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Alternativa para tratar esgoto usa bananeiras

Sistema atende 200 famílias; técnica foi ensinada aos moradores

Para quem vive o dia a dia de ocupações urbanas, vilas e favelas, as demandas são quase sempre emergenciais. Faltam ligações de água e luz, calçamento de vias e equipamentos públicos básicos comuns em qualquer cidade. Para diminuir esses problemas na ocupação Eliana Silva, na região do Barreiro, o grupo Praxis não só implantou como também ensinou os moradores a cuidar de um mecanismo para o tratamento de esgoto, que tem como principal elemento as bananeiras.

Por meio da técnica de evapotranspiração, mais conhecida como TVAP – que consiste em usar plantas para absorver o material e fazer sua evaporação –, é possível dar um destino para os dejetos produzidos nas residências. Segundo o morador da ocupação e integrante do Movimento de Luta por Bairros, Vilas e Favelas (MLB) Leonardo Péricles, 34, cerca de 200 famílias são beneficiadas pelo sistema na comunidade.

Para que o TVAP funcione, é preciso construir um tanque de cimento similar a uma fossa séptica. No local, são colocados pneus e tubulações, com origem nas casas, por onde passa o esgoto. Sobre a estrutura são plantadas bananeiras. Usando a técnica, os rejeitos produzidos pelos moradores caem na caixa. O material sólido é retido pelos pneus e decomposto por bactérias. Já o líquido é absorvido pela planta.

“Antes, usávamos um banheiro coletivo. Hoje, além de uma solução para que nosso esgoto não seja jogado no ambiente, ajudamos a preservá-lo”, explica Péricles. Ele aponta que existem muitas crianças na região e que o mecanismo evita o esgoto a céu aberto e a proliferação de doenças, melhorando a qualidade de vida daqueles que residem na ocupação. A ideia do grupo de arquitetos também foi ensinada aos moradores. “Já havia trabalhado em construções e tinha alguma noção. Quando eles vieram, acompanhei o trabalho e ajudei na instalação do TVAP. Agora, a teoria eu já sei, e, se for preciso, consigo reproduzir o mecanismo”, conta o aposentado Walter de Souza, 55, morador da Eliana Silva.

Necessidades. A coordenadora do grupo Praxis, Denise Morado, explica que não houve a necessidade de implantar o TVAP em todas as casas da ocupação. Ela diz que, na região mais baixa, foi feito um encanamento dos imóveis direto com o sistema da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa). “Em algum momento, as coisas são muito urgentes. Quando se mora em lona, é muito urgente. E foi essa a condição que encontramos lá”, lembra.

Para Péricles, sistemas como o TVAP facilitam a estruturação da comunidade pelo poder público. “Do jeito que estamos aqui, se quiserem instalar rede elétrica, asfalto ou mesmo o esgoto, já está quase pronto. Isso é uma forma de mostrar que isso aqui é viável”, afirma. Denise concorda: “A gente acredita na legitimação e acha que, em certo momento, ações de reintegração (de posse) não farão mais sentido”.

Por meio de nota, a Copasa informou que alguns imóveis da Eliana Silva estão conectados indevidamente às suas redes coletoras de esgoto. Segundo a companhia, isso pode causar prejuízos, uma vez que as redes não foram projetadas para receber os resíduos. No entanto, ela não disse se tomará alguma medida.

Falta política pública de assistência

O projeto da ocupação Eliana Silva é amparado pela Lei Federal 11.888/2002, que garante o acesso gratuito a assistência técnica para pessoas de baixa renda. De acordo com a lei, o poder público deve disponibilizar arquitetos ou engenheiros para assessorar construções de interesse social. No entanto, para a coordenadora do Praxis, Denise Morado, não há políticas públicas que garantam esse direito na capital.

A Companhia Urbanizadora de Belo Horizonte (Urbel) afirmou apenas que a lei é direcionada para o atendimento de famílias que estejam localizadas em áreas e zonas especiais de interesse social, que são regiões demarcadas no território de uma cidade para assentamentos habitacionais de população de baixa renda. Isso não incluiria a ocupação Eliana Silva.

Proposta. Na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) tramita um projeto de lei que tenta regulamentar a prática no Estado. A proposta prevê que o atendimento deverá ser estabelecido pelos Conselhos Municipais de Habitação, e o Estado será responsável em firmar convênios. Em julho do ano passado, o projeto foi vetado pela Comissão de Constituição e Justiça e se encontra parado. A assessoria de imprensa do governo do Estado informou que há interesse em regulamentar a lei, mas aguarda sua tramitação.

As bananeiras são sinônimo de saneamento básico

Além do chamado TVAP, ou tanques de evapotranspiração, as bananeiras também servem como um filtro para a água que vem das pias e dos chuveiros das casas da Eliana Silva. Esse material, que sem o devido tratamento de esgoto seria jogado ao ar livre, é limpo pelas plantas. As pias são ligadas a pequenas caixas de cimento, e os chuveiros, a outras maiores. De lá, uma tubulação leva a água até as árvores. Como é tudo líquido, as plantas absorvem a água e funcionam como um filtro natural. Nesse caso, o líquido não passa pelo sistema de TVAP. Essa foi uma das técnicas repassadas pelo grupo Praxis aos moradores da ocupação.

Conhecimento faz moradores solucionarem problemas
Durante a instalação dos TVAPs, os moradores da Eliana Silva foram envolvidos em todo o processo. Com o conhecimento adquirido, eles, atualmente, inspecionam o funcionamento do mecanismo. O auxiliar de serviços gerais Salviano Nascimento Neto, 30, é quem coordena os equipamentos de sua rua. Durante a entrevista com a reportagem, ele identificou um vazamento em um dos canos que vai ao TVAP e logo começou a planejar como faria o conserto. Ele conta que adora a tecnologia usada e que isso deixa as árvores até mais bonitas. “Funciona muito bem. E, no fim, até as frutas podemos utilizar. Como até as bananas daqui”, comemora.

Fonte: O Tempo
Foto: Divulgação

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