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Microplásticos nas estações de tratamento

Depois que um estudo mostrou que as estações de tratamento de efluentes de São Francisco (EUA) estão lidando com a poluição por microplásticos, especialistas avaliam as possíveis soluções

As chamadas toalhinhas descartáveis (flushable wipes) e outros materiais persistentes são problemas bem conhecidos para as estações de tratamento de efluentes (ETEs). Agora, estudos realizados nos Estados Unidos encontraram outros materiais traiçoeiros – microplásticos e microfibras – entrando na corrente dos efluentes em uma escala pesada.

Partículas de microplástico medindo 5 mm ou menos vêm de produtos de limpeza, sacos plásticos, embalagens de poliestireno e outros itens plásticos descartáveis. As microfibras, o culpado mais recentemente identificado, são despejadas nas lavadoras de roupas pelos agasalhos tipo fleece e outros tecidos sintéticos.

O estudo da Baía de São Francisco

Microplásticos e microfibras foram encontrados em todas as oito ETEs de São Francisco examinadas em um recente estudo conduzido pelo San Francisco Estuary Institute & The Aquatic Science Center. Coletando as partículas usando uma peneira, eles descobriram que as estações descarregam uma média de 33 partículas por 100 galões (379 litros), e que 80 porcento daquelas partículas eram microfibras.

O estudo também escumou a água em nove locais na área da Baía, encontrando de 14 mil a 2 milhões de micropartículas por km2 em cada local. A Califórnia e a Agência de Proteção Ambiental (EPA) dos EUA baniram as microesferas dos produtos de limpeza a partir de 2017, porém, as microesferas representam apenas uma pequena porção da poluição total por microplásticos encontrada na Baía.

 

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Distribuição dos microplásticos encontrados na Baía de São Francisco

A Dra Rebecca Sutton, a pesquisadora principal do estudo, falou sobre as suas descobertas, dizendo que é preocupante, pois a vida selvagem pode ingerir os microplásticos e as microfibras, levando a bloqueios digestivos ou à morte por fome.

“Isso pode também expor a vida selvagem aos químicos tóxicos do plástico”, ela disse. “Nosso entendimento dessa preocupação é emergente, portanto, nós ainda não temos os limites específicos de toxidade que podemos usar para avaliar os riscos colocados pelos níveis atuais da poluição por microplásticos na Baía”.

A Dra Sutton disse que a densa população na área da Baía versus o seu tamanho pode explicar porque eles encontraram níveis mais altos de poluição por microplásticos ali do que em outros estudos, incluindo dois que examinaram os Grandes Lagos e a Baía Chesapeake.

 

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Os vários tipos de poluição por microplásticos encontrados pelos pesquisadores

 

Água de chuva

Enquanto o efluente tratado é uma das portas para a poluição por microplásticos e microfibras, outros caminhos como a água de chuva – que pode “lavar” o lixo plástico para dentro das bocas de lobo da cidade – são especulados como sendo mais significativos. Porém, microesferas e microfibras são particularmente relevantes para a indústria de efluentes, disse a Dra Sutton.

“Ambos os tipos dessas partículas vão pelo ralo. Enquanto a maior parte dos plásticos tem a probabilidade de terminar em lodo ou biossólido, uma pequena porção pode passar pelo tratamento e ser descarregado na Baía ou em outros corpos receptores”.

Esse é o motivo pelo qual a Dra Sutton está ajudando a conduzir uma investigação de dois anos sobre a poluição por microplásticos e microfibras na Baía de São Francisco. O esforço foi iniciado no começo deste ano e tem por objetivo fornecer o estudo mais abrangente da nação sobre microplásticos na água, sedimentos e peixes. A pesquisa também vai analisar o escoamento das águas pluviais e os efluentes como caminhos.

O grande componente científico do projeto é desenvolver métodos de monitoramento e normas para encorajar estudos similares pelo mundo.

“A área da Baía é um centro internacional de inovação e ciência voltada para o futuro”, disse a Dra Sutton. “Podemos liderar a pesquisa por soluções para esse problema global”.

Examinando as estações de tratamento

Outra pesquisadora principal é a Dra Sherri Mason, professora de química e chair do Departamento de Geologia e Ciências Ambientais na State University of New York-Fredonia. O seu estudo “Microplastic pollution is widely detected in US municipal wastewater treatment plant effluent” encontrou razões para preocupação sobre os efeitos indiretos dos plásticos.

“Os plásticos são fabricados usando muitos químicos – plastificantes, estabilizadores de UV, pigmentos e outros”, ela disse. “Esses químicos são parte inerente dos plásticos, porém, não são quimicamente ligados aos polímeros plásticos, o que significa que podem migrar para fora dos plásticos. Adicionalmente, como os plásticos estão na água, eles podem adsorver químicos nocivos da água na sua superfície. O ponto é que os microplásticos se transformam em pequenas “pílulas de veneno”. Eles levam os químicos do ambiente externo para a cadeia alimentar. Esses químicos são conhecidos por ter um grande número de efeitos”.

O estudo da Dra Mason analisou 90 amostras de efluentes de 17 estações de tratamento e fez uma média dos resultados. Embora o número de micropartículas por litro foi relativamente pequeno, os resultados foram significativos considerando a quantidade de efluentes sendo processados diariamente. O estudo estimou que as estações de tratamento liberam mais de 4 milhões de micropartículas por dia no efluente.

O estudo não foi focado na eficiência das plantas na remoção de microplásticos.

“Alguns outros estudos foram publicados que são mais focados nesse aspecto, e eles concluíram que, sim, a remoção está acontecendo amplamente durante a retirada de escuma e sedimentação”, disse a Dra Mason. “Claro, isso apenas significa que terminam nos biossólidos e a questão é, como os biossólidos são usados? Se forem usados como fertilizantes, então esses microplásticos acabam de ser re-lançados no meio ambiente”.

Qual é a solução?

Ela enfatiza que ninguém está chamando as estações de tratamento de fonte de poluição por microplásticos, uma vez que o escoamento urbano provavelmente represente ainda mais, e que todo o problema começa nas residências.

“As pessoas lavam seus rostos e corpos com produtos que contém microesferas, elas lavam suas roupas sintéticas – das quais cada peça pode liberar um mínimo de 1.900 microfibras – elas usam esponjas sintéticas para lavar seus pratos e peças quebram, saquinhos vão pela descarga”, ela disse.

Apesar do estudo do seu grupo ter testado os níveis de micropartículas nas ETEs, a Dra Mason diz que isso não é problema delas.

“As estações de tratamento de efluentes foram projetadas para remover xixi e cocô e elas são muito boas nisso. Elas não foram projetadas para remover a multidão de químicos sintéticos agora no mercado. Penso que, como uma sociedade, precisamos ser melhores em pensar no ciclo completo dos produtos, do ter ao descartar. Toalhinhas descartáveis (flushable wipes), por exemplo. Alguém perguntou a vocês o que todos vocês (operadores de ETEs) pensam dessa ideia antes deles a lançarem no mercado? Por todas as contas, elas são a desgraça da vida dos operadores porque, apesar de tecnicamente poderem ser lançadas na descarga, elas não se desintegram do mesmo modo que o papel higiênico. Isso deveria ter sido considerado desde o início”.

Uma solução multi-facetada é melhor, segundo a Dra Mason. Alguns grupos estão trabalhando em filtros para lavadoras de roupas, e outros filtros inovadores, como esse catador de microfibras sendo desenvolvido pelo Rozalia Project, poderão estar disponíveis em breve. Os pesquisadores também descobriram que lavadoras de roupas com abertura superior liberam cinco vezes mais microfibras do que as lavadoras com abertura frontal. Em qualquer caso, é presumível que a educação do consumidor é uma peça chave na busca de uma solução.

A perspectiva de um operador

Chris Lightfoot, director assistente de utilities de Panama City na Florida, concorda que a educação pública é necessária e, provavelmente, seria mais bem-sucedida do que a regulamentação no combate ao problema dos microplásticos.

“Eu pessoalmente acho que tentar regular isso é virtualmente impossível”, ele disse. “Não há uma maneira viável de buscar por cada item que uma residência despeja pela descarga no sistema de esgotos, e é impossível saber de onde veio alguma coisa na estação elevatória ou na estação de tratamento. A melhor coisa, na minha opinião, é a educação – mostrando quanto dano esses produtos oferecem para o nosso sistema de esgotos”.

Se fosse mostrado ao público quanto dinheiro é gasto com manutenção que poderia ter sido prevenida, isso poderia abrir os seus olhos, de acordo com Lightfoot.

“Quando você mostra a alguém que um impelidor de 4.500 dólares teve de ser substituído porque entupiu com produtos que não deveriam ter sido lançados na descarga, isso faz com que fiquem um pouco mais cautelosos sobre jogar alguma coisa na descarga – especialmente quando as suas tarifas de água e esgoto estão planejadas para aumentar a cada ano”.

Lightfoot disse que quando situações como essas se apresentam para os operadores das estações de tratamento, eles geralmente vêm como seus próprios métodos de resolver o problema.

“A única mudança de processo que eu vi os operadores fazerem, é vir com o seu próprio processo de peneiramento que vai remover melhor os microplásticos”, ele disse. “Muitas vezes é quase impossível para as grades – automáticas ou manuais – apanhar esse tipo de sólidos suspensos. Parte de um upgrade que estamos fazendo atualmente inclui a instalação de peneiras rotativas no lugar das grades, e tomara que isso torne a remoção mais eficiente”.

Nota: artigo de autoria de Anthony Drew

Fonte: TPO Magazine, adaptado por Portal Saneamento Básico, www.saneamentobasico.com.br

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