sua operação, sugerindo mitigações e adaptações aos riscos. A quantificação do balanço hídrico do sistema indicou baixa capacidade de infiltração do solo, ocasionando inclusive erosão do solo. Foram feitas adaptações estruturais ao longo da célula, como injeção semi direta, de modo a se solucionar estes problemas. As manutenções apresentadas se mostraram adequadas para melhorar a eficiência de retenção hídrica da bioretenção, ajudando a reestabelecer o balanço hídrico de pré urbanização. As características das regiões de clima subtropical consideradas durante a etapa de manutenção devem ser incorporadas na etapa de dimensionamento e design, reduzindo os riscos posteriores, e acompanhadas durante toda a etapa de operação.

Introdução

A mudança do uso e ocupação do solo decorrente do aumento da urbanização acarreta normalmente em aumento de áreas impermeáveis, escoamento superficial e poluição difusa nos pavimentos. Assim, situações como contaminação de rios e cheias em centros urbanos decorrentes de eventos chuvosos, levando a perdas socioeconômicas, são cada vez mais frequentes. Os sistemas clássicos de drenagem urbana não possuem capacidade de tratar qualitativamente o escoamento superficial, nem mesmo retomar condições próximas do balanço hídrico de pré-urbanização. Dessa forma, o desenvolvimento de sistemas alternativos de drenagem urbana, mais sustentáveis e custo eficientes, vem crescendo tanto como pesquisas em escala laboratorial, como sua própria aplicação real em campo.

Estes sistemas alternativos de drenagem urbana apresentam diversas denominações, dentre elas Low Impact Developemt (LID), Best Management Practices (BMP), Water Sensitive Urban Design (WSUD), Sustainable Urban Drainage System (SUDS), variando conforme os autores (ROSA et al., submetido). Desde a década de noventa já se apontava a necessidade da manutenção para a boa operação e performance das técnicas ao longo do tempo. Lindsey et al. (1992) fizeram um estudo com diversos tipos de LID practices e verificaram que as condições de operação declinaram significativamente em apenas quatro anos, sendo que metade não estavam funcionando conforme dimensionamento e dois terços precisavam de manutenção. Também perceberam que as bacias de infiltração eram as técnicas que requeriam maior necessidade de manutenção, associadas tanto a vegetação, como presença de sedimentos e dejetos e problemas de estabilização levando a erosão. Nessa mesma década a EPA já havia elaborado um manual de utilização de diversos SUDS, incluindo bioretenção, elencando as manutenções necessárias e a importância da constante inspeção (EPA, 1999).

No entanto, é possível observar trabalhos recentes que ainda elencam os problemas causados pela falta de manutenção e frequência de inspeção, mostrando como essa atividade ainda fica negligenciada em muitos casos. Blecken et al. (2015) fizeram uma revisão extensa sobre LIDs com grande tempo de aplicação em campo, verificando quais eram os principais problemas encontrados e a manutenção necessária. Perceberam que depois da construção, grande parte dos dispositivos são esquecidos ou assume-se por parte dos gestores que estes irão trabalhar indefinidamente, acarretando na queda da eficiência de trabalho e falhas operacionais. Especificamente para a bioretenção, o problema mais comum observado foi a colmatação da superfície, devido principalmente a erosões internas causadas por fluxos concentrados ao longo da bacia de bioretenção. Brown e Hunt (2012) mostraram os efeitos da falta de manutenção na performance de sistemas de bioretenção, levando a overflows mesmo para eventos pequenos e reduções nas taxas de remoção de poluentes. Neste mesmo sentido, Flynn et al (2012) e Schlüter e Jefferies (2005) também avaliaram o efeito negativo da falta de manutenção na performance em diversos SUDS (filter drain, infiltration trench, bioretention) em operação a longo prazo, nos Estados Unidos e na Escócia, respectivamente. Estas falhas, que ocasionam perda de eficiência destes dispositivos, levam a uma perda da confiança do público nestas tecnologias alternativas, diminuindo o interesse em sua possível aplicação.

Outro estudo interessante quanto aos problemas encontrados na aplicação de sistemas de bioretenção foi desenvolvido por Denich e Bradford (2008). Este trabalho foi conduzido em laboratório e teve seu foco nos problemas encontrados para climas frios. Eles observaram como principais desafios os efeitos da neve, as cargas de sal e areia na performance do sistema, as possibilidades de trade-offs com quantidade e qualidade da água subterrânea, vida útil do sistema devido a colmatação do meio e os efeitos da baixa temperatura na manutenção dos processos biogeoquímicos.

Quanto à aplicação em campo das técnicas compensatórias em regiões de clima tropical, Lim e Lu (2016) fizeram uma avaliação de um projeto que instalou diferentes practices em Singapura. Neste estudo, salientam a importância do monitoramento a longo prazo, tanto para a avaliação constante da performance da técnica, mas também como forma de se elencar a necessidade de manutenção ao longo dos anos. Para as regiões de clima tropical e subtropical é importante lembrar a necessidade de se fazer atividades de manutenção que impeçam a proliferação de mosquitos, já que muitos deles transmitem doenças que são epidêmicas nestes locais. Barret (2003) já coloca em seu trabalho essa atividade como uma das principais.

A operação e eficiência de LID systems em conformidade com o proposto no dimensionamento perpassa pela realização frequente de manutenções, sendo essas desde rotineiras até principais, conforme proposto por Erickson et al. (2013). Cada sistema irá apresentar necessidade de manutenção diferenciadas, sendo que essas também variam de acordo com a região implantada (variações nas condições climáticas, uso e ocupação do solo e fatores socioeconômicos). Ainda existe pouca pesquisa focada em climas tropical e subtropical (O’HANLON, 2009) onde, além das condições climáticas, os fatores sócio econômicos são distintos das regiões temperadas. No mais, existe uma vasta extensão de estudos em escala de laboratório, mas quando os sistemas são aplicados em campo percebemos necessidades e problemas não identificados em laboratório e que podem alterar sua dinâmica de funcionamento e eficiência.

Autores: Marina Batalini de Macedo; César Ambrogi Ferreira do Lago; Altair Rosa; Eduardo Mario Mendiondo e Vladimir Caramori Borges de Souza.

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