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Projeto de lei para licitações revigora contratação integrada

Em maio, fracassou no Senado a tentativa de estender o Regime Diferenciado de Contratação às licitações públicas em geral. A iniciativa, promovida entre outros pela senadora Gleisi Hoffmann, ex-titular da Casa Civil do governo Dilma, pegava carona na MP 630, que permitia o uso da modalidade na construção de presídios do Maranhão, mas foi felizmente barrada. Na época, críticos do RDC argumentaram que a MP atropelava um projeto de lei presente no Senado, o PL 559, que modernizaria toda a legislação das concorrências públicas, desde a lei 8666, de 1993. O PL 559 começou a tramitar nas Comissões, e lá está o RDC, integralmente ressuscitado e em boa forma.

A contratação integrada, típica do RDC, inverte a lógica usual das licitações, nas qual o governo submete em geral um projeto básico à concorrência, onde diz que obra quer e até quanto está disposto a pagar. Como os projetos básicos tem sido muito criticados pela qualidade técnica, e todo o processo licitatório é muito lento, os mentores do RDC resolveram atacar os dois problemas de uma vez. A definição da contratação integrada no PL é diz tudo: “o contratado fica responsável pela elaboração e desenvolvimento dos projetos completo e executivo, pela execução de obras e serviços de engenharia….e por todas as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto, com remuneração por preço global”.

O regime nortearia as licitações das obras públicas mais caras, de infraestrutura, definidas como “de grande vulto ou majoritariamente dependentes de tecnologia nitidamente sofisticada e de domínio restrito”, acima de R$ 100 milhões.

As críticas à extensão desse regime são conhecidas. Pelo novo esquema, o administrador público não saberá o que está comprando, pois o projeto executivo é o que rege a questão e define a obra, mas ele será feito também pelo executante da obra. O governo terá depois de gerir essas obras por décadas, diferentemente das concessões, amargando prejuízos caso elas não sejam perfeitamente executadas. O anteprojeto, que substitui o projeto básico no RDC, muda de nome mas não de competência. Se o governo possui projetos básicos muito ruins, o que faria imaginar que os anteprojetos fossem diferentes?

Aplicado ao PAC e às obras da Copa, o RDC não foi a panaceia contra atrasos, superfaturamentos, desperdício de recursos etc. e muito menos, como alguns otimistas chegaram a dizer para defender sua generalização, trouxe substancial economia de gastos para o governo.

Como o PL 559 inclui as principais leis anteriores que regram as concorrências públicas, há muito mais motivos para polêmica além do RDC. O projeto se intromete demais e define normas para atuação do Tribunal de Contas da União, e, em alguns casos, acaba por limitar seus poderes. Uma licitação comunicada aos órgãos de controle com 90 dias de antecedência, por exemplo, “não poderão ter licitações suspensas por inconformidades do edital”.

Com a obra em andamento, o TCU terá não apenas que apontar as irregularidades para suspendê-las. Sua objeção “deverá ser acompanhada de análise de impacto em que tenham sido ponderadas alternativas consideradas viáveis, com avaliação do custo benefício de cada uma, de modo a indicar que a paralisação é a que melhor atende ao interesse público”. Além de exorbitar de sua função e legislar em área alheia, o projeto, ao permitir o uso extensivo da contratação integrada, subtrai informações importantes dos próprios órgãos de controle e ao governo, que compra algo semelhante a “caixas pretas”. A própria fiscalização se torna mais difícil nesse regime.

O artigo 23 permite que não se divulgue previamente a estimativa de preços para as obras e serviços objetos da licitação, o que é uma faca de dois gumes. Tem a virtude de poder trazer alguma redução de custos e o defeito de ser permeável à indiscrição de algum membro do restrito clube das comissões de licitação.

Além disso, é estranha a forma encontrada para barrar empresas que ofereçam grandes descontos de preços e depois não consigam entregar o serviço. O projeto estipula que são “manifestamente inexequíveis” em licitação para obras e serviços de engenharia, “propostas cujos valores sejam inferiores a 80% do valor orçado pela administração”. Se a oferta for inferior a 90% desse valor, os responsáveis terão de depositar em dez dias a diferença em relação ao preço orçado. O projeto simplesmente limita o deságio.

Fonte: Valor Econômico, Opinião, 07/08/14

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