Jundiaí: a cidade paulista onde não falta água

Uma caminhada pelo Parque da Cidade, onde fica a represa que abastece Jundiaí, no interior paulista, faz parecer que a crise hídrica que castiga o Estado é uma realidade distante – e não um problema que há pelo menos um ano afeta a vida dos moradores da vizinha Campinas e da capital, distante apenas 57 quilômetros. Por lá, o nível do reservatório está repleto: 100% da capacidade. No entorno da represa, o cenário em nada lembra o chão rachado pela seca no Sistema Cantareira: a vegetação é abundante e pássaros e capivaras banham-se felizes. Nas rodas de conversa pelas ruas, a palavra racionamento não é tema. Tampouco a corrida por caixas d’água ou a inflação dos galões. O assunto que movimenta discussões é a programação da Festa da Uva, que se encerra neste final de semana. Embora a cidade seja hoje um oásis em São Paulo, o índice de chuvas também ficou menor por lá. Mas ações tomadas há pelo menos quarenta anos – e posteriormente ampliadas pelas demais administrações municipais – garantem hoje a tranquilidade da população.

Há 40 anos o cenário era bastante diferente, e Jundiaí sofria com a escassez de água. Com apenas uma fonte de abastecimento, o rio Jundiaí-Mirim, a população compensava o déficit com a construção de poços artesianos, sobretudo na periferia. Essa água, contudo, era contaminada por fossas construídas a poucos metros – o que contribuía para o alto índice de mortalidade infantil do município, 73 casos para 1.000 nascidos vivos. Em 1975, o então prefeito Ibis Cruz deu início a obras para buscar outras fontes de água. Naquele ano, a prefeitura assinou a outorga de retirada de água do rio Atibaia, mais caudaloso, e o ligou a uma represa de armazenamento. O sistema foi ampliado ao longo do tempo e hoje é um dos elementos que contribuem para Jundiaí ser um dos pouquíssimos municípios paulistas que não sofrem coma falta d’água.

Jundiaí possui ainda uma represa de armazenamento com capacidade para 8,3 bilhões de litros, o que garante abastecimento para a população de 398 mil habitantes por até dois meses, ainda que a falta de chuvas seque por completo os rios Jundiaí-Mirim e Atibaia. Campinas também depende do Atibaia, mas não conta com sistema de abastecimento semelhante: trata diretamente a água do rio – o que compromete o abastecimento durante a estiagem. Em fevereiro do ano passado, o governador paulista Geraldo Alckmin (PSDB) pediu autorização da Agência Nacional de Águas (ANA) para aumentar a captação de água do Sistema Cantareira para os rios da cidade, de modo a evitar o evitar o racionamento em Campinas.

Em 2014, pela primeira vez na história, o Departamento de Água e Esgoto de Jundiaí (DAE) teve de aumentar a vazão de água do rio Atibaia durante todo o ano. Por causa da estiagem, a vazão do rio Jundiaí-Mirim não passou de 150 litros por segundo. Na época da cheia, atinge mais de 1.500 litros por segundo – o suficiente para abastecer a cidade. Quando o nível do Jundiaí-Mirim baixa, o sistema de bombeamento capta água do Atibaia para manter a represa cheia. Em 2012, essa ajuda foi requisitada durante uma semana, em 2013, durante os meses de setembro e novembro.

Diante da grave situação do Sistema Cantareira, que abastece mais de 6 milhões de pessoas na Grande São Paulo, o governo do Estado também passou a buscar outras fontes hídricas para turbinar o reservatório, como a construção de uma adutora para interligar o reservatório do rio Jaguari, que nasce em Minas Gerais, com o manancial Atibainha, que deve ser completada somente em 2016. A obra foi anunciada em novembro do ano passado.

Com índice de chuvas menor que a média histórica, Jundiaí começou a se preparar para a seca em dezembro de 2013, quando a cidade recebeu a primeira previsão de estiagem drástica feita pelo Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí (Consórcio PCJ). Em ofício enviado em 18 de dezembro de 2013, o presidente do Consórcio PCJ, Francisco Carlos Castro Lahóz, pediu para as prefeituras que integram a bacia, da qual faz parte o Sistema Cantareira, conscientizarem a população sobre a falta d´água. Tiveram início, então, campanhas pela redução do consumo.

E o cuidado com o abastecimento não se reflete hoje apenas em seguraça hídrica para a população. A atenção ao tema se refletiu em melhora concreta dos índices afetados diretamente pelo saneamento básico. Com a ampliação do abastecimento de água tratada, e o uso cada vez menor da água dos poços, o ex-prefeito Ibis da Cruz lembra que o índice de mortalidade infantil caiu para 23 a cada 1.000 nascidos vivos. “Naquela época, ninguém pensava em água, obra de abastecimento é subterrânea, ninguém vê. Eu também tive que aumentar o Imposto Territorial e Urbano (IPTU) para custear parte das obras, quase me mataram”, lembra.

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