MPSC pede bloqueio de R$ 156 milhões de entes públicos para melhorias no esgoto da Capital

Todas as ETEs (Estações de Tratamento de Esgoto) de Florianópolis operam sem licença ambiental. Essa é a conclusão da investigação feita pelo MPSC (Ministério Público de Santa Catarina), que resultou numa ação civil pública, apresentada em setembro do ano passado. Na última sexta-feira, a promotoria reiterou o pedido de liminar que prevê o bloqueio de bens no valor de R$ 156 milhões da Casan (Companhia Catarinense de Águas e Saneamento), da Agesan (Agência Reguladora de Serviços de Saneamento Básico de Santa Catarina), do governo do Estado e da Prefeitura de Florianópolis para garantir uma série de melhorias no sistema de tratamento de esgoto da Capital.

Na terça-feira, o juiz do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Hélio do Valle Pereira, negou o pedido de bloqueio de bens e marcou uma audiência com representantes dos órgãos envolvidos para a próxima segunda-feira. Os recentes casos de falta de água na Ilha de Santa Catarina por problemas com geração de energia motivaram a promotoria a pedir novamente o bloqueio. Essa liminar foi indeferida pela primeira vez dez dias após o MPSC apresentar a ação, em setembro de 2013.

Os promotores alegam que as estações de tratamento, como da Barra da Lagoa e da Lagoa da Conceição, lançam 50% dos efluentes no mar de forma irregular e sempre com “altíssima concentração de coliformes fecais”. Além disso, segundo a denúncia, nenhuma das seis estações de tratamento de esgoto tem licenciamento ambiental.

Na ETE Insular-Centro, no Centro da Capital, os dejetos estão sendo lançados ao mar quase in natura e acima do permitido pela legislação ambiental e pelas normas estabelecidas pelo Ministério da Saúde. De acordo com uma análise feita pela Vigilância Sanitária do município em agosto do ano passado, a estação está lançando dejetos contendo coliformes totais de 16 milhões para cada 100 ml, enquanto o permitido é de 1 mil/100 ml. As falhas no tratamento de esgoto, e também na água, resultaram em quase R$ 12 milhões em multas da Vigilância Sanitária à Casan desde 2007.

Além dos danos ambientais, a ação mostra que a estação insular tem um problema grave de funcionamento. Segundo o promotor Tiago Carriço, um dos autores da denúncia, a estação tem dois tanques de armazenamento de esgoto, mas apenas um está funcionando. “O que já foi constatado por Agesan, Fatma, Prefeitura e Ministério Público é que o tanque em funcionamento está com rachaduras e pode estourar a qualquer momento. Isso pode causar a maior tragédia ambiental da história de Florianópolis“, afirmou.

Promotor aponta falhas na infraestrutura da Casan
Segundo o promotor Tiago Carriço, 76 estações elevatórias do sistema da Casan não têm bombas de emergência ou pontos para ligação de geradores para manter o funcionamento, no caso de quedas de energia. “Toda vez que a cidade tem interrupção de energia, o esgoto vai sem nenhum tratamento para o mar ou lagoas“, disse. Na contestação apresentada ao juiz, a Casan afirma que instalaria até 10 de dezembro de 2013 dez geradores e que existe monitoramento pelas equipes volantes que tentam resolver os problemas emergenciais.

O MPSC diz que cada estação elevatória deveria ter um gerador próprio e um ponto de energia para evitar o lançamento indevido do esgoto sem tratamento, já que as quedas de energia impedem que o material seja bombeado até ETEs. “Eu confesso que, lidas as versões da inicial e da contestação, tenho inúmeras dúvidas. Não sei se realmente é de tal modo singela a instalação pretendida em todas as estações elevatórias e mesmo se o custo – relativo a geradores próprios – se justifica“, avalia o juiz Hélio do Valle Pereira na sua decisão de sexta-feira.

Os promotores também alegam na denúncia o que classificam como “subsídio cruzado”, o principal fator para as falhas no sistema de tratamento de esgoto da Casan. De acordo com o promotor, cerca de 30% das taxas recolhidas pela empresa entre os usuários da Capital são reinvestidos na manutenção das ETEs. “O restante é repassado para obras de saneamento em outras cidades do Estado, como Imbituba, onde foram colocados R$ 52 milhões. Por isso, os problemas na Capital só serão resolvidos quando 100% das taxas forem revertidas em favor do sistema da Capital“, disse.

Plano de Saneamento foi feito após ação
Para a promotoria, o contrato que concede à Casan o direito de administrar o tratamento de água e esgoto de Florianópolis até 2032 deveria ser anulado. A ação civil pública relata que a Prefeitura não tinha um plano municipal de saneamento quando renovou o contrato com a concessionária, em julho de 2012. “A relação contratual da Prefeitura de Florianópolis é condicionada a um plano municipal de saneamento, previsto pela lei federal 11.445/2007. Entre as obrigações previstas na referida lei está o licenciamento ambiental das estações de tratamento”, explicita o texto da ação. A falta desse documento seria suficiente para pedir a anulação do contrato.

No entanto, a prefeitura apresentou o plano municipal de saneamento em novembro do ano passado, dois meses após o MPSC ajuizar a ação civil pública. Segundo o promotor Tiago Carriço, antes da aprovação do plano a Agesan deveria ter aberto um procedimento administrativo para pedir o cancelamento do contrato entre Prefeitura e Casan, mas ambos teriam sido omissos diante das irregularidades apontadas pela Vigilância Sanitária do município e por laudos da Fatma, dados usados como base da denúncia.

Casan afirma já ter requisitado licenças à Fatma
A justificativa da Casan para a falta de licenças nas ETEs seria a lentidão da Fatma em aprovar os pedidos da concessionária. “Foram anexadas cópias de protocolos e expedientes solicitando o licenciamento ambiental à Fatma, inclusive a renovação de alguns já existentes, mas que a Fundação do Meio Ambiente não se manifestou até agora, de maneira favorável ou contrária”, respondeu a Casan em nota.

A empresa ainda sustenta que a negativa da Justiça sobre o bloqueio de bens é um indício da “falta de embasamento técnico da ação” movida pelo MPSC, e “garante que não há prejuízos ambientais neste sentido, já que existe o monitoramente contínuo das Estações e cujos relatórios continuam sendo encaminhados regularmente para a Fatma”.

No entanto, a nota não se refere a três questionamentos feitos pelo Notícias do Dia. O primeiro trata sobre a acusação do MPSC de que a Casan não estaria investindo todo o dinheiro arrecadado na Capital com saneamento. Sobre, a manutenção da ETE João Paulo, a promotoria relata que presenciou “uma funcionária sem qualificação”, usando chinelos, que estaria dosando o cloro no tratamento do esgoto “no chute”. A terceira indagação sem resposta foi sobre a situação dos tanques de aeração (que servem para o tratamento químico do esgoto) da ETE Insular.

Todas as irregularidades foram comunicadas à Fatma”, diz presidente da Agesan

Agência responsável pela fiscalização da Casan, a Agesan alega ter informado à Fatma sobre os problemas verificados em fiscalização de seus técnicos. O presidente da agência, Sérgio Grando, afirma que não poderia multar a concessionária por possíveis crimes ambientais. “Cada instituição tem a sua responsabilidade. Nós cumprimos com a nossa. Por exemplo, advertimos e notificamos a Casan no ano passado, e esperamos ela corrigir os erros, até chegar à multa de R$ 300 mil, aplicada na semana passada. E tudo foi comunicado à Fatma”, disse.

Sobre a ausência de licenciamento ambiental para as ETES, a Agesan informou em nota que repassou três ofícios entre 2012 e 2013 solicitando medidas a serem tomadas sobre o assunto.

Estado se exime de culpa
Apesar de a Fatma ser um órgão ligado à administração direta do poder executivo estadual, e o próprio governo ser o maior acionista da empresa de economia mista Casan, a Procuradoria Geral do Estado defende que, caso haja alguma punição por dano ambiental, as duas instituições seriam as responsáveis iniciais. A nota da procuradoria ainda ressalta que a principal argumentação do governo é que as ETEs têm licença ambiental para o funcionamento. Além disso, pede que novas provas periciais sejam produzidas.

Por telefone, o procurador-chefe do Contencioso do Estado, Marcelo Mendes, isentou o governo de culpa, caso as irregularidades apontadas pelo MPSC sejam comprovadas. “A Fatma tem autonomia jurídica para atuar na área ambiental. O que não pode é o Ministério Público querer administrar a Casan”, criticou.

Fatma não embargou ETEs por serem utilidade pública
A necessidade do serviço de tratamento de esgoto foi a justificativa da Fatma para não embargar as ETEs da Casan. A fundação explica que iniciou em 2012 vistorias em todas as estações. O resultado desse trabalho foi formatado em um extenso relatório sobre as estações e encaminhado ao MPSC. Além disso, a fundação garante que emitiu notificações e autuações sobre irregularidades encontradas no serviço da concessionária.

A Fatma ainda afirma que tudo que está sendo cobrado na ação foi apontado pela própria fundação. Diz a nota: “O que o Ministério Público está cobrando, a Fatma já vem fazendo há muito tempo. Aliás, a ação só aconteceu por causa dos estudos da Fatma. Independente de ação judicial ou não, a Fatma continua fiscalizando as ETEs em Florianópolis. É obvio que a Fatma só emitirá licença se tudo estiver de acordo com a legislação”.

Prefeitura não responde questionamentos
A Prefeitura de Florianópolis, por meio da Secretaria de Habitação e Saneamento Ambiental, se limitou a informar que, desde novembro de 2013, a Capital tem o plano municipal de saneamento – uma das queixas expostas na ação do MPSC. No entanto, até o fechamento desta edição, o ND não recebeu resposta sobre outros questionamentos apontados pela promotoria, como a nulidade do contrato de concessão e a posição da Prefeitura sobre a liminar que pede o bloqueio de bens para assegurar investimentos em saneamento básico na Capital.

Fonte: Notícias do Dia
Veja mais: http://ndonline.com.br/florianopolis/noticias/135327-mpsc-pede-bloqueio-de-r-156-milhoes-de-entes-publicos-para-melhorias-no-esgoto-da-capital.html

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