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Água desviada do São Francisco terá distribuição ‘improvisada’

O governo terá que recorrer a soluções improvisadas para distribuir a água que já começou a ser desviada do rio São Francisco. Sem dinheiro para tocar as principais obras complementares à transposição, bilhões de litros que seriam despejados diariamente em canais de concreto terão como destino riachos e adutoras de menor capacidade.

Diante da restrição fiscal imposta pela crise econômica, a presidente Dilma Rousseff determinou que os esforços do Ministério da Integração Nacional fossem concentrados na conclusão da transposição em 2016.

Em entrevista ao Valor, o ministro Gilberto Occhi afirmou que a meta será cumprida, mas reconheceu que – pelo menos em um primeiro momento – a água não será distribuída conforme o planejado. Atualmente, dos cerca de R$ 250 milhões mensais disponíveis para os projetos hídricos na região Nordeste, mais de R$ 200 milhões são aplicados diretamente na transposição, ficando algo em torno de R$ 50 milhões para as obras remanescentes.

No ano passado, o orçamento do ministério passou por um corte de mais de R$ 2 bilhões em relação a 2014. O valor deste ano só será conhecido no fim de fevereiro, quando o governo deve anunciar o decreto com as informações do contingenciamento. Os efeitos sobre o ritmo das obras serão inevitáveis.

Diante disso, as soluções paliativas se mostram necessárias em vários trechos da transposição. No Ceará, pouco mais de 7 mil litros por segundo que deveriam sair do eixo norte da transposição para serem despejados no canal do Cinturão das Águas terão que ser derramados no riacho dos Porcos, localizado na região do município de Brejo Santo, que fica no sul do Estado.

O Cinturão das Águas é um sistema de canais projetado para levar a água da transposição ao sertão cearense e também à região metropolitana de Fortaleza, que passa por frequentes crises de abastecimento. Orçado em R$ 1,5 bilhão na primeira fase, o projeto sofre com a queda no ritmo dos repasses do governo federal e já não tem mais data certa para ser concluído.

A única alternativa encontrada para escoamento foi o riacho dos Porcos. Dali, a água do São Francisco seguirá em direção ao rio Jaguaribe, que é a principal fonte de abastecimento do açude do Castanhão, responsável pelo abastecimento da capital cearense e das cidades vizinhas.

De acordo com o ministro da Integração, a ausência do Cinturão vai resultar, inevitavelmente, em perda de água, já que o riacho não tem a mesma eficiência do canal. A água também não chegará a regiões críticas do interior, como o Cariri, o Sertão de Crateús e Inhamuns. “O Cinturão é fundamental para perenizar os rios dessa região e garantir a oferta”, explicou Occhi.

Em Pernambuco, a situação é parecida. O governo assinou em dezembro do ano passado o contrato para a construção do Canal do Agreste, obra de R$ 1,3 bilhão que terá a função de captar a água do eixo leste da transposição e entregá-la na Adutora do Agreste, projetada para atender 68 cidades do interior do Estado.

Apesar do contrato assinado com o consórcio Ferreira Guedes / Emsa, a obra do Canal do Agreste não recebeu ordem de serviço e não receberá tão cedo. Sem dinheiro, o governo optou por um caminho mais barato. Na semana passada, decidiu construir a Adutora do Moxotó, obra de R$ 80 milhões que funcionará como alternativa ao canal.

A própria Adutora do Agreste também anda a passos lentos. A previsão atual é que a obra só fique pronta em 2020, mas mesmo esse cronograma é incerto, o que tem irritado os políticos locais. O líder do PT no Senado, Humberto Costa, criticou recentemente o ritmo das obras. “Não é possível que uma obra desse porte, que pode minorar sensivelmente os problemas da seca no Agreste pernambucano, seja tratada a conta-gotas dessa maneira”, afirmou o parlamentar.

De acordo com o ministro da Integração, seriam necessários cerca de R$ 30 milhões mensais para tocar cada uma das cinco principais obras complementares da transposição, mas a disponibilidade atual fica em torno dos R$ 5 milhões, no máximo R$ 10 milhões. “Nosso trabalho, agora, é entender como a transposição poderá atender aos Estados sem as demais obras”, afirmou Occhi.

A distribuição no Rio Grande do Norte e na Paraíba também não será a ideal. Pelo que estava planejado originalmente, uma parte das águas vindas do eixo leste da transposição deveria ser despejada nos ramais do Apodi e do Salgado – outros dois canais que estão com o cronograma bastante atrasado. Sem os dois projetos, a água que reforçaria o abastecimento de boa parte do Semiárido dos dois Estados será despejada em rios da região, com aproveitamento bem inferior.

Apesar dos vários improvisos, o ministro da Integração diz que todas as obras complementares serão executadas. De acordo com ele, o conclusão da transposição vai representar uma folga orçamentária importante já a partir de 2017, o que permitirá a aceleração dos cronogramas.

Orçada em R$ 8,2 bilhões, a transposição fechou 2015 com 83% de execução e tudo leva a crer que será, finalmente, concluída. Desde que o projeto foi anunciado, em 2003, seis ministros já passaram pela pasta da Integração, todos com a promessa de concluir o empreendimento e melhorar a oferta de água a 12 milhões de nordestinos.

Para garantir a inauguração em dezembro, Occhi tem como maior desafio a finalização de um túnel e dois reservatórios que estão em fase inicial. Ainda assim, as águas do Velho Chico devem gastar dois meses para encher os 27 reservatórios e 15 aquedutos do complexo, que só poderá ser considerado pronto nos primeiros meses de 2017.

Fonte: valor
Foto: Google

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