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Todos de olho nos movimentos da Saneago

Tentativa de renovação de contrato entre Goiânia e Saneago alerta movimentos sociais

Um dos temas que mais tem provocado os órgãos e poderes públicos municipais diz respeito ao que ocorrerá com os serviços da Saneago daqui para frente em Goiânia.

O assunto tomou corpo nos últimos meses após vereadores como Djalma Araújo (Rede) e Elias Vaz (PSB) denunciarem um suposto esquema que pretende “privatizar” a empresa pública – agora ou mesmo em um futuro não muito distante.

Erguida no Governo de Otávio Lage após iniciativa anterior do ex-governador José Feliciano, que criou o Departamento Estadual de Saneamento, em 1960, a empresa teve início com uma grande quantia de dinheiro público – 20 milhões de cruzeiros. A Saneago é hoje, portanto, a empresa goiana mais viável economicamente. Conforme os críticos desta hipótese, repassá-la para a iniciativa privada soaria um pecado contra o povo e, para muitos, uma manobra ilícita.

A denúncia é de que depois de acertado o polpudo contrato com a Prefeitura de Goiânia, ela, enfim, seria repassada para algum grande grupo econômico, aos moldes do que já vem acontecendo com outras empresas de Goiás.

A Saneago nega de forma veemente todas as acusações. A empresa diz que jamais o Governo de Goiás sugeriu que a Saneago seria privatizada e que inexiste interesse em deixar de explorar estes serviços. Durante audiência pública realizada no dia 4, representantes da empresa e engenheiros técnicos de saneamento reafirmaram que a Saneago presta serviços de qualidade e já atende 88% dos moradores da capital em serviços de esgoto ou saneamento.

Juliana Mattos, superintendente de expansão e concessão da Saneago, diz que “o modelo de gestão associado não permite privatização”. Juliana diz que a proposta de lei insere Goiânia no novo modelo de gestão de saneamento básico, possibilitando total autonomia ao titular: “Através do plano municipal de saneamento básico o município poderá definir e organizar a evolução destes serviços conforme suas necessidades e prioridades”.

Detentora do quarto valor mais caro da tarifa média de água praticada no Brasil, a empresa de saneamento goiana, todavia, não é mais um paraíso de gestão: enfrenta dificuldades de atender o crescimento das cidades e procedimentos investigativos que levantam inúmeras suspeitas revelam contradições em seu posicionamento.

Agora mesmo, por exemplo, o Tribunal de Contas do Estado (TCE) considerou ilegal a contratação de uma empresa (Navarrete Engenharia S/A) para realizar serviços da estatal goiana.

O contrato sem licitação é a forma mais comum para se retirar dinheiro das estatais e muitas vezes lesá-la em seu patrimônio, repassando recursos do povo para a iniciativa privada.

Os que se mostram contrários aos atos praticados dentro da empresa goiana apontam a crise da Celg e também a tentativa de privatização da Metrobus como prenúncio do que virá para a empresa de saneamento: a empresa goiana com número de consumidores certo e determinado conseguiu se transformar na pior prestadora de serviços de energia do país a ponto dos atuais governantes de Goiás desejar vendê-la.

A mesma estratégia estaria em curso com a Saneago? Ao lado da gigante Celg, pelo histórico, a Saneago é a maior e mais lucrativa iniciativa de exploração econômica do Estado. É considerada patrimônio coletivo, por exatamente ter em sua fundação dinheiro público e a arrecadação de anos e anos de cobrança da população.

Djalma Araújo diz que é preciso considerar todas as hipóteses, inclusive, sim, a privatização, pois existem muitas coincidências. “Quem diria que alguém cogitaria privatizar a Celg um dia?”, compara.

Ao lado do sindicalista Washington Fraga, o vereador foi até o prefeito de Goiânia, Paulo Garcia, mostrar a preocupação com que o tema tem sido exposto.

A primeira grande dúvida é o motivo que leva tanto a Prefeitura de Goiânia quanto a Saneago adiantarem para agora a renovação da concessão da exploração dos serviços de saneamento. “É uma pergunta que ainda não tivemos respostas. E o artigo 3º do Projeto de Lei da Prefeitura de Goiânia dá margem para a privatização”, diz Djalma Araújo.

A Constituição Federal nem a Lei Federal de Saneamento Básico impedem que ocorra delegações dos serviços, como diz o artigo 8º da Lei 11.445/07. O problema é que o modismo de repassar cada vez mais partes do estado para a iniciativa privada tem provocado grande discussão no país, em referência ao esgotamento das funções estatais e à venda do que é público – portanto, de todos.

“Se começamos a terceirizar educação, saúde, saneamento, estradas, afinal, quem nos governará? A iniciativa privada? É preciso não confundir as bases do público com o privado. Estão adotando no Brasil, e em específico em Goiás, atitudes que deixarão uma dívida muito grande para as futuras gerações. O serviço público não pode seguir leis de mercado”, diz o sociólogo Fernando Castro Filho, da Universidade Federal de Goiás (UFG).

O prefeito Paulo Garcia discorda dos argumentos levantados e diz que o Governo de Goiás não tem interesse de repassar os serviços da Saneago para a iniciativa privada: “Nunca foi nossa intenção privatizar a Saneago. Quem afirma isso, fala por puro oportunismo”.

Sem avançar

A discussão do projeto de lei revela que a questão do saneamento em Goiás não avançou nas últimas décadas e demonstra que qualquer novo contrato terá que se adequar às legislações modernas, como a Constituição Federal, que introduziu no ordenamento brasileiro o controle social.

Em outras palavras, as organizações civis e institucionais da sociedade não querem mais as cláusulas do passado. Uma das discussões diz respeito exatamente ao nível de organização do sistema de saneamento. Se para Goiânia existe desorganização, nos demais municípios o que se tem é uma verdadeira confusão de atribuições.

O primeiro problema – denunciam sindicalistas como Washington Fraga – é a falta de um Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB) na capital e demais municípios. A Lei 11.445/07 prevê que a ausência impede o repasse federal de recursos para que as cidades invistam na área.

O fato por si só já é uma aberração. Goiânia e Goiás tentam firmar um novo contrato sem que exista sequer um PMSB em debate, acusam os que se apresentam contrários à renovação repentina e antecipada.

Para se ter ideia dos desafios do saneamento básico, Goiânia – a cidade goiana com melhor atenção por parte do poder público – não está sequer na lista das 20 maiores cidades do Brasil em qualidade de saneamento, conforme ranking da Trata Brasil.

Comissão pode investigar contratos

Djalma Araújo, relator do projeto de lei: proposta polêmica não pode ser apreciada antes da instalação de uma Comissão Especial de Inquérito

O vereador Denício Trindade solicitou há oito meses a abertura de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) para apurar os motivos dessa antecipação de renovação de contratos proposta pela Saneago.

Djalma Araújo, relator do projeto, afirma que o uso de uma comissão daria maiores possibilidades para entender o que se passa entre Prefeitura de Goiânia e Estado de Goiás. “O projeto de lei é polêmico e não pode ser apreciado antes da instalação de uma Comissão Especial de Inquérito (CEI) na Câmara”.

O Sindicato de Trabalhadores nas Indústrias Urbanas de Goiás (Stiueg) já apresentou sugestões de alteração da proposta de lei. Washington Fraga, o presidente, afirma que é preciso adequar a gestão para um modelo compartilhado, como ordena toda a legislação atual de saneamento: “Sugerimos mudanças na redação do artigo 3º do projeto, ampliação da tarifa social para 10m³, além da proposta de gestão compartilhada. Também cobramos agilidade na elaboração do Plano Municipal de Saneamento Básico para que ocorra a universalização dos serviços na capital. Entregaremos todas as alterações esta semana para o relator Djalma Araújo”.

Tanto Djalma quanto os demais vereadores estão preocupados com a inserção da Prefeitura de Goiânia na administração e gestão compartilhadas do saneamento, não deixando mais que o Governo de Goiás faça o que bem entender com a tarifa e serviços, como possíveis subconcessões.

Municípios optam em ter a própria empresa de saneamento

A Saneago não é determinante para os municípios. Que o diga Senador Canedo, que optou em tomar rumo diferente e criar a Agência de Saneamento de Senador Canedo (Sanesc). Atualmente a Sanesc fornece água para mais de 90% do município de Senador Canedo.

Senador Canedo tem problemas de oferta de água, assim como qualquer cidade abastecida pela Saneago, mas mostrou que um município de médio porte consegue optar em não renovar acordo com a estatal do Estado de Goiás e seguir adiante.

Mineiros é outro município que ignora os serviços da Saneago e consegue ele próprio ofertar, nos limites do possível, água e esgoto para os moradores. A Serviço Autônomo de Água e Esgoto (S.A.A.E) é a empresa responsável, por exemplo, anunciar a inauguração da Nova Estação de Tratamento de Água de Mineiros sem a necessidade de contar com a atuação de outras empresas.

Com 78 funcionários, a autarquia municipal, com personalidade jurídica de direito público, oferta os serviços sem temer a privatização da Saneago ou qualquer ação em torno da estatal goiana.
DEBATE ANTIGO

Há quatro anos, a própria Saneago introduziu a prática de repassar a exploração dos serviços que deveria fazer para outras entidades. O Ministério Público acusa terceirização dos serviços de esgotamento sanitário dos municípios de Aparecida de Goiânia, Anápolis, Jataí, Rio Verde e Trindade.

O uso da subconcessão dos serviços por meio de licitação é um dos temores dos agentes públicos e políticos que questionam as mudanças propostas em Goiânia. O promotor Érico de Pina, por exemplo, apontou sérios riscos para o poder público se insistir neste “modelo privatista já em curso”.

A Odebrecht – cujo presidente está preso e envolvido na operação Lava Jato – é subdelegatária da Saneago para a operação e manutenção dos serviços de esgotamento sanitário em Goiás.

Fonte: DM
Foto: Divulgação/Saneago

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