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Governo do Rio cogita privatizar Cedae para reforçar o caixa

RIO – A Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae) vem sendo vista como uma possível fonte de receita por integrantes do governo: com o agravamento da crise, a privatização da empresa é cogitada como uma estratégia para encher o caixa fluminense, minguado pela queda substancial da arrecadação. Embora não haja unanimidade, pesos-pesados da cúpula do estado, diante das dificuldades financeiras à vista, garantem que a concessão da Cedae poderá sair do papel em 2017.

Segundo uma fonte governamental, o martelo ainda não foi batido, mas a possibilidade se torna cada vez mais factível diante da necessidade de sanear as finanças do estado. Quem é contra a medida alega que a companhia não recebe repasses do tesouro (logo, não dá despesa), tem baixo valor de mercado e dívidas, como um grande passivo trabalhista. A medida, no entanto, tem a simpatia do governador em exercício Francisco Dornelles, que costuma defender privatizações e parcerias público-privadas. No Legislativo, a proposta é defendida pelo deputado Jorge Picciani (PMDB), presidente da Alerj. Uma das principais vozes dissonantes é a do governador licenciado Luiz Fernando Pezão, mas há quem aposte que, com a ruína do caixa do estado, seria mais fácil convencê-lo.

A Cedae, empresa de economia mista, tem o Estado do Rio como seu principal acionista, com 99,9996% dos papéis. O restante, 0,0004%, é de acionistas minoritários (692 no total). No ano passado, a companhia teve um lucro líquido de R$ 248,8 milhões, 45,9% a menos que os R$ 460 milhões registrados em 2014.

Os executivos da empresa atribuem o mau resultado às crises hídrica e econômica que castigaram o Rio em 2015. “O panorama econômico do Brasil não é favorável, e devemos esperar que o quadro recessivo perdure em 2016”, diz o Relatório de Administração e Demonstração de Atividades Financeiras 2015, publicado no dia 22 de março no Diário Oficial do Estado. A receita operacional da empresa foi de R$ 4,475 bilhões no ano passado (1,4% a menos que os R$ 4,539 bilhões registrados em 2014). Em setembro do ano passado, a agência de avaliação de risco Standard and Poor’s rebaixou a empresa de A+ para A — a Cedae já chegou a ser AA.

No ano passado, a companhia contribuiu com R$ 60 milhões para o tesouro estadual, relativos ao exercício de 2014, conforme determina uma lei federal que dispõe sobre o pagamento de dividendos a acionistas. Foi a primeira vez em que a empresa fez tal depósito no cofre do governo, segundo a Secretaria de Fazenda. O restante do lucro, segundo executivos, foi reinvestido na empresa.

Em novembro de 2014, o estado começou a estudar um modelo de parceria público-privada (PPP) para obras de saneamento em São Gonçalo, Itaboraí, na Baixada Fluminense e no entorno da Bacia do Rio Guandu — que abastece 8,4 milhões de pessoas. À época, o presidente da Cedae, Jorge Briard, deu prazo de seis meses para que estudos relativos ao projeto ficassem prontos.

Atualmente, a Cedae faz, com a ajuda de empréstimos da Caixa Econômica Federal, obras do Novo Guandu e do Programa de Abastecimento de Água para a Baixada Fluminense, que pretendem universalizar o serviço de água na região. Orçado em R$ 3,4 bilhões, o projeto ainda não recebeu R$ 600 milhões, a parte restante do empréstimo da Caixa.

A conclusão das obras e a necessidade de garantir contrapartidas para os empréstimos são vistas como entraves que podem atrasar ou impedir a privatização da empresa. Em entrevista ao GLOBO no início do ano, Pezão explicou os motivos pelos quais não privatizaria a Cedae nem parte dos seus serviços na capital fluminense:

A Barra faz parte das garantias desses empréstimos que fiz para a Baixada Fluminense, para fazer o Guandu II e universalizar a água na Baixada. Agora não (vamos privatizar), porque a gente está com uma grande operação em curso. Estou liberando agora mais R$ 1,5 bilhão para fazer o Guandu 2, estamos com nove grandes obras na Cedae, e os recursos estão sendo liberados. Eu não posso fazer agora esse processo porque tenho R$ 3,5 bilhões para receber do governo federal.

“É IMPORTANTE QUE OS SERVIÇOS FUNCIONEM”

Especialistas se dividem sobre uma operação de privatização. Para Gilberto Braga, professor de finanças do Ibmec, o governo poderia embolsar uma quantia volumosa com a oferta pública da Cedae. Braga diz ainda que o estado poderia apostar em parcerias público-privadas, mas está “muito atrás” do município em relação a essa prática.

— A privatização seria um dinheiro extra para o estado, que tem um buraco de R$ 2 bilhões por mês para pagar a folha (de servidores). Há uma série de áreas que o estado poderia privatizar. Mas é importante que os serviços funcionem — defende.

Já para Mauro Osório, economista e professor da UFRJ, a dificuldade de privatizar é garantir a universalização de serviços:

— É preciso haver o tempo todo uma preocupação com a universalização. Não pode entregar água só para quem pode pagar. Para que um processo de privatização ocorra sem defeitos, ele não pode ser rápido. Então, para resolver o problema emergencial, (a privatização) não me parece o caminho mais adequado.

UM SERVIÇO QUE É ALVO DE CRÍTICAS

Divulgado no mês passado, um levantamento feito pela ONG Trata Brasil sobre serviços de saneamento nas cem maiores cidades brasileiras mostra que o Rio — onde a atividade cabe, principalmente, à Cedae — aparece na 50ª posição. Entre as capitais, está na 11ª. Dentro do próprio estado, a capital fica na quinta colocação, atrás de Niterói, Petrópolis, Campos e Volta Redonda, municípios onde o saneamento é feito por concessionárias privadas.

No estudo divulgado pela Trata Brasil em 2015, o Rio aparecia em 56º lugar. De lá para cá, apesar de algumas mudanças de metodologia no trabalho, especialistas dizem que houve pequenas melhoras. Hoje, 91,62% da população carioca tem acesso a água potável e 83,11% é atendida por rede de esgoto.

Os problemas de saneamento se refletem na poluição da Baía de Guanabara, que sediará provas de vela durante as Olimpíadas, em agosto.

Em fevereiro, desembargadores da 11ª Câmara Cível proibiram a Cedae de cobrar por serviços onde não há coleta, tratamento e destinação adequada de esgoto. A decisão foi referente a uma ação movida por um advogado, que questionou a cobrança da taxa de um imóvel em Magalhães Bastos, cujos resíduos eram descartados na rede de águas pluviais. A companhia recorreu, afirmando que a mesma câmara teria interpretado a questão de forma diferente ao julgar outras ações que reivindicavam a suspensão do pagamento.

Fonte: O Globo
Foto: Cedae

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