“Os grandes problemas com a gestão de resíduos resultam da urbanização”

“Há muito mais a fazer do que apenas recolher e transportar para as lixeiras.”

Quais são os dados mais recentes sobre a produção e recolha de lixo actual?

Não temos dados actualizados. A única coisa que podemos dizer é que dos levantamentos que foram realizados em termos de preparação do termo estratégico de gestão de resíduos, a média de produção de resíduos urbanos em Luanda era de 860 gramas por pessoa, por dia. Portanto, podem imaginar a enormidade do que isto é. O que nós temos neste momento, sem estudos aprofundados, já que esses são da competência de outras estruturas que não a Agência Nacional de Resíduos (ANR), é que existe um défice na recolha de resíduos. Vai entrar em funcionamento um novo modelo de gestão na cidade de Luanda, mas a verdade é que, de há um tempo para cá, tem se registado a acumulação de passivo (resíduos que não são recolhidos e que se amontoam em alguns pontos de concentração). Essa é uma situação que urge ser resolvida porque novos contratos com operadoras, que vão se responsabilizar pelos diferentes níveis de intervenção, serão colocados no novo modelo e vão exigir dessas operadoras que estejam em condições de realizar as operações de limpeza. Mas, se calhar, elas não vão querer assumir a responsabilidade daquilo que vão encontrar como passivo.

Quais as funções atribuídas à Agência Nacional de Resíduos?

frase 01 Sabino FerrazA ANR foi criada há cerca de um ano, a 27 de Julho. De facto, começou a trabalhar depois da nomeação do seu Conselho de Administração, que ocorreu em Setembro do ano passado e que tomou posse em Outubro. Portanto, desde então, a agência existe de facto. A agência é um instituto público com autonomia administrativa, financeira e patrimonial. É tutelada pelo Ministério do Ambiente enquanto departamento ministerial do Executivo que atende às questões ambientais. A agência insere-se num quadro de protecção ambiental e é uma entidade reguladora, com obrigações do ponto de vista do equilíbrio do sistema. Há vários agentes que intervêm nesse sistema que diz respeito à gestão de resíduos.

Gestão de resíduos é um conceito mais amplo do que limpeza urbana.

Muita gente poderá imaginar que a gestão de resíduos corresponde apenas à limpeza e saneamento urbano. Não, não é isso. É muito mais do que isso. Temos a prevenção para a produção e o tratamento que se dá aos resíduos nos pontos da sua geração, temos depois a recolha, o transporte, e finalmente, o tratamento e a deposição final. Os resíduos podem pura e simplesmente ser deslocados de um sítio para o outro, mas continuarem a afectar a saúde pública. Retiramos os resíduos de próximo das nossas casas, levamos para uma distância considerável, mas através de animais que se reproduzem nessas áreas ou se alimentam nessas áreas ou através da contaminação do lençol freático e da atmosfera, somos afectados por esses resíduos. Portanto há muito mais a fazer do que apenas recolher e transportar para as lixeiras. A agência tem que intervir como equilibrador do sistema.

O que isso significa na prática?

No sistema há interesses em jogo. Há o interesse da população, que não quer sofrer os efeitos da existência de lixo; há o interesse da administração,que legalmente tem a obrigação de manter o saneamento urbano, as zonas limpas; há ainda o interesse de particulares que encontram aí um ramo de actividade económica que tem de desenvolver, desde logo, substituindo as administrações nas operações por via de contratos de concessão. Portanto, o processo é entendido como uma parceria público-privada. O Estado, digamos, que permite que alguém faça o seu trabalho, sendo essa entidade, esse alguém, remunerado por isso. O próprio Estado, que contrata, paga ou é remunerado porque essa actividade é geradora de recursos financeiros. Há várias hipóteses, uma é fazendo o aproveitamento e reintroduzindo o resultado desse aproveitamento, que nós chamamos vulgarmente de lixo, para servir como matéria-prima e entrar novamente no circuito económico, outra é cobrando uma tarifa aos utentes, que no fundo é a população, para realizar essa tarefa. No meio de tudo isso, há vários interesses em jogo que a agência tem de equilibrar.

Como a agência pretende equilibrar esses vários interesses?

Estabelecendo regras. Não essas regras primárias que são prerrogativas do próprio Executivo, mas regras de funcionamento, principalmente técnicas. Esta é uma parte, mas a outra é quando há um conflito. Por exemplo, entre duas operadoras que têm a obrigação de limpar pode ocorrer que a actuação de uma afecte a da outra. Há aqui que estabelecer, digamos, uma arbitragem para gerir potenciais conflitos. Depois, entre contratante e contratada também poderão ocorrer problemas. Também há o aspecto das denúncias das próprias pessoas que devem merecer um determinado serviço e às vezes não o têm. Assim, a agência, com os seus poderes reguladores, deve intervir. Basicamente a nível de regulação é isso. Depois, tem outra missão, que também está no estatuto orgânico da ANR, que é a de fiscalizar se as coisas estão a ser feitas. Se aquilo para o qual a empresa foi contratada está a ser feito e se a administração que contratou está a exercer o seu papel controlador e está a exigir que o trabalho seja feito. Aí a agência intervém, mas sobre os geradores de resíduos. Por exemplo, se uma determinada indústria está a adoptar as práticas adequadas para eliminar ou conduzir para uma solução tecnologicamente adequada dos seus resíduos, ou se não está, a agência tem essa função de fiscalizar. São várias as funções que a agência tem enquanto reguladora e fiscalizadora do sistema.

Sabino Ferraz, Presidente do Conselho de Administração da Agência Nacional de Resíduos  []

“O Governo da Província de Luanda adoptou um quadro de funcionamento, em que se estabeleceu que haverá um conjunto de operadoras que estarão a funcionar a um nível primário.”

 

Ainda há muitas dúvidas sobre a nova lei de recolha de lixo. O que de facto muda?

frase 02 Sabino FerrazNão existe uma nova lei. O que existe de facto é um novo sistema que se decidiu implementar na província de Luanda, na forma como se organiza os serviços para resolver a questão da limpeza urbana e da recolha dos resíduos na cidade. Na verdade não foi aprovada nenhuma lei e nem se quer existe um diploma legal de qualquer nível. O Governo da Província de Luanda adoptou um quadro de funcionamento, em que se estabeleceu que haverá um conjunto de operadoras que estarão a funcionar a um nível primário, mais estrutural e depois, haverá outras operadoras por município ou por administração de cidade que vão tratar dessas questões. Mas essa responsabilidade é exactamente do GPL e das administrações municipais, quem têm a obrigação de contratar os serviços das operadoras e de, em primeira mão, garantir que o serviço público de limpeza e saneamento urbano seja realizado.

Nesse novo sistema está prevista a cobrança de uma taxa para recolha de lixo ao cidadão. Como será feita a cobrança?

No nosso sistema ainda não existe. Nós temos um projecto, e é preciso que seja entendido como tal, de regulamento sobre a recolha de resíduos e limpeza urbana, que é para vigorar em todo o país e não apenas na cidade de Luanda. Tem como previsão a possibilidade de ser cobrada uma taxa, mas esse próprio projecto ainda remete para diploma próprio. Qualquer que seja o valor que o Estado cobre à população, isso tem que ser aprovado de acordo com os níveis legais adequados. Nunca fica de fora o Ministério das Finanças. E só nessa altura, quando o Ministério das Finanças e o Ministério do Ambiente estabelecerem qual é o intervalo de valores e quais são as condições e em quais circunstâncias que se podem cobrar as taxas é que as administrações, enquanto operadoras primárias do sistema vão cobrar. E quer elas realizem a limpeza por administração directa, com os seus próprios serviços, como em alguns casos vai acontecer, quer essas administrações o façam subcontratando serviços ou até mesmo concessionando o serviço, o que vai suceder é que as populações vão pagar uma taxa que em alguns casos deverá ser denominada tarifa. No fundo, acaba por ser o pagamento de um serviço e quando o serviço não é pago directamente ao Estado já não é uma taxa, é uma tarifa, pela utilização de um serviço também público, mas prestado por uma empresa privada.

No dia 16 de Julho a agência realizou o “Seminário de Capacitação Para Governos Provinciais e Administrações Municipais Sobre o Controlo e Fiscalização na Área de Gestão de Resíduos”. Com qual objectivo?

Foi uma organização conjunta com o Ministério do Ambiente. O objectivo foi dar a conhecer que há serviços de fiscalização de resíduos que a agência tem, mas que o Ministério também tem e que as administrações também devem ter e exercer. Não está apenas em jogo aquilo que está disposto no regulamento sobre gestão de resíduos. Há muitas matérias que são tratadas ao nível da legislação sobre contravenções administrativas que devem ser tratadas.

Como quais?

Despejar lixo na rua fora dos locais adequados é, por exemplo, uma contravenção administrativa e qualquer autoridade do país tem que saber reconhecer que aí está uma contravenção.

 

“Todo indivíduo apenas por existir é gerador potencial de resíduos e todo indivíduo é afectado pelo o que os resíduos podem transmitir.

 

A agência pensa em promover campanhas de consciencialização e educação sobre a conservação da limpeza urbana?

frase 03 Sabino FerrazUma das funções da agência, enquanto regulador, é também promover a educação para a atitude correcta a ter com o tratamento dos resíduos, desde domésticos até aos de pequenas actividades comerciais ou industriais. Mas tivemos a infelicidade de termos, digamos, o nascimento da agência num momento particularmente crítico. A agência é uma instituição, um organismo orçamentado. Com a quebra das receitas do petróleo, o Orçamento Geral do Estado teve que ser redimensionado e sofreu cortes drásticos. Isso obriga a que tenhamos que fazer a contenção de algumas despesas. A nossa acção neste domínio não é tão visível porque de facto faltam recursos para implementarmos. Contudo, deveremos fazer [campanhas] junto de escolas, comunidades, associações profissionais. Isto é algo que toca toda a sociedade. Todo indivíduo apenas por existir é gerador potencial de resíduos e todo indivíduo é afectado pelo o que os resíduos podem transmitir. É passar esta mensagem que seria feita através de fóruns diversificados sobre essa matéria, desde a passagem paras as crianças que são veículo fundamental para a mudança de mentalidade na sociedade, que educadas desde tenra idade terão comportamentos diferentes quando mais velhos. São elas que levam a mensagem para casa. Tem também as mulheres, quer nas igrejas, quer nas organizações sociais em diversos fóruns, elas têm um papel importantíssimo. Quem educa e mantém determinados padrões na família é a mulher, mas também o homem. Porque não? São todos alvos da missão educadora que a agência também tem.

É notável a diferença entre Luanda e outras províncias, sobretudo do sul, em relação à limpeza urbana. O que acontece para ser tão difícil resolver a problemática do lixo na capital?

frase 04 Sabino FerrazEu diria que é um problema de urbanização. Universalmente, os grandes problemas com a gestão de resíduos resultam da urbanização. Uma urbanização acelerada provoca constrangimentos graves. O facto das vias aparentemente estarem limpas, não resolve muitas vezes os problemas. Se calhar, há algumas infraestruturas diárias onde seja fácil entrar com os meios que possibilitam essa recolha, mas depois para onde é que é despejado esse lixo? Isso é um problema. É fácil perceber que, numa comunidade pequena, é mais fácil dar tratamento às questões do que em comunidades grandes, muitas vezes económica e socialmente desestruturadas e também desestruturadas do ponto de vista físico. O que sucede é que se olharmos à nossa volta [Projecto Nova Vida], há uma comunidade. Aí vivem pessoas que geram resíduos, portanto, como é que uma operação de varredura entra naquela área [de terra batida]? É preciso encontrar soluções adequadas. São tão variadas [as situações que precisam de solução] numa cidade cosmopolita como Luanda, que costumamos dizer que “as coisas vão ter que se resolver passo a passo”.

Os moradores reclamam que em Luanda não há recolha de lixo nas comunidades. Como a agência pretende contornar esta questão?

Isso não é algo que agência vá resolver. Esta é uma competência dos municípios e passou-se exactamente para o nível dos municípios porque é a área da administração de proximidade. Quem está próximo das populações são as autoridades municipais. Em alguns casos, vai fazer sentido até que ao nível de comunas, no interior, e ao nível dos bairros haja mais responsabilização. Quem está mais próximo das populações, geradoras dos resíduos, são os administradores e esses mesmos administradores é que têm que encontrar soluções criativas e adequadas a cada caso. A agência tem um carácter nacional e digamos que deve aprovar, digamos assim, regras, regulamentos operacionais e dizer se a solução técnica é boa ou não, mas não é a agência que vai estudar os milhares de caso distintos que há no país. Cada cidade tem os seus problemas e tem que os resolver com soluções que sejam eficazes.

Das mais de 150 empresas públicas e privadas que se dedicam ao serviço de gestão de resíduos, apenas dezassete foram licenciadas e autorizadas pela ANR a exercerem as suas actividades. A que se deve o número tão reduzido licenças?

Há aqui dois problemas: o primeiro é que algumas das empresas não têm capacidade para dar resposta às exigências que a agência coloca para serem licenciadas. Outro problema é que corresponde a um processo de transição. Estas competências estavam com o Ministério do Ambiente. À medida que vão sendo transferidas para a agência há licenças que ainda estão válidas. O Ministério do Ambiente emitiu licenças para essas empresas, mas na altura, não tinha uma estrutura independente e adequada para resolver isso. Tinha serviços internos que faziam. Agora não podemos dizer que todas estão ilegais e que devem fazer o credenciamento. À medida que as licenças forem caducando, essas empresas vão passar para cá. Finalmente ainda há aqueles casos em que existiam, operaram, mas algumas delas, do ponto de vista técnico estão falidas e não têm como operar mais. Ainda há outro problema: as empresas que não estão sediadas em Luanda e que têm alguma dificuldade em trazer e montar todo o dossier para fazer o licenciamento. No futuro, pretendemos estender para todo o país, mas por enquanto só está em Luanda. Os interesses da agência vão temporariamente sendo resolvidos, atendidos pelos departamentos provinciais do Ambiente, mas a agência como tal ainda não existe nas outras províncias. Portanto, eles têm que se deslocar e isso envolve alguma dificuldade. É também uma razão para esse número ser tão pequeno.

Quais as exigências para uma empresa executar o serviço de gestão de resíduos?

Sabino Ferraz acredita que uma das soluções da problemática do lixo passa pela educação da população

Como principal exigência, é a demonstração de capacidade técnica, operacional e financeira. Se alguém quer exercer alguma actividade, seja ela qual for, tem que ser licenciado. Para isso tem que demonstrar aos organismos da administração que tem capacidade para tal. Digamos que é um processo de triagem já para as empresas não se apresentarem de uma forma irresponsável. Tem que demonstrar que tem capacidade técnica, além da comprovação de que essas empresas estão legalmente criadas, actuando com o Estado, pagam seus impostos, têm suas obrigações regularizadas e que depois dispõem de capacidade técnica e financeira. A técnica, que é aferida pelo quadro de pessoal que tem e a capacidade financeira é para garantir que em caso de participação em concurso, que sejam capazes. Se bem que depois o próprio quadro dos concursos tem a exigibilidade de verificar isso, mas à partida, vamos dizer que tem estaleiro. Não tem porque não há actividades, mas está capaz de em seis meses construir um estaleiro? O que lhe dá a capacidade de construir um estaleiro e dizer, sim senhor, eu tenho acesso ao crédito tenho capacidade financeira que me permite aceder a esse crédito, tenho garantias, uma série de coisas que permitam ao fim que a empresa cumpra com aquilo que se compromete quando responde a um caderno de encargo.

 

Quantas empresas são necessárias para suprir a carência no país?

Não colocaria a questão em termos de números de empresas. O que é importante é que os serviços, sejam eles públicos ou privados que se realizem no país, cumpram com a exigência total de serviços que há para prestar. Temos milhões de toneladas de resíduos para tratar, então tem que haver empresas suficientes, serviços municipalizados suficientes que devem ter capacidade de os tratar. Por exemplo, no projecto do Laúca, o tratamento dos resíduos, mesmo os domésticos, é feito no próprio projecto. É um projecto que tem boas práticas, já conseguimos verificar isso com os contactos e visitas que já se fez. É a própria empresa que tem serviços internos que trata. Nos outros casos, poderão ser empresas externas contratadas para este efeito. Não arriscaria dar um número de empresas, mas falando ao nível do que temos no PESGRU (Plano Estratégico para a Gestão de Resíduos Urbanos) temos cifras indicativas. Há uma direcção, temos volumes que devem ser tratados, quer de resíduos produzidos, os chamados activos, quer os passivos que já foram produzidos e que devem merecer um tratamento.

“Não há nenhum aterro para destinação específica de resíduos de construção ou de demolição” 

 

Devido à inexistência de uma central de reciclagem de resíduos produzidos pela construção civil, grande parte dos mesmos têm como destino final o aterro sanitário do Mulenvos. Há algum projecto para reaproveitamento desses resíduos?

frase 06 Sabino FerrazTemos e é de aprovação recente um decreto sobre os resíduos de construção e demolição. O que se passa é que de facto não há nenhum aterro para destinação específica de resíduos de construção ou de demolição e as condições técnicas para haver locais apropriados para deposição desse tipo de resíduos deve passar por escudos iniciais. Se olharmos para trás, vamos perceber que toda essa matéria de trabalho com resíduos, de uma forma tão especializada, é relativamente recente. Na maioria do país, esses resíduos ainda são tratados como resíduos comuns, fora alguns tipos de resíduos industriais que, de facto, começam a ser tratados de forma diferenciada. Nas ideias fundamentais da agência está a programação de actividades que conduzam entidades particulares, que serão os principais parceiros do Estado na formulação de soluções para estas áreas. Quer sejam os resíduos de construção ou demolição ou os resíduos de outra natureza. Há toda uma indústria que se pode formar.

O que agência pode fazer nesse sentido?

É criar um quadro económico adequado para que essas empresas nasçam e se desenvolvam. Vamos tentar que, com as autoridades competentes do Executivo, haja incentivo para que essas empresas actuem e que os potenciais investidores se virem para essas áreas. Diga-se de passagem, está comprovado a nível de outros quadrantes geográficos do mundo, que acaba por ser um bom negócio. Vamos tentar forçar para que isso aconteça o mais rápido possível.

O país tem quantos aterros sanitários em funcionamento?

Em Luanda e em funcionamento só há um, o de Mulenvos. Há uma previsão que se venha a construir, se não estou errado, mais outros três aterros sanitários. O conhecimento que eu tenho é que há aterros sanitários no Huambo, na Huíla, e creio que há um em Cabinda (não tenho a certeza que seja um aterro sanitário, mas é pelo menos uma lixeira controlada, com boas condições). Benguela não tem, mas há previsão de construção.  Há em todo o país o desejo de se construir aterros sanitários e essa é uma matéria que o Executivo tomou de peito. O chefe do Executivo nomeou uma comissão interministerial que acabou recentemente um trabalho sobre esta matéria que ainda aguarda algumas decisões ao nível central. Enquanto agência, vamos ter que aguardar para vermos o que em termos de estratégia política o Executivo diz em relação a isso para depois fazermos a nossa parte.

O que falta para que a actividade de reciclagem realmente arranque no país?

frase 07 Sabino FerrazFalta investimento numa indústria de reciclagem, porque o quadro legal que a permite, existe. Áreas para se trabalhar estão aí. Não há uma indústria de reciclagem. Há algumas intenções, mas a verdade é que ainda há passos muito pequenos. Falta uma indústria, o que não significa que não haja nenhuma iniciativa em curso. Algumas já existem, há pequenas iniciativas de aproveitamento de resíduos doméstico para produção de sabão, por exemplo. Na região do Huambo há um receptador de pneus usados e um de cartão, mas como uma indústria estruturada ainda não existe. Alguns dos problemas poderão estar ligados ao próprio destino a dar depois aos produtos que serão recolhidos e transformados. Haverá internamente indústrias que requerem esse material? Por exemplo, o vidro, pode ser reintroduzido na cadeia de vidro, mas só temos uma fábrica de garrafas de vidro. Os pneus podem ser recondicionados e usados novamente, os pneus não mais utilizáveis podem ser triturados, separar as lonas e os arames e dar-se destino a esses diferentes componentes. Mas, quem é que recebe pneus moídos? A indústria de pneus está parada. É uma questão que tem que ser alinhada com uma série de factores para jogarem juntos. O Ministério da Economia, o Ministério da Indústria, o Ministério do Ambiente, o Ministério das Finanças, que é muito importante porque há a questão dos incentivos que são da ordem fiscal e financeira, têm de estar juntos para que esta área de actividade económica se desenvolva.

 

Em Abril, as operadoras queixaram-se do mau estado das vias, como sendo um dos motivos que têm tornado muito lento os seus trabalhos e também provocado danos aos seus meios técnicos, como os camiões. Como a ANR vê esta questão?

Este é um problema de infra-estrutura da própria província de Luanda. O Executivo tomou a peito e creio que a sobras de recuperação das estradas estão bastante avançadas. Mas se me perguntar, em termos gerais, como vemos essa questão, temos que vê-la num quadro de uma estratégia global. Será que todos os resíduos devem ir para um aterro sanitário? A solução indicada com a maior e melhor solução pelo menos para os próximos anos é o que o PESGRU propõe, mas o plano deixa em aberto a possibilidade da existência de fábricas que transformem o lixo. Essas fábricas terão localizações diferentes daquelas onde estão os actuais e futuros aterros. É necessário pensar em soluções que sejam bastante criativas. [Por exemplo] Não se pode fazer o transporte por via ferroviária até esses aterros? Não se deverão construir estações de transferência em alguns lugares para permitir depois o transporte dos resíduos para esses aterros? São várias as soluções. Cada uma tem seus custos, há que estudá-las para saber o que é melhor e mais exequível.

“Temos nos servido dos meios de informação para transmitir alguma coisa, mas temos também consciência de que esses veículos não alcançam uma grande faixa da nossa população.” 

 

Outro problema colocado pelas empresas, inclusive reconhecido pelo governador, Graciano Domingos, é que o governo não cumpre com os pagamentos. Nesse novo modelo as empresas estarão asseguradas?

Presidente da ARN indica que os municípios devem assumir a sua obrigação legal de cuidar da limpeza e saneamento urbano

Não posso falar de uma coisa sobre a qual não tenho decisão, nem domínio. É evidente que a execução do Orçamento Geral do Estado tem uma autoridade que marca a cadência que é o Ministério das Finanças. Se o governador da província e as autoridades acreditam que isso será assim é porque receberam alguma garantia. Ainda recentemente ouvimos o Presidente da República a pronunciar-se, disse que as despesas públicas teriam mais regularidade a partir do segundo semestre de 2015. Portanto, eu tenho que acreditar nas pessoas.

Em Março arrancou a Campanha Nacional de Educação para a Separação do Lixo e Arborização Massiva. Já há resultados?

Nós temos tido alguns resultados, embora devamos repetir, esta campanha é relativa ao primeiro ano. A ministra do Ambiente, Fátima Jardim, ainda frisou isso, mas que haverá outros anos. Faz todo o sentido porque nós iniciámos num ano em que temos muitas dificuldades, até em comunicar. Temos nos servido dos meios de informação para transmitir alguma coisa, mas temos também consciência de que esses veículos não alcançam uma grande faixa da nossa população que não tem acesso aos órgãos de informação, quer escritos, quer falados, quer de imagem. No entanto, já podemos afirmar que já há alguma manifestação de consciência. Há pelo menos maior preocupação das pessoas. Sentimos isso.

Em Dezembro, o director geral da Empresa de Limpeza e Saneamento Básico de Luanda (ELISAL), Hermelindo Pereira, disse que no antigo modelo de limpeza, as empresas eram pagas por peso, e a partir dali passaria a ser pagas por área limpa. Já está a valer? O que mudou?

frase 08 Sabino FerrazNão posso pronunciar sobre isto porque na verdade não detenho os pormenores dos contratos que estão a ser firmados entre as administrações municipais e as operadoras, mas parece-nos que qualquer dos modelos que se adopte tem as suas virtudes e seus defeitos. Se o problema quando era por peso era a desconfiança relativamente aos operadores que iriam colocar toda a espécie de inertes para pesar como resíduos urbanos e domiciliares principalmente, o processo por área limpa pode também conter os seus riscos. Imagina que eu sou um operador e tenho a área, por exemplo, da Samba, e devo atravessar o Golf para chegar ao Mulenvos. Porque não deixar meu lixo no Golf que é área de outra operadora e ter uma operação mais rápida? Também pode ser um problema. Não há soluções que sejam totais. Para cada problema que encontramos, devemos adoptar as medidas de controlo que se impuserem. Podemos dizer que todos os modelos nesse aspecto são bons e todos são maus. Será melhor aquele que nos der mais garantia de que o serviço é feito com perfeição e ao melhor preço. É evidente que este modelo vai começar a funcionar e é evidente que a agência vai também passar a cumprir o seu papel. É missão da agência zelar para que os contratos sejam cumpridos.

Como a ANR pretende controlar se as empresas estão realmente a cumprir os contratos?

As áreas em princípio têm atribuições de serviços. A quem compete a varredura de x quilómetros da Estrada da Samba? Se a estrada está suja, já pagaram a alguém para fazer esse trabalho, então essa pessoa deve responder. Vamos ter pessoas a controlarem e também receberemos denúncias. Ainda estamos a trabalhar para criar condições, muito devagar porque os recursos são sempre muito poucos. Gostaria de fazer mais rapidamente, mas estamos a trabalhar para termos um número de atendimento para denúncia de situações e também termos sim uma equipa de fiscalização a trabalhar. Queremos que essa equipa cresça. Nascemos com uma equipa pequena, mas queremos que cresça porque tem que actuar sobre um universo muito vasto de situações, desde os geradores dos resíduos até aos contratos que têm que funcionar. Em última instância, eu tenho que defender aquele que é o beneficiário dos serviços. Esta é a missão da agência.

Num despacho da Inspecção Geral da Administração do Estado, foi definido o prazo de 60 dias, a contar do passado 1 de Novembro, para a apresentação das conclusões ao Presidente da República, José Eduardo dos Santos, sobre a forma como dinheiros públicos foram utilizados pelo Governo Provincial de Luanda na contratação do serviço de limpeza da capital a empresas privadas. Tem informações sobre o processo?

Esse despacho do Presidente da República foi para a Inspecção Geral do Estado. Sei porque também me apercebi pela informação na comunicação social, de que a inspecção esteve na ELISAL e fez seu trabalho junto do GPL. Os resultados, acredito, que eles apresentaram a quem os solicitou. O senhor Presidente da República, se achar por bem, que a agência deve tratar de alguma coisa, a seu tempo nos chamará.

 

Há algum projecto para recolha específica do lixo hospitalar?

O lixo hospitalar nos termos do decreto que já existe sobre os resíduos hospitalares e de saúde, deve ser tratado ao nível de cada unidade com entidades especializadas. São as unidades hospitalares que têm que tratar. Agora está a tratar de um programa mais específico e estratégico para o qual até já houve uma apresentação ainda recente com os Ministérios da Saúde e do Ambiente e está em fase de conclusão este programa e vai ser brevemente apresentado às instâncias competentes do Executivo.

 

A ELISAL, neste novo modelo, aparece como operadora principal. Considerando todas as críticas negativas ao trabalho que a empresa tem desenvolvido em Luanda porquê mantê-la com esta função?

Tanto quanto eu sei há seis empresas que vão assumir-se como principais e uma das quais é a ELISAL. Enquanto empresa pública ela não vai ter vantagens especiais sobre as outras. Vai operar em determinada zona. É claro que como ainda há algumas desconfianças relativamente ao sistema, há uma prerrogativa, que é mais uma obrigação do que um benefício, é da ELISAL manter uma reserva de capacidade para acudir as situações em que as outras falhem. Mas vejamos, podemos criticar muito a ELISAL, mas eu às vezes não vou por aí. A questão é saber o que foi a ELISAL. Durante muitos anos, na altura da sua nascença, eu, por sorte, ou por azar, não sei ainda, trabalhava no GPL, tinha sido nomeado e era um dos comissários adjuntos, [a ELISAL] assumia o papel de concessionária geral de serviço. Tinha responsabilidades directas que lhe eram transferidas pelo decreto que lhe dava concessão. Ela subcontratava serviços. Isto hoje vai mudar, as coisas tendem a mudar. A ELISAL já não é concessionária, os municípios assumem a sua obrigação legal de cuidar da limpeza e saneamento urbano e por essa via contratam empresas. A província de Luanda está a ser feita como um programa piloto e ainda há alguns controlos administrativos que vão impor, digamos, como se fazem as coisas. No futuro haverá regulamentação e os municípios só têm que seguir essa regulamentação em relação aos concursos que depois serão validados e ficam num quadro legal que também já existe da contratação pública. Aos olhos das pessoas, quem tem de limpar a cidade é apenas a ELISAL e todas as outras independentemente de suas denominações sociais e composições societárias e obrigações contratuais, para o grande público é como se fossem extensões ou contratadas da ELISAL. Mas agora já não é assim.

Qual a resposta da agência para a problemática da recolha de lixo em Luanda?

A agência não tem que dar respostas às problemáticas específicas desta ou daquela área. Tem que garantir apenas que aquele modelo que aquela administração adoptou funcione e que funcione bem. É isso que vamos exigir. Se não está a funcionar temos que intervir.

Fonte: Portal ANGOLA

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