São 212 municípios (71,8%) com índice zero para rede de esgoto no Estado; gestores precisam superar desafios para atender a meta da universalização dos sistemas até 2033
Alguns não preencheram nenhum desses indicadores, como é o caso de Paial e Arvoredo, no Oeste, e Jaguaruna, Pedras Grandes e Morro Grande, no Sul do Estado.
Particularidades do saneamento nas cidades pequenas
Por mais que a falta de redes de coleta e estações de tratamento de esgoto em municípios pequenos se justifique pelos altos custos, que tornam as obras inviáveis para populações desse porte, os dados indicam que há falta de atenção ao saneamento básico.
Mesmo não adotando o sistema coletivo de esgotamento sanitário, eles têm como opção a regularização do uso das fossas nas residências, alternativa que a Casan já começou a adotar em boa parte das cidades que atende, e exemplo dado também por algumas prefeituras, como São Ludgero, no Sul do Estado, que consta com 100% de atendimento de esgoto mesmo com um sistema individual.
Falta de verbas e até de conhecimento são desafios de gestão em SC
Paulo Canalles, presidente do Sindesc (Sindicato das Empresas Construtoras de Obras, Operadoras e Concessionárias de Saneamento no Estado de Santa Catarina), que representa os prestadores de serviços no Estado, afirma que é visível, com base em sua experiência, a precariedade em muitas gestões espalhadas por Santa Catarina, o que explica tantos índices zerados ou sequer informados no SNIS.
“O Estado tem muitos municípios pequenos, em que às vezes a prefeitura não tem estrutura e nem conhecimento para fazer um projeto de saneamento e preencher essas informações. Quando encontramos os gestores sempre cobramos por um plano municipal. E fazer isso entre vários municípios, para não sair tão caro”, relata.
A Fecam (Federação Catarinense de Municípios) também tenta intervir nesse tipo de situação. “As cidades menores têm esse problema da gestão do conhecimento. Muitos deles não conhecem a informação, não têm o ‘como fazer’.
A Fecam entra nisso, mostrando o caminho, a quem recorrer. Uma das saídas é o consórcio”, esclarece Schirlene Chegatti, consultora de meio ambiente da federação.
Legislação impõe metas até 2033 e exige investimentos
Com o Marco Legal do Saneamento, as cidades serão obrigadas a investir em saneamento, independente do contexto em que estão inseridas. Cada um dos 295 municípios do Estado terão que traçar suas metas e decidir qual o melhor caminho a ser seguido.
Chegatti, da Fecam, acompanha de perto esse cenário. Ela aponta que os investimentos em esgoto terão que ser uma prioridade para todas as prefeituras nos próximos anos.
“De maneira geral, em termos de água, drenagem e resíduos o Estado atinge as metas. Já o esgoto é mais difícil, justamente por causa dos valores, e a maior dificuldade dos municípios é ter recursos. O que mais tem sido feito é buscar parcerias público-privadas”, detalha.
O presidente da Sindesc, Paulo Canalles, reforça que a corrida contra o tempo também é um dos desafios.
“Os investimentos em água, em grande maioria, já foram feitos. Esgoto custa mais que água – não diria que a obra é cara, porque tem muito retorno -, mas as cidades vão ter que investir, seja com recurso próprio, pela estatal, ou com parcerias privadas. O que temos falado nas reuniões é que tem que começar cedo, para dar tempo”, diz.
Para auxiliar os menores municípios, associações, sindicatos e federações, bem como a Sindesc e a Fecam, atuam com setores voltados a orientar os prefeitos e outros gestores. Vai do interesse de cada um buscar os melhores meios de solução.
O ‘senso de coletividade’ é uma dessas alternativas, e tem sido indicada pela Fecam.
“Levantamos essas alternativas em reuniões com associações, que são divididas em 8 macrorregiões no Estado. Tentamos integrar os interesses, sempre respeitando a autonomia de cada município, e lembrando que o Marco Legal também trouxe essa regionalização, então é dentro disso que trabalhamos para unir os municípios”, completa Chegatti.
“Obra bonita é aquela que todo mundo vê”: saneamento ‘esquecido’ é herança cultural da gestão pública
“Tudo foi caminhando para que a questão do esgoto fosse esquecida”, resume Paulo Canalles, do Sindesc. Ele observa que o país chegou a avançar em pontos básicos de outros pilares, como o abastecimento de água (que a média brasileira é de 90%), mas o esgotamento ficou para trás.
“Eu vejo que nunca foi cobrado. Em Santa Catarina, que é um estado com IDH alto, a cobertura está em 26% – abaixo da média brasileira, que já deixa a desejar. O gestor tem ‘N’ frentes para atuar: saúde, educação, mobilidade… e o esgoto não costuma entrar nessa lista. Dizem que obra bonita é aquela que todo mundo vê”, complementa Canalles.
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Para o professor de Gestão de Políticas Públicas da Univali (Universidade do Vale do Itajaí), Alexandre de Sá, o perfil dos administradores e as demandas que estão ‘na boca do povo’ contribuem para esse cenário.
“Na grande maioria dos casos, o gestor quando assume já está pensando na reeleição. E para isso ele tenta agradar com obras que vão ser sentidas pela população no dia a dia delas. Creches, postos de saúde, asfalto, isso sempre foi a prioridade. Prova disso é que historicamente as obras estruturais, quando ocorrem, são em segundo mandato”, relata.
A ‘baixa popularidade’ das obras de saneamento é um fator relevante: além de ser pouco lembrada pelos moradores e ficar debaixo da terra, a instalação de uma rede coletora pode causar muitos transtornos na mobilidade urbana.
“A obra de saneamento é complexa, porque altera a rotina das pessoas, você não pode fechar ruas ao mesmo tempo, não pode retirar moradores de suas casas. Além do ônus financeiro tem o ônus dos transtornos na mobilidade, esse é um dos maiores desafios”, diz Paulo Canalles.
O professor Alexandre de Sá destaca que no Brasil, especialmente em cidades pequenas, requisitos técnicos costumam estar ausentes dos gabinetes.
“Elegemos políticos profissionais. Geralmente por serem pessoas populares, ou pelo carisma, mas não pelos atributos técnicos de sua execução. Mas é fundamental que o poder executivo tenha profissionais que estudem a fundo os problemas e, por exemplo, pesquisem exemplos pelo mundo de outros municípios que conseguiram solucioná-los”.
Fonte: NDmais