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Lixo na praia e poluição de rios e mares: os desafios de Florianópolis/SC para a temporada

Sujeira na faixa litorânea gera impactos irreversíveis, afinal de contas, a Capital catarinense depende do turismo e da atividade pesqueira, ambas diretamente impactadas pela poluição

Nos 174 quilômetros de litoral na Ilha de Santa Catarina, uma triste realidade demonstra o descaso com a natureza. Por mês, mais de 16 mil toneladas de lixo são recolhidas na cidade, quantidade que chega a 24 mil toneladas durante a temporada de verão. Não bastasse a sujeira nas ruas e nas areias das praias, o obsceno índice de 53,3% pontos impróprios para banho registrado no auge do verão passado alerta para a poluição dos rios e do mar.

O último relatório de balneabilidade em Florianópolis, divulgado pelo Instituto do Meio Ambiente (antiga Fatma) no dia 4 de outubro, aponta que 18,6% dos pontos de banho atualmente estão impróprios por conta da quantidade de coliformes fecais. Infelizmente, a tendência é de que este índice suba significativamente durante o verão, quando a população da Ilha mais que dobra, assim como há aumento na quantidade de chuva que carrega toda a sujeira urbana diretamente para os rios e mares.

Toda essa poluição na faixa litorânea gera impactos irreversíveis, sejam eles ambientais, econômicos, sociais ou culturais. Afinal de contas, a Capital catarinense depende da cadeia produtiva do turismo e também da atividade pesqueira, ambas diretamente impactadas pela poluição.

— Com relação à pesca, o impacto gerado pelo lixo pode resultar em diminuição na quantidade de organismos das espécies de interesse comercial. Além disso, a alta ocorrência de lixo nas praias pode diminuir o número de frequentadores, causando prejuízo ao turismo, já que seriam afetados desde a indústria hoteleira até o vendedor ambulante. Afinal de contas, quem quer frequentar uma praia suja? — comenta Juliana Leonel, de 36 anos, doutora em oceanografia química pela USP, coordenadora do curso de Oceanografia da UFSC e responsável pelo projeto UFSC Sem Plásticos.

Rios poluídos desaguam no mar

rios-mares

Um dos principais fatores de preocupação com relação à poluição dos mares de Florianópolis é com a contaminação de rios por despejo de esgoto e água da chuva carregada de sujeira urbana. A situação é evidente em, pelo menos, quatro pontos tradicionais: Rio Capivari, que deságua na Praia dos Ingleses, Rio Sangradouro, que chega até a Praia do Matadeiro, Riozinho, no Campeche, e Rio do Braz, em Canasvieiras.

Nos Ingleses, uma das praias mais movimentadas da Capital durante o verão, é evidente a poluição do Rio Capivari. Inclusive, aquele ponto da orla é considerado impróprio para banho atualmente. Quem caminha pela areia e sabe da situação evita entrar em contato com a água, mas os desavisados acabam passando por ali e colocando em risco a saúde.

— Ficamos aqui na praia e minha filha teve irritação na pele. Não sei se foi da areia ou da água, mas o fato é que não vimos nenhuma placa dizendo que era impróprio para banho — comenta o bancário Alex Lopes, de 42 anos, que veio de Gravataí (RS) passar as férias com a esposa Mirela e os filhos gêmeos Lorenzo e Alice, de nove meses de idade.

Obra de aterramento

Em Canasvieiras, uma obra de aterramento da foz do Rio do Braz estancou provisoriamente o problema. Ainda assim, as tradicionais fortes chuvas de verão ameaçam a estabilidade do aterro e o mar poderá ser, novamente, inundado de água de esgoto.

— Estão camuflando a situação, empurrando o problema com a barriga — avalia a uruguaia Sandra Camaño, de 53 anos, moradora de Canasvieiras há 18 anos.

Do outro lado da cidade, no Sul da Ilha, a situação não é muito distinta. O cheiro forte e a cor escura da água mostram que o despejo de esgoto é evidente no Riozinho, no Campeche, e no Rio Sangradouro, no Matadeiro.

Não tem a vigilância para ver quem está com a ligação (de esgoto) irregular? — questiona Maria Aparecida Borinelli, de 64 anos, moradora do Matadeiro há mais de 40 anos.

— Seria um problema fácil de resolver com uma estação de tratamento de esgoto, mas a gente vê um descaso geral — afirma o corretor de imóveis Tiago Schleiniger, de 38 anos, morador do Campeche.

Apoio da população

A Casan, responsável pelo saneamento básico em Florianópolis, afirma que a cidade tem atualmente uma cobertura de coleta e tratamento de esgotos de 62,7% e que chegará entre 72% e 74% em dois anos. Quanto à poluição de rios e mares, a empresa reafirma que o problema é causado, principalmente, pelas chuvas que carregam sujeira às redes de drenagem e pelo descarte clandestino de esgoto no ambiente e as ligações irregulares na rede pluvial.

Nesse embalo, a prefeitura de Florianópolis afirma que este é um problema complexo e que precisa do apoio da população, tendo em vista que são quase 300 mil matrículas imobiliárias em todo o município. De acordo com o superintendente de Habitação e Saneamento, Lucas Arruda, o programa “Se Liga Na Rede” tenta criar possibilidades para que os moradores façam as correções necessárias em suas residências.

— O foco não é multar. As pessoas não querem ver os vizinhos punidos, querem ver a praia limpa. Temos que selar uma parceria entre prefeitura e população, porque é um problema de todos. Estamos focando na expansão da rede de esgoto e organizando um processo de fiscalização intenso para os próximo meses. Se a sociedade não abraçar a causa, não tem gestor que resolve o problema — afirma Arruda.

Com relação aos quatro rios que tradicionalmente apontam problemas, a Casan afirma, em nota, que “no caso de Canasvieiras, realizou em 2016 uma série de ações com o intuito de recuperar ambientalmente uma área que estava contaminada. No caso dos Ingleses, está realizando uma obra de esgotamento sanitário que poderá mitigar alguns desses problemas quando ela ficar concluída, para o Verão 2019/2020”.

“Da mesma forma no Sul da Ilha, onde a Casan tenta há 10 anos — e somente em 2017 obteve a licença ambiental — construir uma estação de tratamento de esgoto que poderá mitigar a poluição do rio, desde que os moradores façam a correta ligação à rede de esgoto”. Sobre o Rio Sangradouro, no Matadeiro, a empresa não se pronunciou.

Sujeira nas areias

Ao longo da temporada de verão, e até mesmo durante o ano, é comum ter que “limpar a área” antes de estender a canga na praia. Embalagens plásticas, bitucas de cigarro e garrafas vazias usualmente fazem parte do cenário nas principais praias de Florianópolis, especialmente naquelas onde há grande concentração de bares e restaurantes na orla, como é o caso da Barra da Lagoa.

— A areia é bem suja. A gente vê os garçons tentando recolher, mas não é suficiente — comenta a engenheira de aquicultura Ana Cristina Santos, de 24 anos. — A Comcap até recolhe o lixo, mas faltam lixeiras na praia e, principalmente, conscientização do pessoal. Isso é uma coisa que tem que começar na escola — completa.

Muito do que fica na areia da praia vem dos restaurantes, mas não é que todo mundo jogue o lixo deliberadamente no chão. Às vezes, o vento leva um guardanapo ou embalagem plástica para longe. Por isso, há quem defenda uma redução e uma substituição dos materiais utilizados, principalmente dos plásticos.

Reciclagem

Problemas complexos requerem soluções complexas. Temos que atacar elemento por elemento. O canudo plástico, por exemplo, foi parar lá porque a gente usa e algumas pessoas dispõem de forma inadequada. Eu sou particularmente favorável à eliminação dos canudos plásticos, mas nada se resolve da noite para o dia. Tem que se garantir uma transição para aquelas pessoas que dependem do comércio, até porque não adianta trocar o canudo por um copo de plastico — afirma Lucas Arruda.

Parte dos donos de bares e restaurantes nas orlas de praia reconhecem o problema e tentam minimiza-los como podem. É assim com Alécio Viera, de 55 anos, proprietário de um bar que leva seu nome, na praia do Matadeiro.

— A gente leva o lixo que produz para a reciclagem, mas o pessoal tem que fazer a sua parte também. A gente coloca bituqueira nas mesas, mas no final do dia a areia está cheia de bituca. O pessoal traz garrafa plástica ou de vidro cheia e depois que bebe deixa a garrafa vazia na praia. Sobra tudo para a gente pegar, até porque não vamos deixar a praia suja — lamenta Alécio.

Microplástico, um poluente “invisível”

Se a limpeza das praias feita pela Comcap, pelos donos de bares e restaurantes ou até mesmo por mutirões da comunidade recolhe garrafas e sacos plásticos, há outro fator quase invisível que preocupa ambientalistas: o microplástico. Por definição, os microplásticos são pequenas partículas degradadas que acabam se misturando à água e à areia.

— Como ele não é facilmente visto, é mais difícil de sentirmos o problema, tomarmos medidas preventivas e cobrarmos políticas públicas para a sua diminuição — comenta a oceanóloga Juliana Leonel.

 

microplasticos

A coordenadora do curso de Oceanografia da UFSC afirma que os microplásticos “podem causar danos físicos, fisiológico e bioquímicos, servem como vetores de distribuição de outros contaminantes e interferem no ciclo da matéria orgânica”.

— Somos todos responsáveis, inclusive porque nossas escolhas cotidianas de consumo e estilo de vida podem agravar esse problema. Podemos começar reduzindo o uso de descartáveis e substituindo materiais, mas também podemos participar da construção das políticas públicas e, consequentemente, das leis que regulam o descarte, produção, venda e uso de plásticos — afirma Juliana.

A Comcap, responsável pela limpeza urbana e das orlas de praia, está ciente do problema, mas aponta para a dificuldade de minimizá-lo caso a sociedade não encampe essa briga.

— Hoje, o que feito nas praias é a varreção, mas não tem como ficar 100%. Essa á uma responsabilidade do usuário. É fácil reclamar, mas a partir do momento que você joga uma bituca na areia da praia, você é responsável por isso. A população tem que tomar consciência de que é muito mais responsável do que a própria Comcap — afirma a diretora de operações Nilda Oliveira.

Operação verão

Nesta terça-feira, 9, a prefeitura de Florianópolis e a Comcap devem se reunir para divulgar o planejamento dos trabalhos de limpeza e conservação ambiental durante o verão. Em entrevista à Hora de Santa Catarina, a diretora de operações da Comcap, Nilda Oliveira, adiantou o número de contratações temporárias e o aumento do investimento entre dezembro e março.

— Serão investidos R$ 3 milhões para a contratação de 40 trabalhadores temporários para a limpeza da orla, além de 69 garis e 15 motoristas que vão reforçar a equipe de 175 trabalhadores efetivos.

Para auxiliar o serviço, a Comcap afirma que também serão adquiridos novos equipamentos, como quadriciclos, caminhões e caixas estacionárias. Além disso, a autarquia estuda uma parceria com comerciantes.

— Estamos entrando em contato com alguns comerciantes para ver se conseguimos a adoção dos Pontos de Entrega Voluntária (PEVs) para o descarte de vidros. Vamos oferecer um número maior de funcionários, mas eles também precisam dar a resposta auxiliando a dar o destino adequado para os resíduos. É essa parceria que procuramos hoje — comenta Nilda.

Os números da limpeza urbana em Florianópolis*

Quantidade de lixo recolhido
Julho de 2017: 15.805 toneladas
Janeiro de 2018: 24.192 toneladas

Pico de geração de lixo na última temporada
2 de janeiro de 2018: 1.325 toneladas

Custo operacional
Julho de 2016: R$ 7,7 milhões
Janeiro de 2017: R$ 9,4 milhões

*Dados da Comcap.

Fonte: Hora de Santa Catarina

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