saneamento basico

Mercado de capitais como agente financiador do saneamento

A edição da Medida Provisória 868, de 27 de dezembro de 2018, tem movimentado o debate nacional sobre o desafio da universalização dos serviços públicos de fornecimento de água tratada e dos serviços públicos de coleta e tratamento do esgoto.

A modernização proposta pela MP ao marco regulatório do setor, deve ser entendida como resposta a uma das causas do atraso nacional neste assunto, não nos esquecendo da fragilidade e pouca participação do mercado de capitais local no financiamento dos investimentos em infraestrutura.

O Banco Mundial, no estudo: Financiamento Privado de Infraestruturas Públicas através de PPPs na América Latina e Caribe (ALC), revelou a razão da precariedade da infraestrutura dos países subdesenvolvidos, constatando que a maioria deles não conta com setores financeiros e mercados de capitais suficiente maduros para apoiar o financiamento de programas de concessões. Somente países de médio e grande porte e com um nível mínimo de desenvolvimento do mercado de capitais, são capazes de custear programas amplos de concessões em moeda local. Esta situação contrasta com a de outros países da ALC, menores e com setores financeiros e mercados de capitais capazes de financiar, no máximo, alguns poucos projetos emblemáticos de infraestrutura.

Com o atual quadro de arroxo fiscal, e a baixa performance dos investimentos públicos, o protagonismo do mercado de capitais na condição de agente financiador do saneamento se torna condição sem a qual não será possível elevar o nível civilizatório do país. Importante não perdermos de vista que o saneamento básico é direito humano fundamental, reconhecido pela Organização das Nações Unidas (ONU), e ainda negado a grande parte dos brasileiros e sua efetivação, depende de grandes fluxos de recursos financeiros.

Mercado brasileiro de valores mobiliários

O mercado brasileiro de valores mobiliários – o mercado de capitais – caminhou no sentido de minimizar as fragilidades apontadas pelo Banco Mundial e está pronto para dar sua contribuição à causa, pois, conta com : (i) a existência de um arcabouço regulatório e autorregulatório consistente; (ii)  um completo portfólio de produtos, tanto em renda fixa como em renda variável; (iii)  um conjunto de instrumentos de securitização (CRI, FIDC, FIP-IE e FII) que favorece o acesso ao mercado de capitais por empresas de capital fechado e (iv)  um conjunto de fundos estruturados que oferece soluções adequadas para os projetos de infraestrutura.

A teoria econômica clássica ensinou que os agentes econômicos/investidores reagem a estímulos, portanto, o aumento da oferta de recursos financeiros para infraestrutura foi incentivado por meio de isenção de tributos sobre os retornos obtidos com tais investimentos, as Leis 11.478/2007 e Lei 12.431/2011, e a recente Instrução CVM n. 606, de 25 de março de 2019, que regulamenta os fundos incentivados de infraestrutura, que funcionam como estímulos eficientes para o aumento da base de investidores.

O efeito positivo deste tipo ação estatal já está comprovado. Desde 2011, o setor de infraestrutura arrecadou R$ 229.687,6 bilhões de reais via mercado de capitais, deste total, o saneamento recebeu R$ 1.048,4 bilhões, contudo, temos muito a crescer, uma vez que o mercado nacional de valores mobiliários é da ordem de R$ 4 trilhões.

Normas Jurídicas

Ao lado das normas jurídicas estimulantes, a nova estratégia de atuação do Banco Nacional de Desenvolvimento (BNDES) corrobora o estímulo ao mercado de capitais como financiador da infraestrutura nacional. No final de 2018 o banco anunciou investimento por meio da BNDES Participações (BNDESPAR), de até R$ 5 bilhões em fundos de infraestrutura, com o objetivo de ampliar e diversificar as fontes de financiamento de longo prazo para os projetos prioritários: saneamento básico, transporte, logística, mobilidade urbana, energia e telecomunicações. O capital aportado servirá de proteção aos demais investidores, via subordinação, multiplicando assim o potencial de financiamento. Com este novo posicionamento, o BNDES vai atrair mais investidores para o mercado de capitais de longo prazo destinado a financiar projetos de infraestrutura.

Se por um lado saber que o Brasil ocupa a posição 123º. no ranking da Organização Mundial da Saúde (OMS) de saneamento, possuindo ainda 35 milhões de brasileiros sem acesso à água tratada e 100 milhões sem acesso a serviços de coleta de esgoto, causa enorme frustração, por  outro lado, as iniciativas da MP e da ICVM 606/2019, aliada a posição revelada pelo BNDES em seus editais de credenciamento de fundos de infraestrutura, devem ser recebidas como sinalização da priorização do tema na agenda nacional de desenvolvimento.

Vaney Iori_CFO Aviva Ambiental

Vaney Iori é graduado em direito, especialista em direito processo civil, direito civil e engenharia financeira. Atualmente CFO da Aviva Ambiental.

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