Os Ministérios Públicos Federal e Estadual convocaram audiência pública para discutir as propostas que pretendem definir os novos rumos do processo de licenciamento ambiental no Brasil. O debate se deu em torno dos Projetos de Lei do Senado Federal (PL 654/2015), da Câmara dos Deputados (PL 3.729/2004) e da proposta da Associação Brasileira de Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema) que revoga as resoluções do Conama que regulamentam o licenciamento ambiental no país.
Convém destacar as pretendidas inovações do PL 654/2015, projeto de lei de maior polêmica que propõe o licenciamento ambiental especial para empreendimentos de infraestrutura considerados estratégicos ao país, tais como sistemas viário, hidroviário, ferroviário e aeroviário, portos e instalações portuárias, energia e telecomunicações.
Sob a premissa de que a morosidade do licenciamento ambiental é a vilã dos investimentos, o PL estabelece um rito uno, com a emissão de uma licença ambiental integrada, aos empreendimentos de infraestrutura a serem indicados por decreto do Poder Executivo, em substituição ao licenciamento ambiental trifásico (Licenças Prévia, de Instalação e de Operação).
A exclusão de etapas essenciais ao licenciamento poderá aumentar o questionamento de processos na via judicial
Caso aprovado, o processo de licenciamento deverá ser concluído em até sete meses, contados da solicitação da licença pelo empreendedor, o que implica a obediência de prazos exíguos, dentre eles, o de dez dias para definição de comitê responsável pelo licenciamento do empreendimento e o de 60 dias para apresentação dos estudos ambientais necessários à implantação do projeto.
Vale lembrar que o EIA/Rima – estudo normalmente exigido aos projetos de infraestrutura elencados no PL – leva em média de seis meses a um ano para ser concluído, sem contar as audiências públicas necessárias para que sejam prestados quaisquer esclarecimentos sobre o projeto.
Não parece viável, assim, que o mesmo estudo, que deverá ainda avaliar a sinergia dos impactos ambientais negativos de outros empreendimentos em operação ou projetados para a mesma área de influência do projeto, seja conduzido e apresentado em até dois meses. Tampouco parece haver condições institucionais para que os órgãos ambientais concedam parecer técnico quanto à concessão da licença ambiental integrada dentro dos novos prazos.
Importa mencionar, ainda, o risco de o EIA/Rima deixar de contemplar avaliações essenciais à instalação do projeto, o que poderia suscitar questionamentos do processo de licenciamento ambiental por terceiros, incluindo Ministério Público, não sendo atingida a celeridade apontada como principal objetivo do PL.
O PL cria ainda a figura do licenciamento tácito ao estabelecer que os órgãos intervenientes que queiram participar do comitê criado para licenciar novos projetos, tais como Funai, Iphan e ICMBio, devem se manifestar em até cinco dias da constituição do comitê. O descumprimento de tal prazo implicaria em consentimento ao processo de licenciamento ambiental especial.
Igualmente, não parece haver condições institucionais para o cumprimento do novo prazo, o que pode resultar na ausência de participação de órgãos essenciais ao processo de licenciamento ambiental.
Alguns pontos da proposta da Abema, que agrega os órgãos ambientais estaduais, também merecem destaque. O primeiro se refere à inexistência de critérios para o enquadramento do projeto a ser licenciado em uma das quatro modalidades previstas na minuta de resolução: licenciamento trifásico, unificado, por adesão e compromisso ou por registro.
Nesse caso, a excessiva discricionariedade transferida da União aos órgãos estaduais, inclusive com possibilidade de redução de etapas de licenciamento em projetos de significativo impacto, poderia agravar a discrepância entre as regulamentações estaduais, com possibilidade de facilitação de investimentos em determinados Estados em detrimento de outros.
O segundo surge da ausência de menção a fases até então consideradas imprescindíveis ao licenciamento ambiental, tal como a audiência pública, bem como da exclusão de determinadas atividades passíveis de licenciamento, como é o caso do parcelamento do solo, da implantação de distritos industriais e da transmissão de energia elétrica.
Ora, é notório que o sistema de licenciamento ambiental no Brasil carece de reforma e que deve ser garantida a sua celeridade, a fim de promover o desenvolvimento sustentável do país. Entretanto, a redução desmedida de prazos para a condução de estudos, bem como a exclusão de etapas essenciais ao licenciamento anteriormente previstas, pode aumentar o questionamento dos processos pela via judicial, já que determinadas avaliações poderão deixar de ser contempladas dentro dos novos prazos.
Frise-se que o licenciamento ambiental é o principal instrumento de controle da degradação ambiental e da prevenção de desastres. Para tanto, é preciso que os diversos atores – órgãos ambientais, Ministérios Públicos, sociedade civil – trabalhem para a construção de um novo marco que garanta um licenciamento ambiental célere e eficaz, sem olvidar a prevenção e o monitoramento dos impactos decorrentes da implantação de atividades potencialmente poluidoras no país.
Renata Piazzon é especialista em direito ambiental do Lobo & de Rizzo Advogados e professora da PUC-SP
Foto: Divulgação
Últimas Notícias:
USP desenvolve método que elimina até 92% de substância tóxica do plástico na água
Pesquisadores da USP de Ribeirão Preto (SP) desenvolveram um método capaz de remover até 92% de resíduos tóxicos de plásticos presentes na água em apenas duas horas.
Universalização do saneamento básico precisa de R$ 900 bi, aponta pesquisa
A reunião contou com as participações de representantes de agências privadas e públicas de saneamento, que defenderam uma regulação transparente e independente e alertaram para a dificuldade de universalizar o saneamento até 2033.
Novas regras para enfrentar a escassez hídrica no Estado de São Paulo
A SP-ÁGUAS, Agência de Águas do Estado de São Paulo, publicou em 24/09 três deliberações que podem transformar a forma como lidamos com a gestão dos recursos hídricos.
Baseform | Venha ter conosco na FENASAN e explicaremos como o software Baseform pode ajudar na gestão de DMCs e no controle de perdas de água
Configurar um DMC – um setor de balanço hídrico – pode ser tão simples quanto instalar medidores de vazão em uma zona de abastecimento ou de pressão já existente. De fato, é altamente recomendável começar assim: aprendendo, um setor de cada vez.
Análise comparativa de processos oxidativos avançados em tratamento de efluentes e águas residuárias
Este Trabalho de Conclusão de Curso tem como objetivo realizar uma revisão bibliográfica dos principais POAs atualmente utilizados, com foco em uma análise comparativa de suas eficiências, vantagens, desvantagens e condições ideais de aplicação.
Governo vai financiar projetos de drenagem e resíduos sólidos com taxas e juros zero para cidades do UniversalizaSP
As ações são principalmente para projetos de drenagem e resíduos sólidos e são destinadas aos municípios paulistas que aderiram ao UniversalizaSP.