Modelagem Leilões Saneamento
Por: Mariana Saragoça
Como é notório, em virtude das competências atribuídas pela Constituição Federal, o saneamento básico possui peculiaridades que explicam, em alguma medida, a dificuldade no avanço dos investimentos privados no setor.
Importância da escuta e da aprendizagem contínua é indiscutível
O fato de, como regra geral, o município ser o titular dos serviços e a ausência de um regulador e fiscalizador único para o setor são alguns dos fatores que contribuem na avaliação desse setor como mais arriscado em comparação com outros setores de infraestrutura em que o estado ou a União são os titulares e a regulação está a cargo de uma agência reguladora estadual ou federal, conforme o caso (e.g., respectivamente, distribuição de gás canalizado e energia).
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Tanto é assim que, ciente desse contexto e dos desafios inerentes ao setor, o Novo Marco Legal do Saneamento Básico criou mecanismos com vistas a mitigar a multiplicidade de reguladores que, isoladamente, podem não ter condições efetivas de regular e fiscalizar os serviços concedidos, em especial: (i) incentivos à regionalização, potencialmente diminuindo o número de reguladores ao concentrar a estrutura de prestação regionalizada sob um mesmo regulador; e (ii) atribuição de competência à Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) para instituir relevantes normas de referência para a regulação dos serviços públicos de saneamento básico por seus titulares e suas entidades reguladoras e fiscalizadoras.
Nesse sentido, a modelagem dos projetos pode contribuir para mitigar ainda mais essa percepção de risco regulatório, contribuindo de forma crucial para o sucesso dos leilões de saneamento.
Modelagem Leilões Saneamento
Em primeiro lugar, destaca-se a possibilidade de, durante os estudos de modelagem, promover encontros para escuta ativa dos potenciais interessados nas fases de market sounding, consultas e audiências públicas, onde são colhidas sugestões e contribuições para o aperfeiçoamento do edital e respectivo contrato de concessão.
É bastante comum que, nessas fases, sejam abordadas algumas assimetrias informacionais e discutidas as premissas adotadas nos estudos para que, ao final, sejam apontados, pelos próprios potenciais futuros licitantes, pontos para aprimoramento com vistas a dar maior clareza à alocação de riscos, permitindo estudos técnicos e econômicos mais assertivos e, consequentemente, lances mais competitivos nos leilões.
Em segundo lugar, destaca-se a capacidade de aprendizagem com erros e acertos do passado e a constante preocupação de adequação à regulação recém editada.
BNDES
Com efeito, após a edição do Novo Marco Legal do Saneamento Básico já tivemos projetos bem-sucedidos e com características distintas entre si, com destaque para aqueles modelados pelo BNDES, como, por exemplo: Alagoas, Rio de Janeiro e Amapá.
Como exemplo de uma situação fática que propiciou o aprimoramento de modelagens futuras cita-se a assunção parcial dos serviços da área da concessão por resistência de SAAEs em alguns municípios. Diante dessa vivência, projetos futuros passaram a prever expressamente tal possibilidade de assunção parcial, incorporando às minutas contratuais um regramento claro para lidar com essa situação específica.
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O acompanhamento de pleitos de reequilíbrio decorrentes dos contratos de concessão, em especial, daqueles celebrados após a edição do Novo Marco Legal do Saneamento Básico, também pode ser uma fonte de aprimoramento das modelagens, na tentativa de prever, de antemão, possíveis soluções adequadas.
Referências
Finalmente, deve-se ter em mente que a ANA continua avançando no estabelecimento das normas de referência, de modo que a modelagem dos novos projetos deve sempre estar atenta às novas regras, com destaque para: (i) matriz de riscos para contratos de prestação de serviços públicos de abastecimento de água e esgotamento sanitário; e (iii) metodologia de indenização de investimentos realizados e ainda não amortizados ou depreciados dos contratos de prestação de serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário.
Não restam dúvidas de que o setor de saneamento tem plena capacidade de apresentar projetos bem estruturados e atrativos para os investidores privados. Para tanto, é imperativo que a modelagem se valha da possibilidade de escuta dos stakeholders interessados e da capacidade de aprendizagem contínua com os erros e acertos do passado e incorporação das normas de referência da ANA para que tenhamos um pipeline cada vez mais robusto.
Fonte: Jota.