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Resíduos Plásticos

Texto :  Nils Simon

Cientista político e gestor sênior de projetos de pesquisa na Adelphi Research.

                    Lili Fuhr

Dirige o depto. de Ecologia e Desenvolvimento Sustentável na Fundação Heinrich Böll.

Tradução : Sergio Blum

Em 2050, poderá haver, nos mares, mais plásticos do que peixes

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Se existirem geólogos daqui a milhões de anos, eles serão facilmente capazes de identificar o início do chamado antropoceno – a idade geológica durante a qual os seres humanos tornaram-se a influência predominante em nosso ambiente planetário. Onde quer que olharem, encontrarão claras evidências de seu início, na forma de resíduos de plásticos.

O plástico é um material crucial na economia mundial, encontrado em carros, telefones celulares, brinquedos, roupas, embalagens, equipamentos médicos e muito mais. Em todo o mundo, 322 milhões de toneladas métricas de plásticos foram produzidas em 2015. E o número continua crescendo; em 2050, poderá ser quatro vezes maior.

Os plásticos obstruem os sistemas de esgotos das cidades e intensificam o risco de inundações. Pedaços maiores podem encher-se com água da chuva, criando um terreno fértil para mosquitos que disseminam doenças. Até 13 milhões de toneladas de resíduos plásticos acabam desaguando nos oceanos a cada ano; em 2050, poderá haver, nos mares, mais plásticos do que peixes. Além disso, todo esse plástico representa uma grave ameaça à vida selvagem. Além de focas, pinguins e tartarugas mortos ou moribundos que tiveram o azar de ficarem enredados em aros ou redes de plástico, os biólogos estão encontrando, em baleias e pássaros mortos, estômagos recheados de detritos de plástico.

Os produtos plásticos podem também não ser tão proveitosos para os seres humanos. Embora os plásticos utilizados, por exemplo, para embalar nossos alimentos não sejam, de modo geral, tóxicos, a maioria dos plásticos incorporam produtos químicos: de amaciadores (que podem interferir com nosso sistema endócrino) a retardadores de propagação de fogo (que podem ser cancerígenos ou tóxicos, quando em concentrações mais elevadas). Esses produtos químicos podem chegar ao oceano e introduzir-se em sua cadeia alimentar – e terminar em nossos pratos.

Atacar o problema não será fácil; nenhum país ou empresa, por mais determinado que seja, pode fazê-lo sozinho. Muitos atores – entre eles os maiores produtores de plásticos e poluidores, iniciativas de desperdício zero, laboratórios de pesquisas e cooperativas de catadores de lixo – terão de enfrentar o problema de frente. O primeiro passo é criar um fórum de alto nível para desenvolver uma estratégia cooperativa para reduzir a poluição por plásticos. Essa estratégia precisa ir além da ação voluntária e de parcerias, para que nos concentremos no desenvolvimento de um acordo internacional com força de lei sustentado pelo compromisso de todos os governos para eliminar a poluição plástica.

As negociações poderão ser iniciadas na Assembleia das Nações Unidas para o Meio Ambiente, em Nairobi, em dezembro deste ano. Cientistas já apresentaram propostas concretas para um tratado sobre a poluição plástica. Um dos autores deste artigo propôs uma convenção modelada com base no acordo climático de Paris: um objetivo geral com força de lei combinado com planos de ação nacionais voluntários e medidas flexíveis para alcançá-los. Uma equipe de pesquisas da Universidade de Wollongong, na Austrália, inspirando-se no Protocolo de Montreal, o tratado que protege a camada de ozônio, sugeriu tetos e proibições à produção de novos plásticos.

Algumas pessoas poderão indagar se devemos embarcar em mais uma jornada pelo longo, tortuoso e penoso caminho das negociações mundiais de um tratado. Será que não podemos nos valer da engenharia? A resposta curta é : provavelmente não. Plásticos biodegradáveis, por exemplo, só fazem sentido caso se decomponham com rapidez suficiente para evitar danos à vida selvagem. Mesmo descobertas promissoras como bactérias ou mariposas capazes de dissolver ou digerir plásticos podem prover apenas ajuda auxiliar.

A única maneira verdadeiramente capaz de resolver o problema é reduzindo nossos resíduos plásticos. Tecnologias podem ser benéficas, proporcionando mais opções de substituição e de reciclagem; mas, como mostram muitas comunidades e cidades sem desperdício no mundo, isso não é necessário. Por exemplo, Capannori, uma cidade de 46,7 mil habitantes, próxima de Lucca, na Toscana, assumiu uma estratégia de zero resíduos em 2007. Uma década depois, reduziu seus resíduos em 40%. Agora que 82% dos resíduos urbanos são separados na origem, apenas 18% dos resíduos acabam em aterros sanitários.

Essas experiências precisam informar e orientar os planos de ação nacionais que farão parte do tratado sobre plásticos. O “pacote de economia circular” da Comissão Europeia pode fornecer outro exemplo digno de ser emulado. Embora ainda não tenha sido implementado, suas metas para resíduos poderão fazer com que a União Europeia reduza em 190 milhões de toneladas as emissões de CO2 por ano. Isso é o equivalente à emissão anual nos Países Baixos. Naturalmente, a transição para uma condição de zero resíduos exigirá algum investimento. Qualquer tratado internacional sobre o plástico deve, portanto, incluir um mecanismo de financiamento, e o princípio de “o poluidor paga” é o lugar certo para começar.

A indústria mundial de plásticos, com faturamento anual de cerca de US$ 750 bilhões, poderia certamente separar algumas centenas de milhões de dólares para ajudar a limpar a sujeira que criou. Não será fácil chegar a um tratado mundial sobre plásticos com força de lei e focado no futuro. Levará tempo e custará dinheiro, e inevitavelmente conterá brechas e terá deficiências. Certamente não solucionará, sozinho, o problema da poluição por plásticos. Mas é um pré-requisito para o sucesso. A poluição plástica é um problema definidor do antropoceno. Afinal, é um flagelo global inteiramente criado por nós – e também inteiramente ao alcance de nossa capacidade de solucionar problemas.

Copyright : Project Syndicate, 2017 ( www.project-syndicate.org )

Tradução : Sergio Blum

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