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Estudo constata presença de resíduos de remédios e cocaína na Baía de Santos/SP

A descoberta de substâncias derivadas de medicamentos e de cocaína na água da Baía de Santos pode ser um alerta para o descarte inadequado e o consumo exagerado de drogas lícitas e ilícitas pela população da Cidade e de São Vicente.

Também é um indício de que essas substâncias invisíveis não são eliminadas no tratamento do esgoto doméstico.

A coleta da água para estudo toxicológico foi feita em 2014, numa Quarta-feira de Cinzas, em cinco pontos próximos à dispersão do esgoto do Emissário Submarino (no Parque Roberto Mário Santini, no José Menino).

Os resultados foram publicados este ano, em artigo científico na revista americana Science of the Total Environment, no primeiro estudo científico que trata da presença de drogas em água do mar em um país do Hemisfério Sul.

O estudo foi realizado por uma equipe de pesquisadores liderada pelo ecotoxicologista Camilo Seabra. “A grande presença de moléculas de anti-inflamatórios, anti-hipertensivos, analgésicos e estimulantes no mar indica que as pessoas estão consumindo essas substâncias de maneira descontrolada, além de descartar inadequadamente os medicamentos”, afirma.

Intitulado Occurrence of pharmaceuticals and cocaine in a Brazilian coastal zone (Ocorrência de fármacos e cocaína em uma zona costeira brasileira), o artigo revela a descoberta de 32 substâncias farmacológicas no mar, além de cocaína e cafeína.

Foi quantificada a concentração de sete substâncias e, entre os fármacos mais presentes, estão os anti-inflamatórios e os anti-hipertensivos.

Seabra é professor da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp, campus Baixada Santista) e da Universidade Santa Cecília (Unisanta), e fez a pesquisa com docentes das duas instituições com auxílio financeiro do CNPq e da Fapesp, além da colaboração de pesquisadores da Unesp-São Vicente.

“O foco da nossa pesquisa era sobre fármacos. Mas, ao verificarmos também a presença de cocaína, as análises revelaram a existência da droga e do metabólito benzoilecgonina, que é a cocaína transformada pelo fígado”, conta Seabra.

Para ele, a concentração de benzoilecgonina nas águas próximas à dispersão do emissário é um indício de que a droga entra no sistema de esgoto via excreções humanas.

As coletas foram feitas a 4,5 quilômetros da praia – na superfície e no fundo da baía, a apenas oito metros de profundidade. “As pessoas têm uma falsa impressão de que o esgoto está sendo lançado em alto-mar, quando a nossa baía é muito rasa e pouco dinâmica”.

O estudo se concentrou na área marinha sob influência do efluente de esgoto das residências da parte insular de Santos e São Vicente. Os pesquisadores escolheram estudar essa região por se tratar do ponto mais próximo da praia e pela menor probabilidade de retorno das águas residuais.

Seabra destaca ser um grande desafio regular consumo, descarte e monitoramento dos fármacos no ambiente. Hoje, diz, não há “avaliação do risco ambiental, como na Europa. Aqui há poucos dados sobre a toxicologia ambiental antes de uma substância farmacológica ser inserida no mercado”.

Abuso

O médico toxicologista Anthony Wong lembra que, há cerca de cinco anos, o Escritório das Nações Unidas para Drogas e Crimes revelava que o consumo mundial de substâncias lícitas como barbitúricos, tranquilizantes, antidepressivos e estimulantes, superava o de drogas ilícitas – o que as colocava no patamar das chamadas drogas de abuso.

“A ritalina, por exemplo, aumentou quase 40 vezes nos últimos sete anos anos. Será que temos tantas pessoas assim com déficit de atenção?”, alerta o médico, que é diretor do Centro de Assistência Toxicológica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

O médico reforça a necessidade de eliminar essas substâncias tóxicas em terra, antes de lançar o esgoto ao oceano, que “se tornou o maior depósito de lixo do planeta, o que é extremamente perigoso (…) peixes e anfíbios estão mudando de sexo, e já não há, em algumas espécies, machos suficientes para a procriação”.

Riscos

Ao entrar no oceano sob a forma de efluente doméstico, esse tipo de poluição química afeta não somente a balneabilidade das praias, mas a qualidade ambiental. O pesquisador Camilo Seabra chama atenção para o termo bioacumulação, usado em seu estudo para se referir à capacidade de certas substâncias se fixarem nos organismos marinhos.

“Alguns fármacos têm alta capacidade de associação com lipídeos, e são os mais perigosos porque se fixam na gordura e na musculatura do animal. Há um estudo na Baía de São Francisco (EUA) que encontrou cocaína nos mariscos. Também trabalhamos com mariscos, porque eles se alimentam filtrando a água”, cita.

Segundo Seabra, isso dá uma ideia do ciclo de vida dessas substâncias. “Nosso estilo de vida é causador desse tipo de poluição que chamamos de emergente, porque não está prevista na nossa legislação ambiental e nem nos programas de monitoramento”.

Reduzir a poluição no mar passa por educação ambiental. Outra questão a resolver é a da legislação ambiental, que não enquadra essas substâncias.

O tratamento de esgoto também precisa melhorar em Santos. “Existem, basicamente, três etapas de tratamento, mas não chegamos a ter nem a primária completa na nossa Cidade. (…) Deve-se também combater a carga orgânica e química com tratamentos mais avançados a fim de eliminar diversos poluentes”.

Ação do Gaema

O artigo de Seabra foi anexado a uma ação civil pública do Grupo de Atuação Especial de Defesa do Meio Ambiente (Gaema) em Santos contra a Sabesp, como prova dos efeitos nocivos da falta de tratamento de esgoto primário na Cidade.

A promotora Nelisa Olivetti de França Neri de Almeida disse se basear em investigação empreendida pelo Gaema desde 2008, sobre o tratamento de esgoto na parte insular de Santos e São Vicente.

Segundo ela, a Estação de Pré-condicionamento de Esgoto do José Menino, ao lado do Orquidário, realiza somente o peneiramento e o gradeamento do esgoto doméstico.

Resposta

A Sabesp informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que aguarda as próximas manifestações do Tribunal de Justiça (TJ) do Estado sobre a ação civil pública do Gaema. Explicou que o uso de emissários submarinos após tratamento preliminar dos esgotos atende aos parâmetros exigidos pela legislação nacional vigente. Na nota, afirma que se trata “de uma alternativa tecnológica com eficiência reconhecida e utilizada internacionalmente em países como Estados Unidos, Espanha, China, Nova Zelândia e Portugal”.

Também explica que os estudos que viabilizaram a implantação do equipamento foram feitos para que não houvesse retorno dos efluentes à orla ou reflexos à balneabilidade das praias. Sobre os impactos do efluente na fauna marinha, a empresa menciona realizar constante monitoramento marinho na área do emissário, mas que a balneabilidade das praias também está relacionada com a poluição nas áreas urbanas, formada por resíduos como lixo jogado nas ruas, fezes de animais e lançamentos irregulares de esgoto que são levados pela chuva para o mar, para rios e córregos.

Fonte: A Tribuna

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